sexta-feira, 28 de março de 2008

Traídos pelo Destino



O diretor e roteirista Terry George ainda dá os primeiros passos em sua carreira. Apesar de ter estreado na direção em 1996 com o obscuro Mães em Luta, passou os oito anos seguintes na geladeira. Em seu currículo, apenas dois trabalhos para a TV. Mas em 2004 George mostrou a que veio com o exemplar Hotel Ruanda. Após capitanear algo dessa estatura, o cineasta geralmente se vê diante de um dilema: se, por um lado, portas se abrem para seus novos projetos, por outro também tem que atender altas expectativas. Um tropeço e pronto: está o sujeito tachado de iniciante que deu sorte - Sam Mendes é um que vive brigando com esse estigma desde Beleza Americana. Traídos pelo Destino, novo trabalho de Terry George, pende a balança mais para endossar do que para desqualificar sua carreira.

Apesar do título pouco criativo em português (impossível não confundir com o Traídos pelo Desejo de Neil Jordan), Reservation Road é um filme construído de forma bastante habilidosa e consegue mostrar sem julgamento os dois lados de uma mesma história. O professor universitário Ethan Learner está voltando com a família do recital do filho Josh, de 10 anos, quando pára em um posto de gasolina na tal Reservation Road. Lá, Josh salta do carro sem que os pais vejam e é vítima de um terrível acidente. O advogado Dwight Arno foi ao jogo do Red Sox com o filho de 11 anos e precisa levá-lo depressa para a casa da ex-mulher, que não pára de ligar para seu celular e fazer ameaças por terem se atrasado. A vida dessas duas famílias se cruza para sempre quando Dwight, num instante de distração, atropela Josh e foge em pânico. Uma investigação policial é instaurada e, conforme o cerco se fecha, fica a cada dia mais difícil para Dwight fazer a coisa certa, enquanto Ethan começa a ficar obcecado por idéias funestas de vingança.

O modo como a vida das duas famílias converge para a inevitável colisão é muito bem estruturado no roteiro, fazendo com que o espectador se solidarize com os motivos de cada um dos envolvidos. Dwight cometeu um erro que pode ser considerado imperdoável, mas tem como atenuante a pressão a que estava exposto: ameaçado pela ex-mulher de não ver o filho ao primeiro deslize, seu primeiro instinto é fugir do local do acidente. Mesmo porque ele mal vê o que atingiu e tem a reação – infeliz, porém humana – de não parar para conferir. Já Ethan, que começa a trama coberto de todas as razões do mundo, vai se afundando em ódios e ressentimentos à medida que percebe que talvez a polícia não encontre o homem que atropelou seu filho. É quando, numa reação também muito humana, começa a se isolar de todos e demonizar a pessoa por trás do volante, como se a vingança pudesse anestesiar a dor que o consome. E Joaquin Phoenix e Mark Ruffalo enriquecem ainda mais o conflito com suas interpretações na medida certa.

A única derrapada do filme acontece justamente em seu desfecho. Conforme a trama vai crescendo em tensão e algumas decisões sérias vão sendo tomadas (de forma premeditada, o que faz toda diferença), tudo leva a crer num final que acaba não acontecendo. Os manuais de roteiro pregam que o desfecho de um filme, seja qual for, tem que dar ao espectador a sensação de que aquele era o caminho inevitável. Claro que isso é uma regra que vive sendo quebrada toda hora e funciona em inúmeros filmes, mas neste caso o ensinamento faz sentido porque o final dá a impressão de que faltou uma "pegada" à altura do que vinha sendo mostrado. Não chega a desmerecer o bom filme mostrado até então, mas deixa no espectador uma sensação de anticlímax.

Noves fora, o saldo é positivo. Vale conferir.

Um comentário:

  1. Ótimo texto.

    "Traídos pelo Destino" é um filme que quero muito ver.
    Bom saber que não é dispensável.

    Abraço!!!

    ResponderExcluir