
Essas são apenas algumas das pequenas histórias que conta num fluxo de consciência, perdido entre delírios e lembranças. Dirige-se a uma enfermeira, à filha, ou a quem mais se dispuser a ouvir. Desrespeitando a ordem cronológica e menosprezando a acuidade, Eulálio é um narrador nada confiável, visto que falseia a própria história. E o leitor enreda-se nas idas e vindas do personagem, aos poucos montando o estranho quebra-cabeça de sua biografia. Algumas questões cruciais, como o destino da amada esposa Matilde, ficam abertas à interpretação. Outras aos poucos são desveladas a contragosto, como seu racismo e sua negação irracional do fato de ter se casado com uma mulata.
Em seu quarto romance, Chico Buarque distancia-se do tom kafkiano de suas obras anteriores e segue em um estilo diverso, porém igualmente genial. Com naturalismo e singeleza, o autor cria uma narrativa refinada, cheia de associações diretas e indiretas. Através de suas mentiras e omissões, Eulálio deixa entrever mágoas seculares e feridas não cicatrizadas. O título do livro, que parece abstrato a princípio, faz todo sentido quando terminada a leitura. Uma curiosidade: comenta-se que um dos primeiros leitores dos originais foi Rubem Fonseca, que recomendou a Chico que trocasse o título.
Para quem é fã do nosso grande compositor-cantor-dramaturgo-escritor, a dica é obrigatória. E aqueles que ainda não conhecem sua porção literária, certamente se encantarão com sua maturidade e domínio da arte literária.
Um belo exercício de literatura este! Não sou fã do trabalho literário do Chico - prefiro ele 'musicalmente', mas este me cativou.
ResponderExcluirA leitura fluiu em apenas algumas horas e terminei o livro, rapidamente.
Eu gostei muito do resultado, até comentei ele no Apimentário, se puder confira meu ponto de vista.
Um belo livro, sim! Ainda que não o considere excepcional.