quarta-feira, 28 de julho de 2010

Uma Noite em 67


Foi em uma noite de outubro de 1967 que aconteceu em um teatro paulista, com transmissão ao vivo para todo o Brasil, a final do 3º Festival de Música Popular Brasileira da TV Record. Diante de uma plateia indomável, que aplaudia e vaiava com igual disposição, alguns jovens promissores da época – hoje monstros sagrados da música brasileira – competiam entre si. Canções que se tornariam verdadeiros hinos no futuro naquela noite eram apresentadas ao público pela primeira vez.

O Festival vencido por Edu Lobo com Ponteio teve, ainda, Gilberto Gil e os Mutantes em segundo lugar (Domingo no Parque), Chico Buarque e MPB-4 em terceiro (Roda Viva), Caetano Veloso em quarto (Alegria, Alegria) e Roberto Carlos em quinto (com o samba Maria, Carnaval e Cinzas). Realmente foi uma noite ímpar, marcada não apenas por inovações musicais como a polêmica introdução da guitarra elétrica na MPB, mas também por acontecimentos folclóricos como a reação explosiva de Sérgio Ricardo que, ao ser impedido de cantar por monumentais vaias, quebrou seu violão e atirou-o sobre a plateia – episódio que depois foi jocosamente apelidado de “violada no auditório”.

O documentário Uma Noite em 67 contrapõe com muita vibração e bom humor estas imagens históricas a depoimentos atuais dos principais personagens: Chico Buarque, Caetano Veloso, Roberto Carlos, Gilberto Gil, Edu Lobo e Sérgio Ricardo, além de testemunhas privilegiadas como Sérgio Cabral (um dos jurados) e Nelson Motta (um dos jornalistas que cobria o evento). “É naquele momento que o Tropicalismo explode, a MPB racha, Caetano e Gil se tornam ídolos instantâneos, e se confrontam as diversas correntes musicais e políticas da época”, assim resumiu Motta.


Os diretores Renato Terra e Ricardo Calil, que pretendiam inicialmente fazer um panorama geral sobre a chamada era dos festivais, foram extremamente felizes na decisão de focar o filme apenas nesta emblemática edição de 1967, o que permite uma visão mais íntima e detalhada não apenas do evento, mas também do momento de ruptura e contradições que vivia a música brasileira, ainda em busca de um senso de identidade. Eram tempos românticos, nos quais ainda se acreditava numa certa pureza musical em contraponto ao “imperialismo ianque”. É impossível não sorrir diante do mea culpa constrangido dos artistas que participaram de uma passeata contra a guitarra elétrica, por exemplo. O espectador também tem a oportunidade de saber em primeira mão detalhes nunca antes divulgados, como, por exemplo, o estado emocional em que se encontrava Gilberto Gil ao defender sua música.

Contando com imagens de arquivo fantásticas e depoimentos atuais inspirados, ternos e divertidos dos principais envolvidos, Uma Noite em 67 encanta e diverte, relembrando uma época explosiva, durante a qual fazer música colocava as escolhas políticas e musicais em igual nível de importância. Simples e delicioso. Sexta nos cinemas.

Um comentário:

  1. Sem dúvidas, o melhor documentário musical desse ano, quiçá o melhor feito sobre o período! Retrato de uma geração que está desaparecendo e que, infelizmente, não possui substitutos a altura...
    O documentário é um retrato da formação da identidade brasileira naquele momento da História, caracterizado pela influência desses intelectuais e o conteúdo de suas mensagens catárticas para as grandes massas. Aprende-se um bocado, surpreende-se bastante com histórias de bastidores dos envolvidos e traz uma espécie de nostalgia para quem viveu a época, e vontade de mergulhar mais no assunto pra quem não conheceu ou viveu isso.

    Parabéns Erika, por expor esse filme aqui e por conseguir, de maneira sussinta e direta, estimular a curiosidade de quem ainda não assistiu (o que não é meu caso, pois eu já vi duas vezes... rsrs)

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