quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Um Time Show de Bola


Os filmes de animação muitas vezes são vistos como algo menor em termos de cinema ou exclusivamente destinado ao público infantil, o que é um tremendo preconceito. Um Time Show de Bola é coisa de gente grande e merece lugar de honra na programação de qualquer cinéfilo.

Amadeu é um romântico, apaixonado por Laura e por futebol. Apesar de ser um craque no pebolim, tem pouco foco para as questões práticas da vida. Sua vidinha pacata sofrerá um baque quando Colosso, antigo desafeto da infância que se tornou o jogador de futebol mais famoso e rico do mundo, retorna à cidadezinha onde foram criados disposto a se vingar de tudo e todos por causa da única derrota que sofreu na vida: uma partida de pebolim. O que Colosso não sabe é que Amadeo contará com o reforço dos craques de metal, que ganham vida para ajudá-lo a salvar a cidade e ganhar de vez o coração de Laura.

Como não se divertir com os bonecos de pebolim que ganham não somente vida, mas um tremendo ego, e reproduzem os cacoetes que vemos em atletas de carne e osso? Desde o jogador vaidoso que fala de si mesmo na terceira pessoa até o que se acha filósofo e dispara frases de efeito o tempo todo, o roteiro entrega diálogos deliciosos, que, além de engraçados, ainda têm um refinado senso crítico que não poupa ninguém e ironiza patrocinadores, grandes corporações e interesses escusos que, muitas vezes, se sobrepõem ao chamado espírito esportivo.


Com um traço charmoso e que prima por pequenos detalhes, o longa traduz em imagens muito do espírito portenho e ainda remete um pouco à estética das animações francesas – como A Pequena Loja dos Suicídios, para ficar em um exemplo recente. O filme apresenta um 3D bacana, mas nem precisava. O grande atrativo de Um Time Show de Bola está mais no modo como a história nos faz torcer por aquele adorável grupo de pernas-de-pau, ao mesclar com maestria a paixão e o arrebatamento causados pelo futebol (algo que nós compartilhamos com os argentinos) a uma clássica história de Davi contra Golias.

Também é um alívio ver que o diretor Juan José Campanella não perdeu a cabeça depois de ganhar um Oscar (por O Segredo dos Seus Olhos, em 2010). O A&S teve oportunidade de entrevistá-lo no Festival do Rio de 2009 (leiam aqui) e, na ocasião, Campanella pareceu uma pessoa sensata e tranquila. Impressão que se confirma agora, ao vê-lo colocar toda a alma nesse singelo projeto. Os que acompanham sua filmografia poderão inclusive perceber algumas referências, como uma visão do estádio parecida com a sequência de O Segredo dos Seus Olhos ou a semelhança entre o afeto e nostalgia que os moradores sentem pelo bar ao demonstrado pelos personagens de O Clube da Lua.

Só é uma pena que as cópias que serão exibidas em nossos cinemas sejam todas dubladas em português, ainda mais considerando que o próprio Campanella empresta sua voz a alguns personagens. Mesmo devendo o som original, Um Time Show de Bola é um dos filmes mais simpáticos do ano.

Trem Noturno para Lisboa


Ao contrário do que se pensa, adaptar uma obra já existente para a linguagem cinematográfica geralmente é muito mais complicado e desafiador do que escrever um roteiro original. Sem contar que automaticamente surgem as comparações, muitas vezes injustas e sem levar em conta as necessidades próprias da sétima arte. Trem Noturno em Lisboa é adaptado do romance do suíço Pascal Mercier que já vendeu dois milhões e meio de exemplares e foi traduzido para mais de trinta idiomas desde que foi publicado na Alemanha em 2004.

Na versão para a telona, Jeremy Irons dá vida ao professor de línguas antigas Raimund Gregorius, um homem metódico e respeitado por seu intelecto, mas, por outro lado, considerado previsível e entediante. Em uma manhã como outra qualquer, sua vida é transformada pelo encontro com uma jovem portuguesa que está prestes a saltar da ponte que ele atravessa diariamente para chegar ao trabalho. Ele consegue impedir o suicídio, mas a moça desaparece e deixa para trás o sobretudo. No bolso, um livro escrito por um médico português e, dentro dele, uma passagem de trem para Lisboa. As palavras contidas no livro tocam profundamente Gregorius e, movido por um impulso incontrolável, ele utiliza a passagem e parte em busca de mais informações sobre Amadeu de Prado, o autor que mudou sua vida.

Embora o protagonista seja impulsionado a realizar uma viagem, o verdadeiro foco do livro é um mergulho muito pessoal em questões íntimas como a sua suposta incomunicabilidade, as escolhas feitas ao longo da vida e a implacabilidade do tempo. O filme dirigido pelo dinamarquês Bille August (o mesmo de A Casa dos Espíritos) é um belo exemplo de adaptação feliz, já que ressalta ou cria situações que tornam a trama mais adequada para o cinema e, ao mesmo tempo, consegue manter intacto o espírito contemplativo e filosófico do livro. Claro que muita coisa é deixada de fora nessa transposição, mas August e os roteiristas Greg Latter e Ulrich Herrmann realizam a tarefa com muito bom senso.


Quantas vezes ouvimos alguém dizer que determinado livro (ou filme) mudou sua vida? Evidente que quando isso ocorre a mudança tem mais a ver com o momento pelo qual passa o indivíduo do que com a obra em si, mas, de todo modo, não se pode menosprezar o poder transformador de ler ou ouvir as palavras certas no momento oportuno. O protagonista apenas vai mais longe, ao realizar o mergulho dentro de si mesmo através de uma atitude externa. Porém abandonar o trabalho e empreender uma viagem intempestiva e sem sentido aparente parece também uma forma de provar ao mundo que ele não é tão previsível assim.

Esse é um dos ângulos do filme. O outro é a história que surge, pouco a pouco, quase brotando das ruas de Lisboa. Amadeu de Prado, o dedicado médico e profundo questionador que tanto encantou Gregorius também foi parte atuante na resistência à ditadura imposta por Salazar. Um homem admirável, mas que carregava culpas e contradições. Uma figura capaz de, tanto tempo depois, ainda inspirar e promover uma revolução pessoal em um professor de meia-idade.


O elenco internacional tem como grande destaque um inspirado Jeremy Irons no papel principal, mas também conta com outras atuações interessantes, como a do inglês Jack Huston (da minissérie Boardwalk Empire) como Amadeu de Prado e ainda Christopher Lee, Charlotte Rampling, Mélanie Laurent, Martina Gedeck, August Diehl, Bruno Ganz e Lena Olin.

É bem verdade que o fato do filme ser todo falado em inglês quebra um pouco do seu encanto. Nem tanto por grande parte da trama ser ambientada em Lisboa, mas principalmente pelo papel fundamental que as palavras em língua portuguesa desempenham na trama. É estranho quando o protagonista abre o livro – que sabemos ser escrito em português – e cita diretamente uma passagem, mas falando em inglês com personagens que são portugueses. OK. É uma produção internacional, com atores das mais diversas nacionalidades, tudo isso é compreensível, mas não deixa de ser um pouco frustrante.

Descompasso que não apaga o brilho de uma produção de delicadeza e beleza raras, com uma fotografia que valoriza o charme clássico de Lisboa, com seus bondes e ladeiras estreitas. Bille August, que há muitos anos não dirigia um filme de peso, realiza este filme sensível e que dribla sem demais dificuldades o desafio de condensar na projeção quase quinhentas páginas de um livro denso e profundo. 

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Álbum de Família - trailer


Álbum de Família é o título nacional para o aguardado August: Osage County, filme baseado na peça homônima da vencedora do Prêmio Pulitzer Tracy Letts que tem previsão de estreia aqui no Brasil para o dia 27 de dezembro. O filme chega às salas brasileiras apenas dois dias depois de sua estreia no circuito americano – comemoremos, não é sempre que isso acontece com filmes mais, digamos, artísticos. O filme recebeu dois prêmios no Hollywood Film Festival (melhor atriz coadjuvante para Julia Roberts e melhor elenco) e seus atores, em especial Meryl Streep e Julia Roberts, já estão bem cotados nas apostas para indicações ao Oscar 2014. O elenco luxuoso conta ainda com Bendict Cumberbatch, Ewan McGregor, Chris Cooper, Abigail Breslin, Juliette Lewis, Dermot Mulroney, e Sam Shepard. A direção é de John Wells e a produção leva o toque de Midas de George Clooney. Confiram abaixo o trailer legendado e um dos cartazes nacionais:




domingo, 24 de novembro de 2013

Prof! Profa!


O público carioca tem mais quatro semanas para conferir a talentosa Jandira Martini neste provocador monólogo que estreou na noite de ontem sob os mais calorosos aplausos. A peça, que vem de uma festejada temporada em São Paulo, agora faz uma curta passagem pelo CCBB do Rio. Nela, Jandira é uma ex-professora de literatura que cometeu um crime terrível e sua pena, além da prisão, é subir no palco e reviver sua história diante dos espectadores, dessa forma transformando as pessoas na plateia em confidentes. O texto original é do dramaturgo belga Jean-Pierre Dopagne, que foi por muitos anos professor da Universidade de Bruxelas e, portanto, também traz sua experiência como docente para a história.

O texto retrata com muito sarcasmo e acidez o inferno diário vivido pelos educadores que realmente tentam passar adiante seu conhecimento, em contraste com aqueles que simplesmente cumprem seu horário e deixam os alunos em “ponto morto”. Mas será que vale a pena travar uma batalha perdida contra jovens que não estão interessados em adquirir tal conhecimento? E qual é o custo emocional disso? Temas como choque de gerações e um sistema educacional em crescente empobrecimento são apenas algumas das questões apontadas.

Outra correlação interessante e bastante oportuna é a que se faz entre a sala de aula e o teatro. Ao colocar o espectador presente no espaço no mesmo lugar do aluno passivo, o texto arranca o tema do universo escolar e o leva não somente para o campo da arte, mas para a chamada vida adulta de um modo geral. Com falas provocadoras como “as pessoas que vêm ao teatro pagam para ouvir e ficar caladas”, a discussão se amplia para a tendência do ser humano ao comodismo e à resignação.


A encenação proposta por Dopagne e executada por Celso Nunes é bastante despojada: a atriz se apresenta em um palco quase nu – com exceção de uma mesa, uma cadeira e um cabideiro – e totalmente vestida de preto, tendo uma maleta como único adereço cênico. Uma concepção que faz eco ao conceito de “teatro pobre” proposto por Grotowski, mas também remete à essencialidade da clausura – seja religiosa ou penitenciária. Toda a atenção, portanto, se concentra no texto e na excelente interpretação de Jandira, que domina completamente o palco e tem os espectadores cativos durante os 60 minutos de duração do espetáculo. Talvez justamente por isso pareçam desnecessárias as intervenções que ocorrem através de vozes gravadas. Teria sido mais condizente com a proposta cênica que havia sido adotada até então que a própria Jandira se encarregasse destas passagens, mesmo porque a atriz já havia estabelecido intimidade com a plateia e assumido o papel de narrador brechtiano.

De todo modo, Prof! Profa! é um monólogo extremamente pertinente e que resgata o melhor do jogo de cena e da catarse que são próprias do universo teatral, além do atrativo extra de contar com uma atriz que domina perfeitamente seu ofício. Jandira pode até não ter se tornado professora (ou melhor, profa), mas também ela dá aula quando o assunto é representação.

Serviço:
CCBB – Teatro I, às 19h
De 23 de novembro a 2 de dezembro de sábado a segunda
De 5 a 22 de dezembro de quinta a domingo
Ingressos: R$ 10,00

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Sobrenatural: Capítulo 2


Quem aprecia e acompanha filmes de terror sabe que o nome mais criativo do momento é James Wan. O jovem cineasta malásio que há dez anos realizou um curta que se transformaria no longa inicial da franquia de terror mais festejada dos últimos anos (Jogos Mortais) vem se aprimorando filme após filme. Podemos dizer que 2013 foi um grande ano para sua carreira, já que Wan brindou sua cada vez mais fiel plateia com não apenas uma, mas duas ótimas produções: Invocação do Mal e este Sobrenatural: Capítulo 2.

Uma coisa recorrente e frustrante em alguns exemplares do gênero é que muitos produtores transformam o sucesso de um filme em mero gatilho para sequências que da história inicial levam somente o nome. Felizmente, não é o que ocorre aqui. O primeiro ponto positivo deste segundo capítulo é constatar que a trama de fato é retomada do ponto de encerramento do filme anterior. O que torna, portanto, obrigatório que o espectador tenha assistido a Sobrenatural (Insidious, no original).


Conforme mostrado no primeiro filme, a família Lambert tem um histórico com o mundo dos mortos. Josh era assediado por espíritos quando criança, mas a pedido de sua mãe foi submetido a um processo de hipnose que fez com que ele se esquecesse de suas habilidades paranormais. Anos mais tarde, porém, ele é obrigado a resgatar esse dom que sequer se lembrava de possuir para ajudar o filho que herdou a sua mediunidade. O problema é que sempre que se abre uma passagem para o mundo dos espíritos, também eles podem invadir o nosso. E o que vemos nesta sequência é que Josh não voltou exatamente a mesma pessoa de sua incursão no além.

O roteiro escrito por Wan em parceria com o colaborador habitual e também ator Leigh Whannell é mais intrincado e faz boas correlações com o que se passou anteriormente, embora o excesso de ramificações metafísicas por vezes distraia tanto o espectador que acaba tendo como efeito colateral que o filme seja menos assustador. Invocação do Mal, por exemplo, tinha uma trama sob muitos aspectos simples e, portanto, deixava mais espaço não somente para que a plateia fosse completamente tomada pelo medo como também se envolvesse mais intensamente com os conflitos vivenciados pela família. Apenas uma pequena ressalva a um filme que, de todo modo, é extremamente bem realizado e não se limita somente a copiar o que deu certo em seu antecessor.


Patrick Wilson, Rose Byrne, Barbara Hershey e os demais atores de Sobrenatural retomam seus personagens, provando que o gênero precisa sim de um elenco que dê credibilidade à trama e não de moças e rapazes iniciantes que só fazem gritar, correr e cair. Por fim, só resta lamentar que alguém com o talento de James Wan tenha como próximo trabalho o sétimo filme da franquia Velozes e Furiosos. Esperemos que seja um projeto anômalo e que logo o cineasta volte a nos dar bons sustos.


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Confiram o curta que complementa Gravidade


Quem viu Gravidade se lembra deste momento: Ryan Stone, personagem de Sandra Bullock, consegue fazer contato com alguém na Terra. Mas a pessoa fala uma língua de som exótico e não a compreende. Um latido de cachorro e um choro de bebê complementam a sonoplastia da comunicação que não acontece devido à barreira linguística. Aningaaq, um curta de sete minutos dirigido por Jonas Cuarón (filho de Alfonso Cuarón e coautor do roteiro de Gravidade), mostra este mesmo momento pela ótica do homem que não consegue entender o pedido de ajuda de Ryan.

O mais interessante em tudo isso é que a Warner inscreveu Aningaaq para o Oscar de melhor curta-metragem. Caso isso se converta em uma indicação, os Cuarón conseguirão fazer história, já que pela primeira vez um curta e um longa que integram um mesmo material seriam indicados ao Oscar.

Para conferir Aningaaq cliquem aqui.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Blue Jasmine


Depois de ter rodado seus últimos três filmes na Europa (Roma, Paris e Londres), Woody Allen mais uma vez volta a filmar nos Estados Unidos. Dessa vez ele divide as atenções entre sua amada Nova Iorque e San Francisco, e isso não é por acaso. O contraste entre a cosmopolita big applee a ensolarada cidade californiana serve de mote para também delinear dois estilos de vida antagônicos que soltam faíscas quando postos lado a lado. Nova Iorque representa o luxo, sofisticação, mas também a solidão e desequilíbrio da personagem-título; já San Francisco é a descontração simples e saudável de sua irmã Ginger.

Jasmine – que nasceu Jeanette – conseguiu tudo o que queria na vida e um pouco mais. Mesmo tendo sido criada em um lar adotivo e nunca tendo possuído aptidão profissional alguma, seus sonhos mais extravagantes se materializaram quando ela se casou com o rico e sofisticado Hal. Mas o conto de fadas não teve “felizes para sempre” e sua rotina de grandes festas, roupas de grife, viagens e joias implodiu quando Hal foi preso e, diante das acusações de fraudes financeiras, tudo que eles possuíam foi confiscado pelo governo. Falida e com os nervos em frangalhos, Jasmine é obrigada a deixar Nova Iorque e migrar para San Francisco para viver de favor na casa da irmã de quem sempre desdenhou.


Muitas comparações têm sido feitas entre esta trama e a do clássico Um Bonde Chamado Desejo. Semelhanças existem, é claro, mas o olhar de Woody Allen é sempre tão pessoal e contemporâneo que a correlação com Tennessee Williams parece ter sido mais um ponto de partida do que uma releitura propriamente dita. Blue Jasmine faz uma crítica bastante pesada ao universo das pessoas ricas e seus joguinhos de aparências, mas é igualmente ferino ao retratar os personagens mais simples e seus modos invasivos. No final das contas, o que parece fazer toda a diferença é uma questão de equilíbrio interno: Jasmine não descompensou emocionalmente devido à falência. Ao longo do filme fica claro que, mesmo em seus dias de riqueza e glamour, sua postura diante da vida nunca foi tranquila, enquanto Ginger é feliz com pouco – pecado mortal aos olhos implacáveis da irmã.


Woody Allen é conhecido por sempre oferecer grandes oportunidades a seus atores. Que o diga Mira Sorvino, que depois de trabalhar com ele em Poderosa Afrodite conseguiu não somente um Oscar como também o único papel substancial de sua carreira. Mais recentemente, foi a vez de Penélope Cruz levar a estatueta dourada sob a direção de Allen em Vicky Cristina Barcelona. Em 2014, vai ser muito difícil alguém arrancar o Oscar das mãos de Cate Blanchett. Mérito em parte do roteiro perfeito, mas também uma justa coroação à carreira de uma atriz que nunca está menos do que impecável em cena. Neste papel, Cate realiza a missão quase impossível de atrair empatia para uma personagem egocêntrica, esnobe e desagradável.

A estrutura do roteiro, que alterna o momento presente com situações anteriores, é muito dinâmica e eficaz. Quando a última (e surpreendente) informação sobre a derrocada da protagonista vem à tona, pequenos detalhes que até então poderíamos considerar exagero na trama ou na interpretação de Cate ganham uma dimensão mais trágica e, consequentemente, mais humana.


Blue Jasmine é a feliz reunião de um cineasta e uma atriz em estado de graça e, com isso, quem ganha é o espectador. O filme estreou na última sexta sem exibição prévia para a imprensa, ao menos aqui no Rio de Janeiro. A justificativa da distribuidora foi a de que o filme já havia sido exibido durante o Festival do Rio. 

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Malévola - trailer legendado


Ano passado assistimos a duas Brancas de Neve ofuscadas por suas respectivas madrastas más (Julia Roberts em Espelho, Espelho Meu e Charlize Theron em Branca de Neve e o Caçador). E o filão das reinterpretações de contos de fadas está longe de se esgotar: para 2014 a Disney aposta em uma história da Bela Adormecida contada pela ótica da vilã Malévola. Maleficent, que tem previsão de estreia para 30 de maio, traz Angelina Jolie (que também é produtora do longa) como a terrível feiticeira e Elle Fanning como a princesa Aurora. O elenco conta ainda com Sharlto Copley, Imelda Staunton e Sam Riley. Visual bacana o filme tem, torçamos para que não fique só nisso. Confiram abaixo o primeiro trailer:


Paperboy - o livro


Antes de tudo, cabe esclarecer que Paperboy é um livro sobre o jornalismo. Através de uma família cujo pai e dois filhos se envolvem de uma maneira ou outra no ofício, Pete Dexter discorre sobre temas como talento investigativo, limites éticos e o jogo de vaidade e aparências desta profissão que costuma ser vista de modo excessivamente romântico por aqueles que não a praticam.

A história é narrada por Jack James, o “paperboy” a quem se refere o título. Seu pai é dono de um pequeno jornal e figura de destaque na cidadezinha onde vive e seu irmão mais velho é uma estrela em ascensão em um grande jornal de Miami. Talvez justamente devido a isso, Jack evita o quanto pode o chamado da profissão que parece correr nas veias dos James. Mas depois de sua breve carreira de nadador ter sido interrompida e a faculdade abandonada, só lhe resta retornar à casa paterna e trabalhar como entregador dos jornais do pai. Também seu irmão Ward retorna à cidade em companhia de um vaidoso colega para realizar uma reportagem investigativa que logo se mostra mais complicada e cheia de ramificações do que poderiam supor.

Certamente muitas pessoas que viram apenas a versão cinematográfica dirigida por Lee Daniels ficaram com uma impressão totalmente equivocada sobre essa história. Isso porque o diretor não somente deslocou o foco principal do livro, como também torceu fatos, alterou completamente alguns personagens e quis levantar questões pessoais que nunca estiveram em pauta no (bom) livro escrito por Dexter. Tudo que diz respeito ao assassino e sua noiva chave de cadeia, na verdade, é menos importante do que o processo como foi feita a reportagem em si e suas consequências na vida dos jornalistas envolvidos.

Paperboy é um livro muito bem-escrito e que interessará não somente aos profissionais do meio jornalístico, mas a leitores dos mais diversos perfis. Cabe ressaltar, porém, que não se trata exatamente do um thriller, conforme propagandeado em sua contracapa. Seu foco está muito mais nas armadilhas da profissão, que afetam os personagens de modo diverso: enquanto um deles se perde devido à embriaguez com o sucesso, outro sofre justamente por sua seriedade e apego obsessivo pelo trabalho bem-feito.

Jovem e Bela


François Ozon é um diretor e roteirista bastante inquieto e um filme seu é sempre garantia de um olhar diferenciado, independente do tema escolhido. Neste Jovem e Bela, Ozon traz o argumento básico de “A Bela da Tarde” para o universo adolescente. Isabelle é uma jovem de 17 anos sem nenhum grande problema emocional ou financeiro que resolve se prostituir. Movida pela curiosidade, ela parece se importar menos com o dinheiro que ganha e mais com a possibilidade que essa vida dupla lhe oferece de investigar seus próprios desejos e sensações.

Eis uma curiosa crônica sobre a hipocrisia de uma sociedade que posa de liberal, mas tem limites muito mais estreitos do que gosta de crer. O longa se divide em quatro capítulos, cada um dedicado a uma estação do ano, e que simbolizam a maturação de uma menina para mulher. Atenção para o modo como todas as pessoas mudam sua visão a respeito de Isabelle uma vez descobertas suas atividades. Mesmo sua mãe parece sentir-se desconfortável e desconfiada, como se nenhum homem mais estivesse livre das perigosas garras de uma menina ainda nem saída da adolescência.

É bem verdade que este não é um Ozon tão perturbador como o recente Dentro da Casa, mas vale a pena conferir mais essa provocação do cineasta francês. O filme esteve em competição no Festival de Cannes deste ano e já tinha sido sucesso no Festival do Rio antes de chegar ao circuito comercial.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Cine Holliúdy


Não sabe o que é “joiado” ou “ispilicute”? Nunca tomou uma “voadora na pleura”? Tenha nervo! Não há razão para se sentir perdido, afinal de contas o criativo Cine Holliúdy é o primeiro longa brasileiro falado em cearensês. O diretor, produtor e roteirista Halder Gomes encontrou uma solução para manter o modo colorido de se expressar de seus conterrâneos e, ao mesmo tempo, conquistar o público não-cearense: legendou o filme. Mais do que uma ferramenta, as legendas criam uma divertida correspondência com o protagonista, que dubla por conta própria filmes vagabundos de kung-fu para atender às suas necessidades de exibidor do sertão.

Francisgleydisson é um como artista mambembe, mas não de circo ou teatro: seu barato é levar o cinema – mais especificamente filmes de pancadaria – às cidades do interior do Ceará. Mais do que um mero exibidor de filmes, ele se vê como um verdadeiro astro de filmes de ação. Como a história é ambientada nos anos 70, o grande conflito do protagonista é a ameaça de ter seu ganha-pão destruído pela chegada, ainda que tardia, da televisão. Impossível não se lembrar de Ed Wood pelo modo como o personagem conjuga a falta de recursos e conhecimento com o mais genuíno amor pela sétima arte. Francisgleydisson respira e delira cinema e mantém sua paixão viva na marra, apesar do projetor capenga e dos rendimentos que mal sustentam a família.

Grande parte do mérito vai para o ator Edmilson Filho, que dota seu personagem de uma graça e carisma únicos. Também vale destacar a galeria de personagens secundários impagáveis: a molecada que sofre na mão do menino rico dono da bola e da única TV; o prefeito estilo Odorico Paraguaçu e a primeira-dama periguete (ou melhor, ispilicute); o político de oposição que quer ver o circo pegar fogo; o garoto Valdisney (=Walt Disney) que toma caldo de feijão e finge que é Nescau; os torcedores fanáticos que vão ao cinema com radinho de pilha; os policiais que adoram posar de autoridades máximas; e mais toda uma fauna de malucos que se reúne sob o mesmo teto para conferir a chegada do cinema à cidade.


O elenco mistura atores locais com rostos mais conhecidos como Roberto Bomtempo e Miriam Freeland e ainda conta com participações especiais divertidas, como o cantor Falcão como um cego que não quer perder o filme e o também cantor Marcio Greyck como o comprador da Vanderleia (o carro velho que Francisgleydisson precisa vender para alugar a sala de cinema). Destaque também para o menino Joel Gomes (o Francisgleydisson Filho, ou “Francinho”) e seu ar repleto de admiração pelo talento nato do pai para contar histórias extraordinárias. Mais que tudo, em tempos de comédias copiadas do formato televisivo, Cine Holliúdy apresenta um humor cheio de frescor e originalidade.

A direção de Halder Gomes, conhecido por seus curtas, é das mais inspiradas e não deixa que as risadas ofusquem a mensagem séria a ser veiculada: o cinema não é uma realidade no interior do país. E este é um problema que não ficou nos anos 70, já que, segundo o filme, de todos os cento e tantos municípios cearenses hoje em dia somente cinco (capital inclusa) possuem salas de cinema. Em uma deliciosa contrapartida, Cine Holliúdy chega ao sudeste depois de ser um fenômeno em sua terra natal. Mesmo com o circuito ainda reduzido, o filme conseguiu, com apenas nove cópias, figurar várias semanas na lista dos mais vistos no país. 

Tatuagem


Tatuagem marca a estreia do pernambucano Hilton Lacerda – roteirista dos filmes de Claudio Assis, entre outros – na direção de longas. O filme, que foi o vencedor do Kikito de Ouro no Festival de Gramado e saiu do Festival do Rio com cinco prêmios, é ambientado na Recife do final dos anos 70 e tem como protagonista Clécio, um agitador cultural que promove espetáculos altamente irreverentes e sensuais em seu cabaré anarquista. Em torno dele, gravitam poetas, intelectuais, doidões e inconformados em geral, mas a harmonia reinante no cabaré Chão de Estrelas fica um pouco abalada a partir do momento em que Clécio se apaixona por um jovem soldado, chegando ao ponto de alguns cogitarem que o rapaz é um agente infiltrado.

Hilton Lacerda optou por seguir o mesmo tom de anarquismo do cabaré ao longo do filme. Tatuagem é uma explosão de bom humor e irreverência. Também o afeto pontua o filme do início ao fim. Não somente no que diz respeito ao romance do protagonista, mas ao tom da história mesmo, que retrata um contexto e uma época onde era menos confuso ter uma posição política e saber de que lado se posicionar.

As apresentações e performances são um show à parte e revivem o tropicalismo típico da época. Uma música em especial faz o público gargalhar, ao descrever os diversos tipos de... Bom, vejam o filme. À frente do elenco, o carismático Irandhir Santos encanta mais uma vez. É incrível como o ator se supera a cada filme. Destaque também para o divertido Rodrigo Garcia e para a revelação Jesuíta Barbosa  ambos premiados no Festival do Rio.


A única ressalva a ser feita é o fato de desfecho ser menos empolgante do que tudo que estávamos vendo na tela até então. Mesmo compreendendo a intenção do diretor de mostrar o fim de uma era e a perda da inocência, é sempre um pouco perigoso montar todo um filme em cima da euforia e terminá-lo de modo melancólico. Também o destino de um dos protagonistas destoa um pouco do que vinha sendo construído ao longo da projeção. De todo modo, Tatuagem é um filme belíssimo e que põe na tela a mais pura provocação sem precisar recorrer à agressividade ou à patrulha ideológica.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Ela – trailer legendado


Eis o trailer legendado do aguardado Ela, novo longa do criativo Spike Jonze (de Adaptação e Onde Vivem os Monstros). Estrelado por Joaquin Phoenix, Amy Adams e Scarlett Johansson, o filme se passa em um futuro próximo e conta a história de um homem que está com o coração partido e se encanta com uma voz do mundo virtual. Ela tem previsão de estreia para 17 de janeiro de 2014. 


quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Capitão Phillips


O roteiro de Capitão Phillips é baseado em um acontecimento verídico ocorrido em 2009: a captura do navio de carga americano Maersk Alabama por piratas quando a embarcação navegava pela costa da Somália. Mesmo bem armados, os somalis se veem em uma situação desfavorável quando são surpreendidos pela tripulação e resolvem bater em retirada, mas levam consigo o Capitão Richard Phillips como refém. Enquanto as autoridades americanas decidem como lidar com a situação, o filme se concentra no dilema psicológico entre Phillips e Muse, o chefe do bando.

O longa impressiona pelo modo como consegue manter sempre bastante alto o nível de tensão, embora a trama seja mais interessante até a entrada em cena dos militares. Se antes o embate entre os personagens era instigante, a partir desse ponto a história descamba um pouco para o filme de ação normal. A presença dos militares também traz o sempre desagradável discurso americano do “não negociamos com terroristas”, que não hesita em sacrificar seus cidadãos em nome de manter certos ideais – mas isso não chega a ser um problema do filme em si.


O que certamente poderia ter sido evitado é uma série de situações-clichê, como, por exemplo, a cartinha que Phillips tenta escrever à esposa quando pressente que pode estar prestes a ser sacrificado. É o tipo de cena tão lugar-comum que deveria ter sido deixada de lado, mesmo que tenha de fato acontecido. Por outro lado, é bem construída a crítica que mostra o quanto os funcionários preparados para agir em situações de crise se comportam de modo insensível. Prestem atenção à atitude robótica da médica que aparece uma das cenas finais que, com toda sua eficiência, não percebe que a pessoa à sua frente está emocionalmente devastada.

A presença de Tom Hanks (que parece estar com tudo este ano) como o personagem-título ajuda a dar credibilidade à história, afinal de contas Hanks é um ator que sempre dá peso a um filme. A grata surpresa fica por conta do somali Barkhad Adbi, o ator estreante que interpreta Muse. Adbi demonstra desenvoltura no papel e não se intimida de contracenar com um dos maiores astros do cinema. Todos os atores e não-atores, aliás, são muito adequados e passam bem a sensação de realidade, a começar pelas cenas iniciais que mostram a rotina de trabalho dentro do navio. 


O cineasta britânico Paul Greengrass vem dividindo sua carreira entre produções cultuadas como Domingo Sangrento e Voo United 93 e longas mais comerciais como Zona Verde e os dois da franquia Bourne que dirigiu (a Supremacia e o Ultimato). Em Capitão Phillips, mesmo escorregando em alguns clichês, Greengrass encontra um bom equilíbrio entre o cult e o pipoca e realiza um thriller bastante eficiente. 

Uma curiosidade: a produção dinamarquesa Sequestro (Kapringen), realizada um ano antes de Capitão Phillips e ainda inédita por aqui, conta uma história praticamente igual.

Sharknado estreia na TV paga


O canal pago SyFy exibe no próximo 22 de novembro às 21h o trash-sensação Sharknado. O filme, que mostra Los Angeles atingida por um tornado de tubarões por conta de um desastre ecológico, vinha causando frisson nas redes sociais graças a seu argumento surreal. Nos Estados Unidos, a audiência de 1,5 milhões de telespectadores garantiu a aprovação de uma sequência para 2014. Desta vez, os tubarões atacarão a cidade de Nova York.

Animação nacional pré-selecionada para o Oscar


O longa brasileiro Uma História de Amor e Fúria foi um dos 19 filmes pré-selecionados para concorrer a uma vaga para o Oscar 2014 de melhor filme de animação. Dirigido por Luiz Bolognesi (roteirista de Chega de Saudade e As Melhores Coisas do Mundo), o filme já venceu o prêmio principal do Festival de Annecy, na França, premiação que é considerada uma das mais importantes no setor da animação.

Os cinco concorrentes ao Oscar serão divulgados pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas no dia 16 de janeiro de 2014 e a 86ª cerimônia do Oscar acontecerá no dia 2 de março.

Uma História de Amor e Fúria já está disponível em DVD e Blu-Ray. A trama acompanha ao longo de seis séculos o amor entre Janaína e um guerreiro indígena que, ao morrer, assume a forma de um pássaro. Os personagens principais são dublados por Camila Pitanga, Selton Mello e Rodrigo Santoro.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Elementary


Eis uma série que tinha tudo para dar errado e aos poucos se firmou como um entretenimento bastante eficiente. Elementary, uma versão moderna dos casos de Sherlock Holmes, estreou ano passado com a desvantagem de ter sido precedida pela excelente minissérie da BBC (Sherlock, que estreou em 2010 e apresentou duas temporadas de três episódios cada). Além do mais, parecia pouco consistente trazer para Nova Iorque um Sherlock recém-saído de uma clínica de reabilitação monitorado por uma doutora Joan Watson de feições orientais. Liberdades com o personagem já foram tomadas muitas vezes nos últimos anos, mas a coisa simplesmente parecia ter passado da conta dessa vez. Mas a verdade é que, vencida a desconfiança inicial, Elementary funciona muito bem.

O Sherlock Holmes de Elementary é falastrão, egocêntrico e com uma mente aguçada que é diametralmente oposta à sua falência total no campo pessoal. A abordagem proposta por Jonny Lee Miller faz com que o espectador se irrite com o personagem em um primeiro momento, mas em pouco tempo se afeiçoe às suas esquisitices. Já a Watson de Lucy Liu é ponderada e equilibrada, porém muito sagaz. Antes de trabalhar com reabilitação, era uma cirurgiã e abandonou a medicina após cometer um erro fatal – é interessante que a personagem tenha conflitos próprios que vão além dos casos que investiga com Sherlock.

A boa química entre Jonny Lee Miller e Lucy Liu flui sem que haja um desnecessário apelo para a tensão sexual – o que não impede o espectador de se perguntar sobre possíveis desdobramentos nesse sentido. A adaptação dos casos é feita de modo bastante coerente, dando vida própria às novas versões dos personagens e criando correspondências interessantes. Enfim, vale conferir a primeira temporada da série. A segunda está no ar desde a semana passada e pode ser vista toda quinta à noite no Universal Channel. 

Uma Noite de Crime


Uma Noite de Crime (The Purge, no original) é daqueles filmes que já gravitaram tanto por aí que a gente tem a impressão de que ele já tinha entrado em circuito há muito tempo. Mas não, estreia nesta sexta. O filme, escrito e dirigido por James DeMonaco, se passa em uma realidade alternativa onde o governo americano encontrou uma solução para lá de radical para conter a criminalidade: uma noite por ano, durante exatas 12 horas, a polícia cruza os braços e todo e qualquer crime é permitido. Simples assim, sem justificativa ou punição. Basta que o cidadão guarde sua raiva para o chamado Dia do Expurgo.

Na prática, essa noite de liberação acaba se convertendo em um problema somente para os pobres, que não podem arcar com sistemas defensivos eficientes. E como a natureza humana sempre aflora quando retirado o verniz social, não demora até que alguns cidadãos comecem a caçar outras pessoas por esporte. Ethan Hawke é James Sandin, um cara que fez fortuna vendendo sistemas de segurança. Sua casa obviamente está bem preparada para enfrentar uma noite de barbárie, mas não há alta tecnologia que preveja o risco das decisões emocionais, como a de seu filho adolescente, que resolve abrir as portas para um homem perseguido por um bando de adolescentes, dessa forma atraindo o problema para dentro de casa.


O filme vem dividindo opiniões mundo afora e tem recebido muitas comparações com Os Estranhos (provavelmente por conta das máscaras usadas pela gangue), mas são filmes que focalizam questões diversas. Em Uma Noite de Crime, mais interessante do que a banalização da violência promovida pelos jovens (porque não chega a ser uma surpresa que jovens mimados se comportem assim perante os mais desprotegidos) seria analisar a incontrolável hostilidade dos moradores do condomínio perante a família Sandin. Seria, porque o filme não apresenta razões para essa aversão dos vizinhos contra a família. James enriqueceu vendendo segurança, mas por que isso seria um problema para os demais? Teria a ver com algum tipo de desprezo contra novos-ricos? Não se sabe. O que é uma pena, já que esse ponto poderia ser um bom diferencial para o longa.

Já o viés de crítica social escolhido, ou seja, a ideia de ricos caçando pobres por puro esporte já foi mais bem explorado em outros filmes e acaba por enfraquecer ainda mais um argumento que já partia de uma premissa meio absurda. Descontadas essas falhas estruturais, o filme até rende algumas sequências bacanas, principalmente por conta do clima de claustrofobia e pânico que toma conta da casa. Também vale observar a transformação pela qual passa a família pacata e certinha, uma vez tendo que buscar a sobrevivência sem ajuda dos sistemas de segurança. Outro ponto a favor do filme é ter como protagonista Ethan Hawke, um ator que tem uma grande capacidade de conferir credibilidade a seus personagens.


Uma Noite de Crime tem seus momentos e algumas cenas eletrizantes, mas infelizmente falha em desenvolver as várias vertentes que poderiam surgir a partir da ideia inicial. O resultado é uma fita de ação mediana. Ainda assim, já foi dado o sinal verde para uma sequência do filme. Sem Ethan Hawke no elenco.  

O Mordomo da Casa Branca


O filme conta a história fictícia de Cecil Gaines, um jovem negro que foi criado no sul dos Estados Unidos, onde vivia em condições ainda semelhantes às da escravidão em plena década de 20. Ao ser tornar adulto, Cecil vai para o norte em busca de uma vida melhor e sua criação como “preto de casa” (assim era chamado pela dona da fazenda) lhe permite arrumar um emprego em um hotel de luxo, onde seus modos refinados chamam a atenção do responsável pelas contratações na Casa Branca, sendo, desse modo, recrutado como mordomo, função que desempenha por quase trinta anos. Sua posição de estar ao lado do homem mais poderoso do mundo e, ao mesmo tempo, ser invisível lhe permite testemunhar os bastidores do poder.

Não há dúvida de que Lee Daniels (de Preciosa) tem muitas ambições para este filme. A começar pelo pretensioso título original, Lee Daniels’ The Butler. Ora, um cineasta só deveria antepor seu próprio nome ao título do filme caso seja muito consagrado ou já possua um estilo muito marcante e Daniels não se encaixa em nenhuma das duas situações. Sem contar que as questões sociais, raciais e políticas poderiam ter sido exploradas de modo menos panfletário e maniqueísta. Desde o princípio, fica evidente qual é a correlação que o filme tenta estabelecer: um paralelo entre o homem negro que passou a vida servindo presidentes brancos e o primeiro negro a ser eleito para o cargo mais importante do mundo. Também incomoda que o roteiro que tente vender como herói um personagem que passou a vida sendo subserviente, a ponto de se descuidar da própria família para melhor desempenhar essa função.

As interpretações de Forest Whitaker e Oprah Winfrey são boas e o filme conta com um elenco coadjuvante estelar, além da curiosidade de ver atores famosos como ex-presidentes, tais como Robin Williams (Eisenhower), Liev Schreiber (Lyndon Johnson), John Cusack (Nixon), James Marsden (John Kennedy), e Alan Rickman e Jane Fonda como o casal Reagan. Mas o capricho da produção não consegue mascarar os tropeços do filme, sejam eles de dramaturgia ou de ritmo. O longa tem 132 minutos, duração injustificável se considerarmos que na sua segunda metade pouca coisa de relevante acontece e as cenas começam a seguir o caminho da obviedade, além do protagonista sofrer uma mudança de personalidade não muito bem delineada. Além do mais, as sequências começam a ser cada vez mais sublinhadas por uma trilha sonora irritante e grandiloquente.

Lee Daniels deixa claro que está visando novas indicações ao Oscar e tenta realizar um longa com “a cara da Academia”, como se fosse uma mera questão de juntar certos ingredientes para obter um resultado satisfatório. Pode ser até que ele consiga, afinal de contas com a Academia nunca se sabe, mas esse filme só vem confirmar o que já havíamos visto nos seus trabalhos anteriores: a sua extrema inabilidade como cineasta.