quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Noite Estrelada no Odeon


No que talvez tenha sido a noite mais repleta de estrelas até agora, o Odeon abrigou nesta quinta-feira duas sessões concorridíssimas em sequência: a première de gala da Mostra Foco Argentina – cinematografia homenageada deste ano – apresentou o longa Dois Irmãos, de Daniel Burman. Foi seguida da exibição de Como Esquecer, filme brasileiro de Malu de Martino da Mostra Competitiva que tem Ana Paula Arósio, Murilo Rosa e Natália Lage no elenco.

A primeira sessão, às 19h15, contava com as presenças do diretor Daniel Burman e da grande dama do cinema argentino Graciela Borges, além de autoridades brasileiras e argentinas. A première brasileira, às 21h45, contava com grande parte do elenco e equipe técnica e foi precedida pelo divertido curta O Bolo, dirigido por Robert Guimarães e estrelado por Fabiula Nascimento e Flavio Bauraqui, que também passaram pelo tapete vermelho.

Confiram abaixo algumas fotos da noite:

Ilda Santiago, Graciela Borges e Daniel Burman antes da exibição de Dois Irmãos

Simpáticos, Graciela Borges e Daniel Burman posam para uma foto exclusiva

Malu de Martino com o elenco no tapete vermelho: Ana Paula Arósio (linda de cabelos curtos), Bianca Comparato, Natália Lage (atrás), Arieta Corrêa e Murilo Rosa

Dentro da sala de exibição, Malu, Fernanda Tavares com o marido Murilo, Arieta e Ana Paula

Robert Guimarães apresenta seu curta O Bolo ladeado por Fabiula Nascimento e Flavio Bauraqui

Elenco e equipe de Como Esquecer no palco pouco antes da exibição do filme

Malu, Arieta e Ana Paula após a sessão, felizes com a boa acolhida do filme pelo público

O Homem do Lado


O célebre arquiteto franco-suíço Le Corbusier projetou um único trabalho no continente americano: a Casa Curutchet, localizada em La Plata, na Argentina. A obra, de traços futuristas para sua época (1949-1953), é não apenas um cenário como também importante personagem em O Homem do Lado. No filme, a casa pertence a Leonardo, um bem-sucedido designer e professor universitário. Um dia, ele e a esposa são acordados por um estrondoso barulho e descobrem que o vizinho Victor resolveu construir uma janela bem de frente para a casa deles. Leonardo argumenta que aquilo não é permitido, mas Victor refuta seus argumentos sempre de forma amistosa, porém muito firme. O impasse se estende e tanto a questão da janela como as constantes intromissões de Victor em sua rotina irritam Leonardo a ponto de começar a prejudicar seu trabalho e sua relação familiar.

O filme parte de uma questão de vizinhos que poderia ser resolvida sem maiores danos para entrar no terreno das relações humanas em geral. A junção entre essas duas personalidades opostas, ou seja, a tremenda “falta de noção” de Victor e a dificuldade de encarar conflitos de Leonardo transforma o que seria um problema relativamente pequeno em uma novela interminável. É sempre complicado se livrar de uma companhia indesejável, e mais ainda se tal companhia está a poucos passos de você e pode observar sorrateiramente todos os seus movimentos. Junte-se a isso o aspecto levemente ameaçador de Victor (ao menos, pelo olhar de Leonardo) e está criada a base para o surgimento de uma paranóia. O longa desenvolve com habilidade o choque entre essas duas personalidades e a progressão da irritação de Leonardo, que, sentindo-se acuado, começar a ter problemas em todas as áreas de sua vida. É um longa engraçado, mas também um pouco perturbador. Uma pena que os diretores tenham tropeçado justamente no desfecho, que deixa uma impressão de solução de última hora e não condiz muito com o tom que o filme vinha apresentando até então.

O Homem do Lado (El Hombre de al Lado), de Mariano Cohn, Gastón Duprat. Argentina, 2009. 101 minutos. Mostra Foco Argentina

Nota: 7,0

Terça Depois do Natal


Mais um exemplo de que não é preciso inventar muito para se fazer bom cinema. Com um argumento simples e até mesmo prosaico, este longa romeno conquista justamente por trabalhar com competência em cima da simplicidade. Bom roteiro, boas atuações e boa direção de atores, mais ou menos o que mestre Woody Allen vem fazendo há décadas. Na primeira cena, vemos um casal apaixonado na cama. Através dos diálogos, percebemos que ele, Paul, é casado e tem uma filha. A moça a seu lado é Raluca, sua amante há seis meses. O Natal se aproxima, época sempre complicada para os que amam ilicitamente, e uma série de impasses e incidentes pressionam Paul a tomar uma decisão entre continuar com a esposa Adriana ou assumir sua paixão por Raluca.

OK, você já leu um argumento assim milhões de vezes. E provavelmente acha que ele resulta num filme apelativo, cheio de lágrimas e maniqueísmos, mas não é o caso. O mais contundente em Terça Depois do Natal é sua firme determinação em não vilanizar nenhum personagem. Raluca não é uma jovem destruidora de lares, Paul não é um galinha inconsequente e Adriana não é uma megera que empurrou o marido para os braços da amante. E quando se tem personagens tão humanos, o espectador fica sem saber como reagir, porque sabe que não há um “partido” a ser tomado. Nem mesmo para Paul, que, via de regra, seria o único com uma escolha, as coisas se revelam tão simples. Isso fica claro na cena em que ele finalmente toma sua decisão (não, não vou revelar qual) e logo a seguir diz que não está certo de querer aquilo. Econômico em suas situações, verdadeiro em seus diálogos e com um desfecho preciso, Terça Depois do Natal é mais uma boa surpresa vinda da Romênia, país que não tem nos decepcionado na sétima arte. Que venham mais filmes de lá.

Terça Depois do Natal (Marti, Dupa Craciun), de Radu Muntean. Romênia, 2009. 99 minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 8,5

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O Segredo da Rua Ormes


Yannick é calouro do curso de cinema e acaba de se mudar quando está andando de bicicleta pela pacata Rua Ormes do título e leva um tombo feio. Machucado e com o celular avariado, pede para usar o telefone da casa da família Beaulieu e acaba sequestrado pelo patriarca Jacques Beaulieu, um psicopata que se considera portador da missão divina de punir os injustos. Yannick torna-se prisioneiro da casa onde também vivem a esposa submissa Maude, a filha adolescente Michelle e a caçula Anne, criança seriamente abalada pela insanidade familiar. Jacques vê-se num impasse: não quer matar Yannick porque ele não é um dos seus “injustos”, mas tampouco pode deixá-lo ir embora. Jogador invencível de xadrez, por fim resolve educar o rapaz através de suas repetidas vitórias e, assim, provar que está certo.

Um interessantíssimo painel da loucura familiar, baseado na sempre polêmica discussão sobre a subjetividade da justiça. Jacques não se considera um marginal e sim um pai de família que educa as filhas dentro de estritos códigos morais norteados por sua regra de ouro: matar apenas os maus e, mesmo assim, sem aplicação de violência desnecessária. Civilizado, não? Lembra, sob vários aspectos, a personagem de Catherine Keener em Um Crime Americano, que também se julgava justa e sustentava estar apenas educando sua vítima. É a presença de Yannick que põe em perigo essa fantasia e faz com que cada um dos Beaulieu, incluindo o próprio Jacques, questione os alicerces daquela estrutura familiar.

Mas se Yannick altera a harmonia dos Beaulieu, em contrapartida também é afetado pela convivência forçada com Jacques e sua retórica sobre vencedores e perdedores. Com o tempo, não basta para Yannick saber que aquilo é errado; ele precisa que Jacques o admita. Precisa dobrá-lo, superá-lo, algo que nunca conseguiu com o próprio pai. É esse desdobramento que coloca o longa num patamar acima, indo além do mero jogo de gato e rato e embarcando numa viagem psicológica mais profunda. O duelo entre os ótimos Marc-André Grondin (do cultuado C.R.A.Z.Y.) e Normand D’Amour em torno do tabuleiro de xadrez, numa clara menção ao clássico de Bergman O Sétimo Selo, é muito bem conduzido, aumentando progressivamente o suspense por aqueles jogos de vida e morte conforme a sanidade mental de Yannick também é posta em xeque. É uma pena que a direção tenha se excedido um pouco conforme o filme se aproxima do desfecho, transformando a parte final em um freak show um pouco desnecessário.

O Segredo da Rua Ormes (5150, Rue des Ormes), de Éric Tessier. Canadá, 2009. 106 minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 8,0

Protektor


Um interessante filme sobre os limites entre proteção e privação de liberdade. Na Tchecoslováquia de 1939, conhecemos a atriz Hana e seu marido Emil. Ela é uma estrela em ascensão no cinema e ele, um radialista de segundo escalão. Emil morre de ciúmes da esposa e dos homens que gravitam à sua volta. Quando o país é ocupado pelo exército alemão e anexado ao Reich, a carreira promissora de Hana é subitamente interrompida devido à sua ascensão judaica. Já Emil é promovido e se torna colaborador do regime. A princípio, a contragosto, como um modo de proteger Hana, mas logo ele se transforma na grande voz da propaganda nazista no rádio.

Vale notar que Emil, mesmo não partilhando dos dogmas nazistas, se orgulha da fama alcançada através de sua retórica em favor do regime. Os papéis invertem-se, agora é ele quem dá autógrafos enquanto Hana fica trancada dentro de casa. O personagem é retratado como um apolítico, um alienado, que não dá a mínima bola para o fato de estar colaborando com um governo que restringe as liberdades individuais e manda os indesejados para a morte. Também Hana passa a impressão de estar preocupada apenas com si própria e com sua queda de prestígio e não propriamente com o que vem acontecendo em seu país. Com personagens egoístas e até mesmo infantis, Protektor faz um bom painel do cidadão comum, preocupado com seu pequeno mundinho. O perigo de usar personagens egoístas em um filme com temática assim é o espectador não conseguir se importar muito com o destino deles, mas, de todo modo, é uma abordagem diferenciada para um assunto que costuma se dividir sempre entre grandes heróis e vilões absolutos.

Protektor (idem), de Marek Najbrt. República Tcheca, 2009. 100 minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 7,0

terça-feira, 28 de setembro de 2010

King’s Road


Depois de três anos afastado da família, Junior regressa à Islândia com o amigo Rupert, na esperança de conseguir com o pai dinheiro para saldar suas dívidas. Ao encontrar a família, é mal-recebido e descobre que o pai rico e pão-duro está morando há vários meses em um acampamento de trailers juntamente com a nova esposa Sally e que sua avó Maria agora anda pra cima e pra baixo com uma foca empalhada como animal de estimação.

Essa pequena sinopse não dá conta da quantidade de tipos e situações surreais mostrados no filme. A tal King’s Road, um fim de mundo de dar dó, é povoada de gente estranha por todos os lados. Tem o sujeito que dá uma de guarda trânsito e faz questão de atravessar as pessoas, mesmo não tendo nenhum tráfego na região. Tem os amigos hippies de Maria, que passam o dia fumando trancados dentro de um carro. E o próprio Junior e seu misterioso amigo-amante (o docinho Daniel Brühl, para minha surpresa e alegria) tem uma relação esquisitíssima e todos os parentes parecem achar normalíssimo os dois dormindo abraçadinhos de cueca.

King’s Road é o segundo longa do islandês Valdis Óskarsdottir, montador de Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, dentre outros. O maior problema do filme é atirar em direções demais e não centralizar a trama em nada muito específico. No final das contas, a despeito de apresentar uma série de sequências divertidas em isolado, o longa acaba não tendo um bom fio condutor a uni-las. Um filme curioso, é verdade, mas que fica parecendo um festival de esquetes com algumas cenas muito engraçadas e outras nem tanto.

King’s Road (Kóngavegur), de Valdis Óskarsdottir. Islândia, 2010. 99 minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 6,0

Água Fria do Mar


Aimeudeus, mais um daqueles filmes que fazem você maldizer a hora em que escolheu justamente aquela sessão dentre tantas opções. Por que, oh, por quê? A sinopse até sugeria algo interessante, vejam bem: um jovem casal segue de carro para a costa do Pacífico quando encontra uma menina que diz ser órfã e ter fugido do tio que a molestava. Eles não sabem o que fazer e deixam para decidir na manhã seguinte, mas, ao acordarem, constatam que a menina sumiu e que a praia está repleta de cobras venenosas, expulsas do mar por uma corrente marítima.

Parece um suspense, certo? Errado. Desde o princípio vemos que a menina não é órfã e está mentindo e que, na verdade, sua família está acampada perto dali. Travessura de criança entediada, pelo menos não há nada no filme que sugira o contrário. O tal jovem casal está em crise, aparentemente causada pela intromissão dos pais de ambas as partes, o rapaz tem uma casa a vender e a mocinha passiva se sente entediada e parece ter problemas de incontinência, mas, enfim, nada disso cria nenhum conflito ou ponto de interesse e as duas vertentes da história (se é que se pode chamar isso de história) seguem em paralelo, tendo como interseção apenas o breve encontro da menina com o casal. Mas o fato deles terem se conhecido não leva a lugar nenhum.

E as cobras? Bom, as cobras tampouco tem algo a acrescentar a uma trama onde nada está acontecendo mesmo. Estranho mesmo é observar na ficha técnica que o filme é uma co-produção envolvendo cinco países. Tanta gente envolvida para isso?

Água Fria do Mar (Agua Fría de Mar), de Paz Fábrega. Costa Rica / FRA / ESP / Holanda / MEX, 2009. 83 minutos. Première Latina

Nota: 1,0

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O Errante


Quando você acha que já viu muita coisa ruim, aparece um filme para te desmentir completamente. O Errante não apenas é a coisa mais deprimente vista neste Festival, como também um dos piores filmes que eu vi na minha vida. O filme tem uma hora e vinte minutos, talvez porque nenhum ser humano suportaria mais tempo de algo tão chato e desprovido de interesse. A história (?) gira em torno de Isaac, filho único de uma família judia ortodoxa. Isaac tem sérios problemas de comunicação não apenas com os pais, mas com o mundo. Um problema de saúde o preocupa, assim como a pressão dos pais para que ele se case e constitua família, e ele passa os dias perambulando pelas ruas, sem rumo (daí ele ser “o errante”, oh, que original). E o filme basicamente é isso, Isaac anda e depois bebe água (por causa do problema de saúde), aí anda mais um pouco e fura o sapato, bebe mais água, depois o pai lhe dá sapatos apertados, mas ele continua andando e bebendo água... Achou chato? Imagine eu, que assisti. Quando o diretor tenta inserir algum conflito na história, já em seus minutos finais, o resultado é ainda pior e o que se vê na tela são algumas cenas bem grotescas. Resta apenas saber como esse exemplo de péssimo cinema conseguiu ser selecionado para a Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes deste ano.

O Errante (Ha’Meshotet), de Avishai Sivan. Israel, 2010. 86 minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 0

A Woman, a Gun and a Noodle Shop


Eu não sabia bem o que esperar dessa refilmagem chinesa de Gosto de Sangue, o primeiro longa dos irmãos Coen. Melhor, tinha uma vaga e equivocada idéia, com base nos filmes mais recentes de Zhang Yimou, como Herói, O Clã das Adagas Voadoras e A Maldição da Flor Dourada. Ou seja, um filme sério, com muitas lutas e um visual imponente. Tudo isso tornou ainda maior minha surpresa diante desta maravilhosa comédia tresloucada.

Wang é o dono da lojinha de macarrão do título e vive no seu pequeno feudo com a mulher que comprou há dez anos (considerando sua aparência jovem, façam as contas) e seus funcionários. Insensível e tirano, Wang maltrata a mulher e passa meses sem pagar os empregados, embora tenha fortunas em seu cofre. A mulher inicia um caso com Li, um dos cozinheiros, e compra uma arma de um mascate. Ao mesmo tempo, Wang, ciente da traição, paga um policial para assassinar os dois e sumir com os corpos. Mas cada um dos envolvidos tem seu próprio plano e todos querem encontrar um modo de pôr as mãos no dinheiro.

Em primeiro lugar, não se trata bem de um remake de Gosto de Sangue. O filme é mais uma paródia ao universo dos manos Coen, com seus personagens bizarros e planos infalíveis que dão completamente errado, mas no geral tem um tom muito mais próximo de outros filmes deles, como Queime Depois de Ler. No lugar do caipira do meio-oeste americano, habitantes de uma província desértica na China imperial (o período não fica bem definido, mas o fato do revólver ser uma novidade joga a trama para o século XIX). Também sobram várias referências ao western americano, ao film noir e ao cinema como um todo, em um festival de esculhambação sem fim. E tudo isso sem deixar de lado as características visuais do cinema de Zhang Yimou, como a fotografia de cores fortes e a direção de arte caprichada. Tem uma cena dos empregados preparando macarrão como se fossem ninjas que, inclusive, soa como uma autoparódia a seus filmes mais sérios. O ritmo do longa é crescente, tornando a trama cada vez mais ágil, surreal e engraçada. Sobretudo, é um filme que não tem medo do ridículo e, com isso, alcança o patamar da genialidade.

Infelizmente, minha recomendação chega tarde, já que A Woman, a Gun and a Noodle Shop teve sessões apenas no primeiro final de semana do Festival. Mas fiquem de olhos bem abertos para a repescagem, porque a fita é imperdível.

A Woman, a Gun and a Noodle Shop (San Qiang Pai An Jing Qi), de Zhang Yimou. Hong Kong / China, 2010. 95minutos. Mostra Panorama do Cinema Mundial

Nota: 10

domingo, 26 de setembro de 2010

Sinopse do Ano


Todo Festival tem aquele título criativo ou aquela sinopse tão absurdamente estranha que deixa todo mundo louco para assistir ao filme em questão. Esse ano, com toda certeza, o prêmio de sinopse mais bizarra vai para um filme francês chamado Rubber (sim, isso mesmo, "borracha"). Vejam só:

"Em algum lugar do deserto californiano, um pneu telepático acorda subitamente para uma missão demoníaca, isto é, assassinar todos os seres que vir pela frente. Os habitantes da região assistem incrédulos aos crimes cometidos por esta espécie de serial killer das rodovias, que sente-se misteriosamente atraído por uma bela jovem. Em paralelo, uma investigação é lançada."

Rubber tem sessões previstas entre os dias 2 e 5 de outubro e seus ingressos ainda não estão liberados para venda. Torçamos para que a fita chegue a tempo, já que dificilmente haverá nova oportunidade para que o cinéfilo carioca a veja. Detalhe: o filme foi exibido este ano em Cannes, da Semana da Crítica.

À Oeste de Plutão


Estava demorando para aparecer ele, o primeiro candidato sério ao posto de pior filme deste Festival. À Oeste de Plutão envergonha a cinematografia do Canadá, que sempre traz novidades no mínimo curiosas para o Festival do Rio. O filme faz um recorte de 24 horas na vida de alguns adolescentes canadenses que estudam na mesma escola de ensino médio nos subúrbios de Québec. Ou seja, mais uma produção na linha “quero ser Gus Van Sant”.

O fiapo de roteiro se limita a acompanhar os supostos conflitos de uma garotada de classe média, mas tais problemas, na verdade, não passam de estereótipos batidos do adolescente “rebelde sem causa”. Tem o garoto tímido que não consegue se declarar, o que vive batendo de frente com a mãe (e que soa como uma imitação frouxa do protagonista de Eu Matei Minha Mãe), o que não sabe como deve lidar com o novo padrasto, a menina que é ridicularizada pelas costas pela amiga, enfim, um saco de gatos que faz jus ao pior do cinema americano nesse gênero.

Mas a originalidade zero nem é o que mais irrita no filme. Chato mesmo é ter que aturar as conexões astronômicas forçadíssimas, tudo para justificar o título. Teria o roteirista pensado no título primeiro e só depois escrito essa bobagem? Completam o pacote uma fotografia amadora, um elenco idem e uma direção de atores inexistente. Será que alguém ainda tem paciência para uma cena mostrando três garotos discutindo por vários minutos sobre quem vai comer a mãe de quem? Façam-me o favor.

Para não dizer que nada se salva no filme, o cachorro neurótico é legal. Mas só ele.

À Oeste de Plutão (À L’ouest de Pluton), de Henry Bernadet, Myriam Verreault. Canadá, 2009. 95minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 1,0

A Ovelha Negra


O filme acompanha os devaneios de um menino nascido nos anos 60, da infância até os dias de hoje. Depois que a mãe enlouqueceu, ele é cuidado pela avó, já que o pai e os irmãos mais velhos não tem tempo para ele. Na escola, é considerado “fraco da cabeça” e passa de ano apenas porque a avó suborna as professoras com ovos frescos de sua granja. Para se proteger dessa realidade, ele vive imerso em seu universo particular, onde fala sozinho, sonha com extraterrestres, considera-se santo e, sobretudo, morre de paixão pela colega de classe Marinella. Quando seus irmãos cometem um crime, o garoto fica agitado e acaba sendo internado no mesmo sanatório onde sua mãe viveu os últimos anos.

Um olhar poético sobre a intolerância da sociedade com as pessoas fora do padrão usual. Nos fabulosos anos 60 – como o protagonista gosta de chamar a década na qual nasceu – a internação era uma solução largamente utilizada para resolver o constrangimento de ter um filho “diferente”. O problema já foi denunciado nos mais diversos filmes, desde Garota, Interrompida até o brasileiro Bicho de Sete Cabeças. O diferencial deste A Ovelha Negra está no estilo, pois toda a trama é concebida pela ótica do protagonista, que, adulto, tornou-se de fato uma pessoa com problemas mentais.

O filme se apóia muito em uma linguagem metafórica e abusa da cronologia fragmentada. Os solilóquios do personagem tem a lógica interna do discurso do louco, com suas obsessões e memórias recorrentes. O único problema é que este formato, ao mesmo tempo em que torna o filme bastante original, também atravanca um pouco a sua fluência, deixando-o excessivamente narrativo. O diretor, roteirista e protagonista Ascanio Celestini, que vem de uma carreira teatral, entrega um trabalho que tem um perfil que certamente caberia melhor nos palcos do que nas telas. Mas, de todo modo, não se pode negar que o longa impressiona. É bastante dolorido – sem ser piegas – e faz com que o espectador se sinta um pouco mal ao partilhar de forma tão íntima da vida daquele homem. É daqueles filmes que você nem gosta muito assim que termina de vê-lo, mas depois, ao refletir melhor, vai se tomando de um inesperado carinho por ele. E também é válido para que conheçamos Celestini, que é um ótimo ator e uma figura dotada de extraordinário carisma.

A Ovelha Negra (La Pecora Nera), de Ascanio Celestini. Itália, 2010. 92 minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 8,0

Um Homem um Tanto Gentil


Ulrik é um cinquentão que acaba de sair da prisão após cumprir uma pena de doze anos. Ao longo de sua estadia atrás das grades, a mulher o deixou e o filho, hoje com 25 anos, se acostumou a dizer às pessoas que o pai havia morrido. Jensen, o chefe da gangue à qual pertencia, quer ajudá-lo e lhe consegue um emprego de mecânico e um quarto alugado na casa de sua irmã. Em troca, pede que Ulrik se vingue do homem que foi responsável por sua prisão. Jensen acha que seus homens devem sempre acertar as suas contas, senão ele próprio ficaria desmoralizado. Ulrik gostaria de apenas tocar sua vida, mas não consegue dizer não às pessoas, sejam elas bandidos ou mulheres.

Contra si, o filme tem apenas o fato de trabalhar em cima de um argumento muito batido no cinema: o do marginal que gostaria de mudar de vida, mas tem o mundo inteiro empurrando-o de volta à criminalidade. Mas é como dizem os mestres do roteiro, mais importante do que o tema escolhido é o modo de desenvolvê-lo. Um Homem um Tanto Gentil opta por mesclar o tom pesado dos filmes de gangsteres com toques de comédia. Mais ou menos como já havia sido feito no ótimo Na Mira do Chefe, uma fauna de personagens surreais cerca o protagonista. Destaque para Karen Margarethe, a sisuda irmã de Jensen que assedia Ulrik da maneira mais bizarra que uma mulher já assediou um homem. Também é interessante o contraste entre o perfil “profissional” de Ulrik e sua extrema docilidade como ser humano. E, por último, mas não menos importante, nada disso daria certo se o filme não fosse protagonizado por um ator de extrema competência como o sueco Stellan Skarsgard. Com esse filme, Skarsgard prova que é menos reconhecido do que realmente merece.

Um Homem um Tanto Gentil (En Ganske Snill Mann), de Hans Petter Moland. Noruega, 2010. 107 minutos. Mostra Panorama do Cinema Mundial

Nota: 7,5

sábado, 25 de setembro de 2010

Nascidas para Sofrer


Flora é uma solteirona que mora numa pequena vila espanhola e dedicou sua vida a cuidar dos outros. Sua única irmã morreu ainda jovem e ela assumiu a criação das três sobrinhas, agora adultas. Aos 73 anos, seu grande medo é ser posta em um asilo contra a vontade. Desconfiada das sobrinhas, a única pessoa na qual Flora realmente confia é a fiel empregada Purita. A moça trabalha incansavelmente e lhe é totalmente dedicada há anos, portanto Flora decide que quer deixar seus bens para Purita. Ao consultar um advogado pretendendo adotá-la, descobre que são muitos os trâmites e é aconselhada a tomar uma medida mais simples e muito inusitada para garantir que sua vontade seja feita: o casamento.

Por tudo de melodrama que um título desses poderia evocar, Nascidas para Sofrer revelou-se outra deliciosa surpresa. Leva um pouco de tempo para entendermos que tal título de novela mexicana é, na verdade, uma grande ironia, já que a personagem Flora vive repetindo que é tão boa e se sacrificou tanto pelos outros. E é justamente for ela ser tão incisiva que nos perguntamos se as coisas realmente são como ela descreve. Sua relação com Purita joga ainda mais lenha na fogueira, pois ao mesmo tempo em que ela parece tiranizar a passiva empregada, fica a dúvida se também Purita seria a coitadinha que parece. Enfim, neste roteiro habilidoso e aberto a algumas interpretações, o espectador vai mudando sua percepção a respeito dos personagens o tempo todo. Com uma série de reviravoltas pequenas e significativas ao longo de todo o filme, toda vez que pensamos que a trama está a ponto de se estabilizar, novos acontecimentos balançam o status quo da história.

Com um ritmo ágil, boas interpretações e direção segura, Nascidas para Sofrer é um muito interessante retrato das relações pessoais e uma inteligente anedota em cima do velho mote da luta de classes. Divertido na superfície, mas também contundente em vários aspectos. O diretor Miguel Albaladejo já causou sensação há alguns festivais com o igualmente bom Cachorro. Vale a pena conferir este novo trabalho.

Nascidas para Sofrer (Nacidas para Sufrir), de Miguel Albaladejo. Espanha, 2009. 112 minutos. Mostra Panorama do Cinema Mundial

Nota: 8,0

The Topp Twins: Garotas Intocáveis


Vibrante documentário sobre as cantoras gêmeas lésbicas Jools e Lynda Topp, ícones do movimento gay na Nova Zelândia e famosas também como comediantes. O filme faz um panorama bem completo da trajetória das gêmeas, desde a infância em uma fazenda até os dias de hoje, passando por seu início de carreira como artistas de rua e seus primeiros passos como ativistas políticas. Também conhecemos os muitos personagens que elas apresentam em seus shows, numa galeria que compreende de peruas da alta sociedade até uma dupla de fazendeiros machões. Aclamadas por pessoas de todas as tribos e pioneiras em se assumirem de uma forma livre e natural, as irmãs Topp são consideradas figuras de proa na conquista das leis neozelandezas que reconhecem os direitos dos homossexuais.

“Por que ver um filme sobre duas cantoras das quais nunca ouvi falar?”, deve estar pensando o caro leitor a essa altura. Confesso que também o assisti por acaso, devido a uma falha no som da sala onde estava antes. Mas foi um feliz acaso, pois o filme é muito bacana. A começar pelas próprias biografadas, duas artistas dotadas de contagiante alegria e entusiasmo pela vida. Com suas músicas country de letras divertidas, depoimentos cheios de auto-ironia e personagens hilários, conhecê-las já vale o ingresso. Percebe-se pelas imagens de seus shows que sua legião de fãs vai muito além das fronteiras do alternativo, encantando crianças e famílias inteiras. E olha que, no caso delas, a opção sexual não é mero detalhe, já que as letras de Lynda e Jools falam abertamente sobre seu universo.

Num mundo que ainda vira as costas para a diversidade sexual, é até um pouco espantoso constatar como as gêmeas sempre conseguiram se alçar além do preconceito. Desde as palavras tranquilas do pai, típico homem do campo, dizendo simplesmente “só leva um tempo para a gente se adaptar” até o depoimento das respectivas companheiras, chegamos à conclusão de que talvez elas conquistem uma platéia tão heterogênea justamente por serem tão bem-resolvidas. Conforme diz um entrevistado, a importância de Lynda e Jools para o país teria sido justamente trazer uma imagem inédita de pessoas saudáveis e felizes, em contraste com a visão vigente até então do homossexual como um desajustado à margem da sociedade. Considerando que as cantoras hoje em dia são duas senhoras e que devem ter ficado famosas lá pelos anos 70, a gente sai do cinema achando a Nova Zelândia o país mais democrático do mundo.

The Topp Twins: Garotas Intocáveis (The Topp Twins: Untouchable Girls), de Leanne Pooley. Nova Zelândia, 2009. 84 minutos. Mostra Midnight Movies

Nota: 7,0

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A Suprema Felicidade - Filme de Abertura do Festival


Filme de abertura do Festival do Rio deste ano, A Suprema Felicidade chega cercado de uma dose extra de expectativa pelo fato de tratar-se do novo filme de Arnaldo Jabor, que não dirige um longa há vinte e quatro anos (o último foi Eu Sei Que Vou Te Amar, em 1986). Em primeiro lugar, é preciso separar a figura de Jabor – cujas opiniões estão longe de agradar muita gente – do filme em si. Claro que esquecer sua imagem é um pouco difícil, considerando que ele está toda noite na televisão, mas quando se consegue fazer essa separação, a recompensa é assistir a um filme bem distante do tom rancoroso normalmente adotado por seu autor.

A trama, inspirada em memórias de infância do cineasta, se inicia em um Rio de Janeiro tomado pela efervescência do pós-guerra, época em que o protagonista Paulinho tem oito anos e assiste com os pais à comemoração do fim da Segunda Guerra. A história, cheia de idas e vindas no tempo, acompanhará Paulo até seus dezoito anos, assim como vários personagens que habitam seu microcosmo: a mãe, a elegante Sofia; o pai, o aviador Marco; o pipoqueiro da rua, Bené, e seus trocadilhos de cunho sexual; Deise, a moça fascinante e desequilibrada da vizinhança; o melhor amigo, Cabeção; a avó extravagante e com ares de diva de cabaré; e Noel, o avô boêmio que é sua verdadeira figura paterna.

Ao longo do filme ocorrem várias transições, ao mesmo tempo em que as imagens traçam um panorama do Rio de Janeiro dos românticos anos 40/50. No caso de Paulo, são mudanças de menino para adulto, envolvendo os costumeiros questionamentos (o típico “não querer ser como os pais”) e as esperadas explosões hormonais. Já seus pais passam por transformações mais doloridas: a mãe, antes alegre e cheia de talentos, se ressente cada vez mais das restrições impostas pelo marido; ele, por sua vez, desconta na mulher as próprias frustrações profissionais e pessoais. Apenas o fanfarrão Bené parece imutável em sua contação de vantagens. E Paulo, entre grandes porres e paixões complicadíssimas, busca sua própria identidade, tendendo a espelhar-se muito mais no libertário avô do que nos entristecidos pais. Afinal, é justamente o avô que parece estar mais próximo da receita de felicidade – ainda que por dez minutos.


Embora retrate um cotidiano tipicamente carioca, percebe-se no filme uma clara influência Felliniana e, em última análise, do cinema italiano em geral. O roteiro não tem medo de carregar nas tintas da afetividade e do lirismo, no que é bem amparado pela direção de arte cuidadosa e pela bonita trilha sonora (que toma algumas liberdades divertidas, como creditar a autoria de Todo Sentimento, de Chico Buarque, ao avô de Paulo). Por outro lado, em sua tentativa de realizar um “Amacord brasileiro” (palavras do próprio Jabor), o cineasta recheia a trama com tantos personagens e situações colaterais que acaba sobrando pouco espaço para desenvolver os principais. Talvez seja um risco assumido, mas por vezes a sensação de dispersão atrapalha. Sem contar as passagens totalmente autônomas da história, que ali estão no intuito de dar um toque de surrealismo – ou melhor, de Fellini – ao filme. Algumas dessas cenas funcionam melhor que outras: a do teatro mambembe com os anões, por exemplo, é ótima; já a da prostituta esfaqueada parece gratuita. Também o excesso de idas e vindas no tempo não tem uma razão de ser clara.

O elenco está bem de um modo geral, com Marco Nanini sobressaindo-se como o carismático Noel, que parece saído de um filme do Hugo Carvana com seu terno branco. Também João Miguel diverte como o pipoqueiro malicioso que fala as maiores sacanagens diante de crianças e mocinhas de família. Destacam-se, ainda, Mariana Lima, Dan Stulbach e Maria Luisa Mendonça. No meio de tanta gente experiente, Jayme Matarazzo mostra que está amadurecendo como ator e Tammy di Calafiori tem boa presença como a stripper juvenil à imagem de Marylin Monroe.

Resumindo, A Suprema Felicidade é um retorno bem-sucedido de Arnaldo Jabor ao cinema. Não é um Amacord (não vamos exagerar), mas é um bom filme.

A Suprema Felicidade (idem), de Arnaldo Jabor. Brasil, 2010. 125 minutos. Mostra Panorama do Cinema Mundial

Nota: 7,0

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Sinto Sua Falta


Exibido na mostra Geração do Festival de Berlim deste ano, Sinto Sua Falta é mais um filme argentino focado nas feridas deixadas pela ditadura militar. Ambientada nos anos 70, a trama é centrada em Javier, rapaz de quinze anos cujo ídolo é o irmão mais velho Adrián, líder de um grupo de resistência ao regime. Quando Adrián desaparece após ter saído para se encontrar com alguns correligionários, Javier é mandado pelos pais para viver com parentes no México. Assombrado pelo assassinato de Adrián e sentindo-se menos corajoso do que ele, Javier não consegue se decidir entre seguir os passos do irmão ou tocar sua própria vida.

Um filme melancólico e que toca em um tema que ainda assombra os argentinos, que são os filhos desaparecidos na época da ditadura. O drama das famílias que nunca puderam prantear oficialmente a morte de seus parentes é mostrado aqui não sob a ótica de uma mãe desesperada, mas do irmão que sobreviveu. Javier comportava-se como um aprendiz, alguém que queria seguir os passos do irmão que idolatrava, mas, ao mesmo tempo, temia não ter a mesma coragem que ele. Seu desaparecimento coloca-o em posição de, pela primeira vez, ter que tomar as próprias decisões, já que seu modelo não existe mais.

Apesar da perspectiva interessante, o filme tem contra si justamente o fato de seu país de origem ser pródigo em retratar com muita eficácia as mazelas da ditadura, desde filmes que abordam o assunto diretamente – como A História Oficial, Crônica de uma Fuga e Kamchatka – até os que usam o período como pano de fundo, como o recente O Segredo dos Seus Olhos. Ou seja, é um assunto que muitos outros longas argentinos já enfocaram melhor antes. É aquele filme que vale dar uma olhada apenas se estiver numa posição conveniente na sua programação (encaixado entre dois outros que realmente interessam, por exemplo).

Sinto Sua Falta (Te Extraño), de Fabián Hofman. Argentina / México, 2010. 96 minutos. Mostra Foco Argentina.

Nota: 6,0

Complexo: Universo Paralelo

Em 2007, dois irmãos portugueses decidem fazer um documentário no Complexo do Alemão, o maior conglomerado de favelas do Rio de Janeiro. Experimentando vivenciar a realidade dos moradores, os documentaristas buscam fazer um retrato da realidade desses habitantes à margem do poder público. Para exemplificar esse universo, escolhem alguns personagens-chave, como a evangélica Célia, mãe de oito filhos; o funkeiro MC Playboy; e Seu Zé, presidente da associação de moradores há mais de trinta anos.

O típico filme construído sob um olhar gringo, que apresenta fatos que qualquer brasileiro já está careca de saber como se fossem todos grandes novidades. Nada que já não tenhamos visto antes em alguma matéria jornalística ou programa televisivo, sempre repetindo a ótica de que quem realmente protege a população das comunidades carentes é o chamado poder paralelo e de que o Estado, com seu descaso, empurra o jovem carente em direção à criminalidade. O filme não apresenta nenhuma ótica diferenciada, apenas chove no molhado sobre tudo que já foi mostrado e dito em muitos outros filmes sobre a vida em comunidades.

O filme ainda aposta na dicotomia entre a realidade crua e a poesia nascida no caos, através de algumas tomadas interessantes do ponto de vista estético. Mas, infelizmente, este diferencial acaba sendo também um entrave na fluência narrativa, já que as tomadas longas e bonitas (como o jogo de futebol ao pôr-do-sol) acabam soando apenas decorativas. Por outro lado, a fotografia é escura demais em várias sequências, prejudicando o entendimento de diversas passagens. É compreensível que em um documentário com essa temática as condições de iluminação não sejam perfeitas, mas quando o espectador não consegue ao menos identificar o que está em quadro, tal detalhe técnico torna-se um problema grave.

Para completar, os diretores talvez não tenham feito as melhores escolhas em termos de entrevistados, já que a maioria pouco acrescenta ao filme ou ao debate social proposto. Resumindo, Complexo: Universo Paralelo talvez até suscite algum interesse para platéias do exterior, mas para os brasileiros – em especial para os cariocas – é apenas mais do mesmo.

Complexo: Universo Paralelo (idem), de Mário Patrocínio. Portugal, 2010. 75 minutos. Mostra O Brasil do Outro.

Nota: 3,0

Norberto Apenas Tarde


Após ser demitido da empresa aérea na qual trabalhava, Norberto consegue emprego em uma imobiliária e passa a depender de comissões. Levando em conta sua extrema timidez, o ramo imobiliário não parece a melhor das escolhas. A esposa não fica nada satisfeita com a nova situação e se constrange ao saber que o marido tem pedido dinheiro emprestado a amigos. Em busca de reverter essa má fase, Norberto decide fazer um curso de teatro para principiantes e, aos poucos, descobre caminhos para se fazer respeitar e até mesmo um inesperado talento dramático.

Depois de realizar dois curtas, o ator uruguaio Daniel Hendler estreia na direção de longas com este filme de cores autobiográficas. A trama é uma variação do velho rito de passagem, sendo que neste caso trata-se da mudança de rumo de um homem já adulto, mas que ainda se comporta como menino. As atitudes de Norberto perante a esposa Sílvia soam mais como as de um menino com a mãe. Um exemplo disso é o modo como ele comunica a ela decisões já tomadas como se ainda fossem meros pensamentos, testando aos poucos sua reação. Norberto é o menino que nunca quis crescer, já que virar um adulto responsável também pode simbolizar abrir mão dos sonhos de juventude.

Um filme simpático e conduzido com carinho, mas que não chega a alçar nenhum voo mais elevado. Hendler passa a impressão de ter escrito e dirigido este primeiro longa mais para se exercitar na função, sem grandes pretensões além disso. O resultado é um filme bonitinho, correto e até com bom ritmo, porém esquecível na mesma medida. Não dá para ter uma noção ainda de como será o Daniel Hendler diretor. Vamos aguardar o seu próximo trabalho.

Norberto Apenas Tarde (idem), de Daniel Hendler. Uruguai / Argentina, 2010. 83 minutos. Mostra Foco Argentina.

Nota: 6,0

Comer, Rezar, Amar


A presença deste filme no Festival pode ser considerada uma pré-estreia luxuosa, já que ele tem apenas uma sessão no evento. Baseado no livro de memórias homônimo (e best-seller do segmento auto-ajuda) de Elizabeth Gilbert, o longa narra os descaminhos de uma jornalista-escritora nova-iorquina em uma jornada em busca de autoconhecimento. Liz tem uma carreira de sucesso, um marido bonito e uma bela casa. O próprio sonho americano, certo? Errado. Ao contrário da cunhada que sempre sonhou com uma família, Liz quer mesmo viajar pelo mundo. Após divorciar-se e ter um breve relacionamento igualmente desastroso, ela decide aproveitar o momento para passar um ano viajando: na Itália, entrega-se aos prazeres da gastronomia e da arte de viver bem; na Índia, busca encontrar-se através da fé em um mosteiro; e em Bali, encontra paz e equilíbrio juntamente com um novo amor.

Embora tenha em sua carreira filmes mais densos (como o perturbador Closer, por exemplo) é inegável que a carreira de Julia Roberts é calcada em produções como essa aqui, ou seja, veículos para sua imagem de diva romântica – posto que já foi de Meg Ryan antes dela. E, dentro desse estilo, alguns filmes são mais bem-resolvidos do que outros. Uma Linda Mulher, Notting Hill e O Casamento do Meu Melhor Amigo estão nesse time, certamente porque souberam rechear a previsibilidade dos romances açucarados com muito charme e doses maciças de bom humor. O que não ocorre com este Comer, Rezar, Amar, um filme irregular e sem ritmo protagonizado por uma personagem pouco empática.

No início da trama, parece uma premissa interessante a questão da mulher que não se encaixa no sonho americano de família, sucesso, hipoteca. Mas esse aspecto da personalidade de Liz é deixado de lado e sua chamada busca por equilíbrio, no final das contas, remete simplesmente a uma busca pelo homem perfeito, que acaba se materializando no personagem de Javier Bardem.

A própria escolha dos países que a personagem pretende visitar soa aleatória e infantil, a começar pelo fato dela principiar a aprender italiano lendo um dicionário (!). Posto isso, o segmento italiano até dá um gás ao filme por conta dos belos cenários e da efervescência que é peculiar ao povo italiano. Já a parte indiana é a mais arrastada e a que menos acrescenta à história, criando uma imensa barriga no miolo do longa. O desfecho em Bali seguiria pelo mesmo caminho modorrento não fosse a presença sempre carismática de Javier Bardem. Apesar de seu personagem também ser desinteressante, Bardem é um ator tão talentoso e um homem tão incrivelmente charmoso que acaba salvando o filme do desastre. Mas por pouco, bem pouco, já que diante da pieguice extrema do desfecho nem mesmo um excelente ator como ele consegue operar milagres.

Comer, Rezar, Amar (Eat Pray Love) de Ryan Murphy. EUA, 2010. 133 minutos. Mostra Panorama do Cinema Mundial.

Nota: 4,0

terça-feira, 21 de setembro de 2010

A Empregada


O filme é um melodrama coreano com toques de bizarrice, o que já faz dele algo interessante de ser visto. A trama gira em torno de Lee Eun-yi, uma jovem contratada como babá e empregada de uma rica família. Na mansão vivem o executivo Hoon e sua esposa Hae-ra, em avançado estado de gravidez, além da filhinha do casal e uma sisuda governanta de meia-idade. Eun-yi é tratada com polidez por todos e logo se afeiçoa à pequena sob seus cuidados, mas tudo muda de figura quando Hoon a seduz e ela engravida. Logo Hae-ra descobre a traição do marido e, com a ajuda de sua mãe, resolve tomar medidas para eliminar a ameaça.

Refilmagem de um longa homônimo de 1960, A Empregada foi exibido no Festival de Cannes deste ano. O filme não chega a revolucionar a estética do dramalhão clássico, mas o apresenta com muita eficiência e um certo frescor. Bem dirigido e interpretado, com uma trama que prende a atenção até o final, foi a primeira boa surpresa deste ano vinda da Coréia, país que sempre traz contribuições interessantes ao Festival do Rio. Outro ponto alto são os toques de sarcasmo inseridos pela personagem da governanta e seu ódio velado dos patrões. É, de longe, a personagem mais multifacetada e cujas reações dão margem às interpretações mais diversas. Vale a pena conferir!

A Empregada (Hanyo), de Im Sang-Soo. Coréia do Sul, 2010. 106 minutos. Mostra Panorama do Cinema Mundial

Nota: 7,0

Cortina de Fumaça


O filme pretende colocar em discussão a política de drogas vigente no mundo, tecendo comparações entre a legislação existente no Brasil e a de alguns outros países que encaram a situação de forma menos repressora. Com o argumento de desmistificar os preconceitos em torno da maconha e seus usuários, o diretor e roteirista Rodrigo Mac Niven acaba realizando um documentário francamente tendencioso, onde apenas são ouvidos os especialistas e autoridades que endossam seu ponto de vista. Ou seja, o que acabamos vendo na tela é muito mais uma exposição do que uma discussão, já que para que esta última ocorresse seria necessário que fossem ouvidos ambos os lados.

Posto isso, é preciso reconhecer que Mac Niven sabe vender seu peixe. No melhor estilo Michael Moore, o filme apresenta seus argumentos de forma bastante coesa. Contando com bons recursos de produção, Mac Niven realizou entrevistas nacionais e internacionais com diversos médicos, pesquisadores, advogados, personalidades, policiais e, claro, usuários. Tanta gente com tantos títulos que periga o espectador se embaralhar em algumas passagens. Alguns entrevistados caem no velho discurso panfletário sobre liberdade individual, enquanto outros de fato destacam pontos interessantes, como, por exemplo, a imensa quantidade de produtos que podem ser manufaturados através do cânhamo (ou seja, das folhas de maconha) ou os seus já conhecidos e pouco divulgados benefícios medicinais. Destaque para a visita da equipe à Cannatrade, feira de negócios que acontece em Basel, na Suíça, e gira exclusivamente em torno da plantinha e seus muitos derivados.

O filme ainda peca por abusar cansativamente de blackouts, repetições de frases de efeito e citações de gente famosa, nem sempre bem contextualizadas – até uma frase de John Kennedy entra no balaio, só para vocês terem uma idéia. Mas, apesar de falhar em muitos pontos como documentário, Cortina de Fumaça possui o mérito de trazer para as telonas um tema polêmico que raramente é discutido fora das rodinhas de amigos. Deve dar o que falar ao longo deste Festival.

Cortina de Fumaça (idem), de Rodrigo Mac Niven. BRA, 2009. 94 minutos. Mostra Midnight Movies

Nota: 6,0

A Mulher Sem Piano


Todo ano o Festival tem pelo menos uns três filmes parecidos com esse longa espanhol A Mulher Sem Piano, ou seja, uma história meio blasè que sai do nada para chegar a lugar nenhum. Rosa é uma madrilena de meia-idade, casada com um motorista de táxi. Leva uma vida tediosa e previsível, entre preparar as refeições do marido – que nem sempre pode vir almoçar com ela – e atender as clientes em um negócio de depilação que tem em casa. Sexualmente frustrada e desprovida de amigos ou vida social, um dia resolve subitamente sair porta afora para tentar escapar da rotina na qual está presa.

Muitas boas produções já foram feitas sobre temas pouco palpáveis como a solidão e o tédio existencial – um exemplo que me vem à mente é o belo Encontros e Desencontros, de Sofia Coppola. Mais importante do que o assunto é tratá-lo de forma relevante, e um filme sobre pessoas sem perspectiva não precisa, necessariamente, entediar o espectador. A Mulher sem Piano não somente é banal e cheio de planos arrastados, como também se desenrola todo através de situações pouco interessantes. Sem conflitos, sem nenhum desenvolvimento satisfatório de seus personagens, apenas passando de uma seqüência a outra, para culminar em um desfecho que é meio óbvio desde o princípio. Realmente não dá para entender o filme chegar aqui laureado por um prêmio de direção no Festival de San Sebastián do ano passado. Não chega a ser desastroso, mas pode-se dizer que assistir ao filme é uma uma experiência desnecessária.

A Mulher Sem Piano (La Mujer Sin Piano), de Javier Rebollo. ESP / FRA, 2009. 95 minutos. Mostra Expectativa 2010

Nota: 4,0

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Antes que o Mundo Acabe


Aos quinze anos, todos os problemas típicos da adolescência parecem insolúveis e terríveis e não é diferente com Daniel. A namorada Mim não apenas quer dar um tempo, como parece interessada em seu amigo Lucas – o que desencadeia um grande baque na amizade dos dois. O pai, um fotógrafo internacional que ele nunca conheceu, de repente começa a lhe escrever cartas e enviar fotos da Tailândia. Somados a isso, as dores, descobertas e inseguranças típicas da idade deixam Daniel ansioso para descobrir um mundo maior do que o contido na pequena cidadezinha onde vive e, ao mesmo tempo, já saudoso da infância que está sendo definitivamente deixada para trás.

Este primeiro longa-metragem de Ana Luiza Azevedo com toda certeza conquistará o mais sisudo dos espectadores. Sócia da Casa de Cinema de Porto Alegre, Ana Luiza é roteirista, foi assistente de direção em vários projetos de Jorge Furtado, dirigiu curtas e somente agora faz sua estreia na direção de longas com plena maturidade e segurança, numa trajetória semelhante à percorrida pelo próprio Furtado alguns anos antes.

Com uma história simples e muito bem escrita, o filme fala de reencontro, crescimento e separações. Narrado por Maria Clara, a esperta e muito curiosa irmãzinha do protagonista, a trama é apresentada sempre sob o olhar crítico e indagador de quem está na idade que não teme questionar, observar, descobrir. O elenco jovem está muito bem dirigido, o que dá um frescor incrível ao filme. No meio de tantas carinhas bonitas e talentosas, sobressai-se a impagável Caroline Guedes, que torna cada intervenção de Maria Clara na vida do irmão mais velho um momento de puro deleite. É muito legal ver um filme onde crianças e adolescentes parecem jovens reais e não adultos em miniatura.


O roteiro, escrito por Ana Luíza Azevedo em parceria com Paulo Halm, Giba Assis Brasil e Jorge Furtado a partir do livro infanto-juvenil de Marcelo Carneiro da Cunha, é redondinho, espirituoso e cheio de tiradas inteligentes, além aquelas inserções culturais engraçadinhas que são marca registrada dos roteiros de Furtado. A trama mescla momentos cheios de ternura com descobertas dolorosas, marcando o fim da era da inocência para Daniel. Talvez o único senão seja dar espaço demais às justificativas do pai ausente – ou melhor, inexistente –, mas isso não chega a criar um problema de ritmo. Outro acerto é não fazer do reaparecimento do pai um bicho de sete cabeças: Daniel reage revoltado, como convém em um primeiro momento, mas não faz um drama maior do que o que se espera de um garoto de 15 anos e logo a curiosidade supera a mágoa, mesmo porque a mãe é feliz no novo casamento e ele tem um padrasto muito gente boa.

O longa recebeu seis prêmios no Festival de Cinema de Paulínia, incluindo o prêmio da crítica de melhor filme do festival e o de melhor direção para Ana Luiza Azevedo. Um presentinho especial para quem tem mais de 30 é ver a personagem Mim cantando Beat Acelerado, um clássico absoluto dos anos 80. Mais um momento especialmente fofo em um filme cheio deles.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Baarìa


Acredito que seja uma das coisas mais complicadas da vida profissional quando um cineasta realiza um grande filme logo no início de sua carreira, já que todo seu trabalho posterior será inevitavelmente comparado com aquele sucesso. Vejam o caso de M. Night Shyamalan, que tenta há uma década fazer algo tão bom quanto O Sexto Sentido. OK, péssima comparação. Giuseppe Tornatore é bem mais talentoso, mas também sofre do trauma de não ter conseguido superar sua obra-prima, o inesquecível Cinema Paradiso. O longa, segundo de sua filmografia, venceu o Oscar de melhor filme estrangeiro em 1990 e tornou o diretor siciliano internacionalmente famoso.

O cineasta realizou alguns filmes belíssimos depois disso, como os pouco vistos e igualmente líricos O Homem das Estrelas e A Lenda do Pianista do Mar. Também fez alguns thrillers interessantes, como Uma Simples Formalidade e A Desconhecida. E não nos esqueçamos de Malena, filme que transformou Monica Bellucci em sex symbol mundial. Ou seja, Tornatore possui uma filmografia muito bem-sucedida. Mas embora todos os citados sejam bons filmes, nenhum deles foi capaz de alcançar a dimensão mítica de Cinema Paradiso.

Certamente vem daí, da ânsia de superação, a raiz deste Baarìa. É palpável a intenção do cineasta de criar com este filme um épico definitivo. O que ele até consegue em alguns momentos, mas não no todo. O que equivale dizer que é um filme esteticamente bonito, bem dirigido e até emocionante em algumas passagens... Mas ainda não foi dessa vez que Tornatore se livrou de seus fantasmas. Considerado por ele mesmo como seu trabalho mais pessoal e parcialmente autobiográfico, Baarìa é um mergulho na alma siciliana que atravessa três gerações de uma família da Bagherìa, vilarejo situado próximo a Palermo, começando no patriarca Ciccio, passando para seu filho Peppino e seu neto Pietro.

A saga se inicia na década de 30, quando Ciccio é um jovem pastor rude e apaixonado pelos romances e poemas épicos. Já as injustiças e empobrecimento trazidos pela Segunda Guerra Mundial fazem com que o filho Peppino descubra sua vocação política e se apaixone ao mesmo tempo pelo comunismo e por uma jovem cuja família desaprova tais tendências esquerdistas. A trama acompanha não apenas os personagens e suas famílias, mas toda a comunidade até a década de 80. Embora a história se detenha por mais tempo em Peppino, é a região da Sicília a verdadeira protagonista do filme. O título é nada mais do que o nome Bagherìa (terra natal do diretor) no dialeto regional.


O filme tem uma cronologia interessante, que faz uma ligação mística entre passado e presente através do garotinho da primeira cena e seu poético voo pelos ares (ligação que só será conectada à trama ao final do filme). Nesses momentos, o filme realmente alcança um patamar mais elevado. Seu grande problema está em não conseguir manter o mesmo nível de encantamento ao longo de seus 150 minutos de duração. Não que o ritmo de Baarìa seja arrastado; pelo contrário, a história até flui com bastante eficácia. O que incomoda é mais uma questão de falta de foco quando observamos o longa como um todo.

É bem verdade que Tornatore parece ter optado por mostrar os personagens mais como arquétipos da alma siciliana. Ainda assim, tal decisão por vezes passa uma sensação de – como dizer? – frouxidão. Também se percebe uma preocupação excessiva do diretor em dosar milimetricamente o drama e a comédia, como se houvesse uma obrigação de manter esse equilíbrio a todo custo. No final das contas, fica uma estranha impressão de que Tornatore se preocupou tanto em fazer um filme perfeito que acabou perdendo a espontaneidade, ternura e vivacidade que sempre foram diferenciais em sua obra. Ou seja, acabou traindo a própria essência siciliana que visava retratar.

Mas nenhuma dessas especulações explica o fato de Baarìa ter sido recebido com tanta indiferença no Festival de Veneza. Filosofias à parte, ainda assim trata-se de um bom filme. A parte visual impressiona, com sua fotografia em tons de terra, e a trilha sonora do maestro Ennio Morricone, como sempre, é uma atração à parte. Não é a obra definitiva que o cineasta sonhou e os fãs queriam, mas é um longa competente e que não merecia ter sido esnobado do modo como foi. É claro que o fato do premier Silvio Berlusconi ter rasgado elogios à produção deve ter sido um grande desserviço para o filme. Pobre Tornatore!

Por fim, uma curiosidade: quase todas as fichas e sinopses sobre Baarìa colocam Monica Bellucci à frente do elenco, quando a atriz faz o que é creditado como “aparição especial”. E creiam-me: é uma aparição mesmo. O espectador que não estiver muito atento nem vai perceber.

sábado, 11 de setembro de 2010

Marina


Confesso que me sinto em dívida com os caríssimos leitores por ainda não ter falado aqui sobre esse espetáculo maravilhoso que é Marina. Ontem fui assisti-lo pela segunda vez, carregando comigo alguns novos adeptos para apreciar o trabalho preciso e irretocável apresentado pela Cia. Pequod. Em cartaz com seu sétimo espetáculo, a companhia dirigida por Miguel Vellinho especializou-se numa vertente teatral extremamente difícil de realizar (ao menos, realizar bem) e que nem sempre obtém o reconhecimento que merece: o teatro de animação. Arte constantemente confundida com o teatro infantil, a manipulação de bonecos e objetos é feita de encantos e sutilezas passíveis de deslumbrar espectadores de qualquer faixa etária.

Basta estar com a mente aberta e o coração idem para penetrar no universo marinho criado no Teatro III do CCBB e se deixar comover pelo conto da sereia rebelde que ousou querer ser gente e pagou um preço alto por isso. Aqui, o tradicional conto da Sereiazinha de Hans Christian Andersen (esqueçam a versão açucarada da Disney) é embalado pelas canções do mar de Dorival Caymmi e emoldurado por uma deslumbrante cenografia composta por quatro aquários enormes, dentro dos quais serão manipuladas as marionetes aquáticas, além dos mais diversos elementos sensoriais.

O público que for assistir a Marina terá a oportunidade rara de estar em um espetáculo que mexe com todos os sentidos. Em um casamento perfeito entre sons, cores, formas e texturas, os excelentes atores-cantores-ilusionistas da Cia. Pequod levam o espectador para dentro de seu universo mágico, e o que é melhor, com total domínio de sua arte. Vale muito a pena conferir! Prestem atenção na perfeitas transição de proporções e na interação entre os atores e seus respectivos personagens em animação.

Em tempo: a peça está sendo exibida em duas versões. Marina, o espetáculo adulto, acontece de quarta a domingo, às 20h. Ingressos a inacreditáveis 10 reais (inteira) e 5 reais (meia-entrada). Já a versão infantil da peça é apenas aos sábados e domingos às 18h e tem entrada gratuita, mediante a retirada de senhas. Mais informações com o Centro Cultural Banco do Brasil no telefone 3808-2020.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Festival 2010 - Contagem Regressiva


Começa no próximo dia 23 a edição 2010 do Festival do Rio. Para a exibição da noite de abertura, foi escolhido A Suprema Felicidade, novo longa de de Arnaldo Jabor. Ao longo das duas semanas de Festival, o público vai poder conferir, dentre mais de 300 opções, os mais recentes trabalhos de cineastas como Woody Allen, Abbas Kiarostami, Zhang Yimou, Robert Rodriguez, Ken Loach e ainda o brasileiro Andrucha Waddington na noite de encerramento. Também teremos os novos longas de Xavier Dolan, que impressionou na edição passada com Eu Matei Minha Mãe, e de Ben Affleck, sujeito que deve ser visto com atenção depois que virou diretor e realizou um filme excelente como Gone Baby Gone. Convidados especiais também não faltarão: as atrizes Charlotte Rampling e Irene Jacob, o ator Michael Madsen e os diretores Bruno Dumont e Amos Gitai já confirmaram presença. Já o país homenageado com a mostra Foco este ano será a Argentina, com exibição de dez produções recentes, incluindo os novos filmes de cineastas já bem conhecidos do público brasieliro, como Marcelo Piñeyro e Pablo Trapero.

Confiram abaixo alguns títulos já confirmados:

Minhas Mães, Meu Pai (The Kids are all Right), de Lisa Cholodenko
A Woman, a Gun and a Noodle Shop, de Zhang Yimou
Loose Cannons, de Ferzan Ozpetek
Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos (You Will Meet a Tall Dark Stranger), de Woody Allen
Tournee, de Mathieu Amalric
Copie Conforme, de Abbas Kiarostami
Les Amours Imaginaires (Heartbeats), de Xavier Dolan
Route Irish, de Ken Loach
Carlos, de Olivier Assayas
Atração Perigosa (The Town), de Ben Affleck
Rio Sex Comedy, de Jonathan Nossiter
Refúgio, de François Ozon
Carancho, de Pablo Trapero
Las Viudas de los Jueves (Widows on Thursday), de Marcelo Piñeyro
Lope, de Andrucha Waddington
Machete, de Robert Rodriguez