quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Foi Apenas um Sonho


Até que ponto a sociedade pauta o estilo da vida particular de cada um? A maioria das pessoas realmente vive a vida do jeito que planejou? Todos nós gostamos de pensar que esse papo de ser forçado a algo pelas circunstâncias é problema de gente fraca, sem fibra, acomodada. Nós, protagonistas de nossa história, somos diferentes. Especiais. Independentes. O novo filme de Sam Mendes, a despeito de ser ambientado nos anos 50, toca em feridas que ressoam até o presente: a perda dos sonhos e ideais da juventude. Ou, como diria Elis Regina, “ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”.

Frank e April Wheeler são um casal invejado pelos vizinhos: jovens, belos, modernos, enfim, pessoas que se destacam por seu brilho especial. Ambos são avessos aos padrões convencionais e acreditam em uma vida cheia de liberdade, arte e beleza. Mas, a despeito de seus altos ideais, os Wheeler se veem a cada dia mais parecidos com tudo que sempre abominaram: Frank acomodou-se em um trabalho burocrático e maçante porque tem esposa e dois filhos para sustentar; April deixou para trás seu sonho de ser atriz para se tornar uma dona-de-casa insatisfeita e mal-humorada. Como isso aconteceu a um casal tão especial? April não quer entregar os pontos e acha que ainda é possível mudar o destino. Frank está mais reticente, mas acaba cedendo aos apelos da esposa de largar a vida entediante na Revolutionary Road (que de revolucionária só tem o nome) e reconstruir tudo longe dali. Seria tarde demais e eles estariam sendo ingênuos, como acreditam os amigos ou nunca é tarde para soltar as amarras?

A história se apóia numa realista e amarga radiografia não apenas do casamento e dos papéis de cada um dentro de uma relação, mas também de toda uma estrutura social para a qual um jovem casal é empurrado. Filhos necessitam uma casa maior, que gera uma hipoteca, que faz com que o casal precise se sujeitar a uma existência adormecida e viva para desempenhar funções e atender a demandas. Não é culpa de ninguém e o que torna a história tão triste é justamente a ausência de mocinhos e bandidos. Frank e April não são heróicos e cometem erros ao longo de todo o filme, mas tampouco são vilões. Cada um quer achar um sentido para a vida. Ela, de forma mais desesperada e impulsiva; ele, de modo mais retraído e nem por isso menos dolorido. E cada um dos vizinhos frustrados fará tudo para empurrá-los de volta à “normalidade”.

A exemplo do que acontece no também ótimo Beleza Americana, o diretor Sam Mendes faz o espectador enxergar pelo buraco da fechadura e ver o desespero silencioso que se oculta por trás dos gramados bem-cuidados da classe média americana. A diferença é que enquanto Beleza Americana mantinha sempre uma nota de sarcasmo e ironia diante dos absurdos cometidos em nome de uma pacata vida suburbana, Foi Apenas um Sonho mostra personagens que nunca almejaram aquele estilo de vida presos a ela. April, em especial, parece afogar-se mais e mais a cada fotograma. Otimista a princípio, esperançosa até certa altura e, finalmente, em um estado de espírito que transcende a apatia.

O roteiro foi escrito a partir do livro de Richard Yates, embora a trama pareça ter um estilo mais teatral, ou seja, poucos personagens, grande parte da ação na casa dos protagonistas e cenas totalmente dependentes do talento dos atores. Que excedem as expectativas. Kate Winslet é simplesmente a melhor atriz de sua geração. Sempre expressiva, até mesmo quando calada, Kate traz o espectador para dentro do seu sofrimento com um simples levantar de sobrancelhas. Vale lembrar que Kate foi indicada ao Oscar deste ano por O Leitor e não por esse filme e eu me pergunto se é possível que sua atuação no outro filme seja ainda melhor do que neste. Leonardo DiCaprio, também ótimo, demonstra a segurança peculiar do homem dos anos 50 sem transmitir dureza ou insensibilidade. Seu personagem é mais contido, em relação ao de Kate, e o ator diz muito nesse filme com os olhos. Um exemplo disso é a cena em que Frank chega em casa depois de ter aprontado das suas e fica desconcertado ao encontrar April e os filhos esperando por ele com um bolo de aniversário. E, finalmente, não se pode deixar de mencionar o ótimo Michael Shannon (indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante), que quase consegue roubar a cena em suas breves aparições como John Givings, o filho de uma vizinha tido como louco, mas que parece o mais são de todos, ao ter coragem de dizer o que mais ninguém diz. O que leva a outra discussão, esta sobre o conceito de sanidade.

Foi Apenas um Sonho é um filme de reflexões, sejam elas sobre o sentido da vida ou sobre o que você em particular está fazendo para descobrir qual seria esse sentido. Porque, como diz April numa cena, muitas vezes é mais fácil não tentar nada para evitar a possibilidade de fracassar no intento. E muitas pessoas, outrora especiais e revolucionárias, no final se acomodam no conforto do tédio.

O filme foi indicado a três Oscars: ator coadjuvante, direção de arte e figurino. Merecia mais.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Dúvida


Existe um motivo forte para que Capitu seja a personagem mais famosa e discutida de Machado de Assis: a dúvida que paira sobre seu caráter. Dependendo do ponto de vista, ela pode ser uma vítima atormentada por um homem ciumento ou uma mulher fútil e sem coração. Machado deixou que coubesse única e exclusivamente ao leitor de Dom Casmurro tal decisão. O filme Dúvida apóia-se nessa mesma estrutura, deixando ao espectador a conclusão final a respeito do padre Flynn. Seria ele um homem bom condenado por uma víbora que não entendia sua pureza ou um pedófilo cínico e dissimulado?

A história, roteirizada e dirigida pelo próprio autor da peça teatral que a originou, é ambientada nos anos 60 e se passa praticamente inteira nas dependências de uma escola mantida pela igreja católica. Irmã Aloysius, a diretora, é uma freira rígida, inflexível e cheia de códigos morais arcaicos. Ela não gosta nada de seu superior, o padre Flynn, um sacerdote de discurso progressista, modos afetuosos, unhas bem-cuidadas e que adora tomar seu chá com muitos cubos de açúcar. Quando a jovem irmã James, influenciada pelas desconfianças implantadas pela própria Aloysius, revela suas suspeitas de que Flynn pode ter ultrapassado os limites com um dos alunos, a irmã Aloysius está pronta - ou melhor, ansiosa – para acreditar na culpa do padre e inicia uma cruzada pessoal para expulsá-lo da paróquia.

O fascinante na trama é o modo como Flynn parece a nossos olhos alternadamente inocente e culpado. Existem elementos suspeitos levantados pela investigação de Aloysius sim, mas nada realmente conclusivo. Assim como a argumentação do padre parece inocente e indignada. Mas ele é um homem articulado e inteligente, e nos perguntamos o quanto ele é sincero em suas palavras. O espectador certamente sairá do cinema ainda em dúvida e terá que reavaliar suas próprias crenças acerca de questões como verdade, autoridade e religião antes de chegar a uma conclusão sobre o personagem. Sem contar a inevitável influência externa, por conta dos recorrentes casos de pedofilia envolvendo o clero que são mostrados no noticiário. E qualquer que seja a conclusão, dificilmente esta será plena de certeza. Resta a dúvida, sempre.

E a dúvida não atormenta apenas o espectador, mas também os personagens. A começar pela irmã James, que aparenta ir perdendo a inocência e a paz de espírito a partir do momento em que se vê como o pivô da guerra entre seus superiores. Mesmo a personagem de Meryl Streep, fanática em sua caça às bruxas, chega ao ponto de confrontar-se com o desmoronamento de sua verdade absoluta. É como se a enfática alegação de inocência de Flynn minasse a certeza de sua culpa na irmã Aloysius ao mesmo tempo em que a aparente certeza inabalável desta despertasse nele questionamentos sobre a própria inocência.

A irmã Aloysius é uma megera, sem dúvida. Também é bem verdade que ela começou a perseguir o padre Flynn motivada por sua própria intolerância e preconceito. Mas e se ela estiver certa, ainda que pelos motivos errados? E se Flynn, mesmo inocentes em atos, descobre através deste confronto que suas intenções não eram tão puras assim? O quanto teria ele de responsabilidade sobre tais instintos? E o menino que desencadeou todo o conflito, qual seu papel nessa história? E o que dizer da mãe do garoto e suas prioridades distorcidas pelo desespero? São questões como essas, que o roteiro faz questão absoluta de deixar em aberto, que tornam o filme tão inteligente e perturbador.


Há que se ressaltar o excelente trabalho de todo o elenco – um filme que tem quatro de seus atores indicados ao Oscar não é pouca coisa nesse quesito –, com especial destaque para a sensacional atuação de Meryl Streep como a irmã Aloysius. Seria relativamente fácil caracterizar essa personagem como a grande vilã, mas não é o que acontece. Meryl recheia a maldade de humanidade e faz de Aloysius uma pessoa amarga e intransigente, mas que acredita na retidão do que está fazendo e que ama sinceramente sua congregação e seus alunos.

Mais do que tudo, Dúvida coloca em xeque a questão do preconceito e da intolerância de modo tão equilibrado que a cada cena a balança parece pender para um lado. Felizmente, não se trata de um julgamento e o espectador está isento do difícil encargo de emitir um veredicto.

O filme obteve cinco indicações ao Oscar: atriz (Meryl Streep), ator coadjuvante (Philip Seymour Hoffman), atriz coadjuvante (Amy Adams e Viola Davis) e roteiro adaptado. Estréia aqui no Brasil semana que vem, dia 6 de fevereiro.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Heath Ledger mais perto do Oscar


Foram anunciados ontem à noite os vencedores do prêmio SAG (Screen Actors Guild), concedido pelo sindicato americano dos atores. Enquanto Heath Ledger segue inabalável rumo ao Oscar e Quem Quer Ser Milionário? confirma favoritismo, as categorias ator, atriz e atriz coadjuvante apresentam variações em relação ao Globo de Ouro. As premiadas Meryl Streep e Kate Winslet brigam pela mesma estatueta no Oscar... Quem vai levar? E o sempre querido Sean Penn ultrapassa o esquisitão Mickey Rourke no gosto dos colegas de classe. Vejam os ganhadores em cinema:

Elenco: Quem Quer Ser Milionário?
Ator: Sean Penn (Milk)
Atriz: Meryl Streep (Dúvida)
Ator Coadjuvante: Heath Ledger (Batman - O Cavaleiro das Trevas)
Atriz Coadjuvante: Kate Winslet (O Leitor)

sábado, 24 de janeiro de 2009

Austrália


O trabalho de Baz Luhrmann não é o que se poderia chamar de discreto. Alguns adoram e outros odeiam, mas ninguém é indiferente à estética exuberante do cineasta australiano. Depois de uma breve carreira como ator, Luhrmann estreou na direção em 1992 com o ultra-colorido e simpático Vem Dançar Comigo. Quatro anos depois, realizou Romeu + Julieta, versão moderninha do clássico que associava visual psicodélico com reprodução fiel do texto de Shakespeare. Em 2001, o ponto alto de sua carreira: Moulin Rouge, simplesmente um dos melhores musicais de todos os tempos. O filme foi indicado a oito Oscars – e era, de longe, o melhor do ano –, mas acabou ficando só com os prêmios de figurino e direção de arte. Depois disso, Luhrmann se recolheu. É bem verdade que ele tentou dirigir uma biografia de Alexandre, mas Oliver Stone lhe passou a perna. Oito anos depois, o cineasta reaparece com um épico à moda antiga. E o mais surpreendente: sem números musicais.

Austrália é uma mistura de aventura e romance ambientada durante a segunda guerra. Lady Sarah Ashley, uma aristocrata inglesa, parte para o longínquo país do título atrás do marido. Chegando lá, Sarah encontra lorde Ashley morto e a fazenda de gado que ele tanto estimava à beira da falência. Obstinada, Sarah se recusa a ser enxotada de suas terras e consegue a ajuda de um homem rude e corajoso, conhecido como “o capataz”, ao mesmo tempo em que se afeiçoa a um menino aborígene. Juntos, eles tocarão o gado através de quilômetros de terreno selvagem para realizar uma grande venda e salvar a propriedade. No caminho, além dos obstáculos naturais, precisam enfrentar a traição e corrupção de um barão do gado.

É preciso deixar uma coisa bem clara: Austrália não é Moulin Rouge. Embora perceba-se o mesmo tom grandiloquente e excessivamente dramático, tudo que em Moulin Rouge causava encanto e arrebatamento em Austrália soa um pouco ultrapassado. Por vezes, brega mesmo. Com um tom de filme antigo, datado, que não sobreviveu bem à passagem do tempo – impressão esquisita, considerando que o filme acabou de ser feito. É claro que essa abordagem barroca, operística, faz parte do estilo de Baz Luhrmann, mas nem tudo que fica bem em um musical tem o mesmo impacto em um épico ao estilo Assim Caminha a Humanidade.

O mesmo se pode dizer de Nicole Kidman. A mesma voz e trejeitos afetados que ficavam adoráveis para a Satine de Moulin Rouge são um pouco irritantes quando aplicados a lady Ashley. Uma personagem que continua antipática, mesmo depois de sua conversão ao estilo australiano e aos beijos do charmoso capataz. Hugh Jackman, por sua vez, tem melhor desempenho e incorpora uma mistura da rudeza selvagem do jovem Clint Eastwood (reparem no figurino e nos closes na altura dos olhos) e do cinismo blasé de Humphrey Bogart (o que fica evidente quando ele diz que “não luta a guerra de ninguém”, em alusão ao “não arrisco meu pescoço por ninguém” do Rick Blaine de Casablanca).

Austrália é claramente dividido em dois segmentos distintos: o primeiro – e melhor – é o que trata da aventura com o gado através do deserto australiano. Inesquecível a empolgante sequência que mostra o grupo tentando conter um estouro da boiada perto de um precipício. Uma vez superado o desafio, com Nicole e Jackman já devidamente apaixonados, o longa torna-se mais um épico de guerra e tem como pano de fundo o bombardeio que a cidade de Darwin sofreu do Japão. O caos imposto pela guerra e algumas briguinhas sem importância acabam por deixar o casal separado, com obstáculos e desencontros a superar. E esse segundo segmento não tem tanto apelo quanto o primeiro, nem visualmente e muito menos dramaturgicamente.


Interessante mesmo é a subtrama a respeito do menino Nullah. Mestiço de mãe aborígene e pai branco, Nullah era chamamo pejorativamente de “creamy” (ou café-com-leite). Em um país segregado, o moleque não fazia parte de nenhum dos dois mundos. O que só piorava com a prática do governo australiano de levar meninos como ele para serem educados em missões jesuítas para futuramente servir à comunidade branca. Tal prática covarde e absurda, que roubou incontáveis meninos de suas mães, foi abolida pelo governo australiano somente em 1973.

No todo, podemos dizer que Austrália é um filme regular. Não tem nenhum defeito imperdoável, mas tampouco arrebata a ponto de nos fazer esquecer suas deficiências. A seu favor, tem alguns pontos de interesse na trama, cenas bem dirigidas, uma belíssima estética e, por vezes, até causa emoção genuína. Para o público feminino também acrescente-se a isso o apelo de Hugh Jackman exalando virilidade e beleza, com os músculos perfeitos sempre em evidência. Os pontos fracos seriam a banalidade dos diálogos e de algumas situações, o excesso de afetação de Nicole Kidman e a excessiva duração do filme (duas horas e cinquenta minutos), o que acaba criando uma barriga na parte central da história. Mas talvez a coisa toda seja menos racional e os pecados de Austrália se resumam a apenas um: não conseguir cativar completamente o coração do espectador, fazendo-o embarcar sem restrições nessa jornada por uma terra mística.

Quanto a Baz Luhrmann, desejo duas coisas: 1) Que ele não fique outros oito anos sem filmar; 2) Que seu próximo filme seja um musical.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Surpresas do Amor


Os filmes de Natal (ou de como sobreviver a ele) são quase um subgênero dentro das comédias românticas. Todo ano, temos pelo menos alguns exemplares de histórias doces e engraçadas sobre personagens que redescobrem a família e os nobres sentimentos nesta época de Jingle Bells. Surpresas do Amor – no original, Four Christmases – pertence a essa safra, independente de ter chegado aqui no Brasil um mês depois. O longa, beneficiado pela temporada fraca, fez mais de US$ 18 milhões em seu final de semana de estréia nos EUA e liderou o ranking americano durante duas semanas.

Reese Witherspoon e Vince Vaughn são Kate e Brad, namorados há três anos. Os pais de ambos são divorciados e, para evitar o suplício de comparecer a quatro reuniões familiares na mesma noite, todo ano o casal mente descaradamente para os familiares e inventa uma causa humanitária em pleno Natal. Enquanto a família pensa que eles estão vacinando órfãos na Somália ou salvando baleias sei lá onde, Kate e Brad estão num paraíso qualquer curtindo o Natal a dois e sem estresse. Até o ano em que um nevoeiro faz com que todos os voos sejam cancelados e, para piorar, eles são entrevistados no aeroporto por um noticiário local. Não tem jeito: eles terão que encarar as famílias e os detalhes nada glamourosos de cada um.

Com um péssimo título em português, que lembra milhares de outros filmes que já vimos antes, podemos dizer que Surpresas do Amor é um filme indolor. Claro que a trama é totalmente previsível do começo ao fim, mas pelo menos se desenvolve com alguma graça. Embora salpicado por uma série de situações exageradas – como as que envolvem os irmãos lutadores de Brad –, o roteiro até que discute uma tese interessante: a de que ninguém realmente conhece a cara-metade até tomar contato com aquelas indiscrições que só os familiares conseguem fazer a respeito de uma pessoa, desenterrando esqueletos que se julgava para sempre enterrados. Assim é com o casal Kate e Brad, que até então só conviviam com o lado “pré-aprovado” um do outro.

Também é interessante notar que a direção tira o máximo proveito da imagem constituída de seus protagonistas. No caso, o estilo “sou grosso, porém gente boa” de Vince Vaughn e o jeito mandão e espevitado da lourinha Reese Witherspoon. A atriz, aliás, está no auge de sua carreira. A ex-estrelinha adolescente que construiu uma carreira focada em comédias poderia ter ficado marcada para sempre como a “legalmente loura”, mas não foi o que aconteceu. Há dois anos Reese personificou June Carter, companheira de palco e de vida do ícone Johnny Cash... e levou o Oscar para casa. Já Vince Vaughn é aquilo mesmo, um ator limitado com charme cafajeste. Mas funciona em cena, como já tinha provado antes em Separados pelo Casamento. Chama atenção o bom elenco de apoio, com gente como Robert Duvall, Sissy Spacek e Jon Favreau em papéis diminutos.

No geral, Surpresas do Amor é um filme tradicional e não sai da fronteira do mediano. Mas pode causar no espectador um efeito colateral benéfico: fazer com que ele saia do cinema achando que suas reuniões familiares não são tão ruins assim.

Benjamin Button é indicado a 13 Oscars


Poucas surpresas nas indicações ao Oscar, anunciadas na manhã de hoje, sendo a mais agradável delas a liderança do belíssimo O Curioso Caso de Benjamin Button: o filme concorre a treze estatuetas e tem a possibilidade (remota, eu admito) de se igualar ou superar os grandes vencedores do Oscar. Lembrando que os três grandes campeões, cada um detentor de onze prêmios, são Ben-Hur, Titanic e O Senhor dos Anéis – O Retorno do Rei. A maior pedra no sapato de Benjamin Button? Certamente é o vencedor do Globo de Ouro, Slumdog Millionaire, e suas dez indicações.

Outra surpresa foi a indicação de Kate Winslet por O Leitor e não por Foi Apenas um Sonho. Vale lembrar que, no Globo de Ouro, a atriz foi premiada em dose dupla, mas levou o Globo de atriz pelo segundo e de atriz coadjuvante pelo primeiro. Ainda no quesito interpretação, o Oscar seguiu os passos do sindicato dos atores e indicou Melissa Leo e Richard Jenkins, injustamente esquecidos no Globo de Ouro. Já Heath Ledger continua, a meu ver, imbatível na categoria ator coadjuvante. E talvez seja o único prêmio de Batman, já que a concorrência pesada deixou o longa de fora dos prêmios de melhor filme e direção e, nas categorias técnicas, ele briga com o igualmente excelente Benjamin Button.

Confiram os indicados. Os vencedores serão conhecidos na cerimônia de 22 de fevereiro.

Filme
O Curioso Caso de Benjamin Button
Frost/Nixon
Milk
O Leitor
Slumdog Millionaire

Atriz
Anne Hathaway (O Casamento de Rachel)
Angelina Jolie (A Troca)
Melissa Leo (Rio Congelado)
Meryl Streep (Dúvida)
Kate Winslet (O Leitor)

Ator
Richard Jenkins (O Visitante)
Frank Langella (Frost/Nixon)
Sean Penn (Milk)
Brad Pitt (O Curioso Caso de Benjamin Button)
Mickey Rourke (O Lutador)

Atriz Coadjuvante
Amy Adams (Dúvida)
Penélope Cruz (Vicky Cristina Barcelona)
Viola Davis (Dúvida)
Taraji P. Henson (O Curioso Caso de Benjamin Button)
Marisa Tomei (O Lutador)

Ator Coadjuvante
Robert Downey Jr. (Trovão Tropical)
Philip Seymour Hoffman (Dúvida)
Heath Ledger (Batman – O Cavaleiro das Trevas)
Josh Brolin (Milk)
Michael Shannon (Foi Apenas um Sonho)

Direção
Danny Boyle (Slumdog Millionaire)
Stephen Daldry (O Leitor)
David Fincher (O Curioso Caso de Benjamin Button)
Ron Howard (Frost/Nixon)
Gus Van Sant (Milk)

Roteiro Original
Rio Congelado
Simplesmente Feliz
Na Mira do Chefe
Milk
Wall-E

Roteiro Adaptado
O Curioso Caso de Benjamin Button
Dúvida
Frost/Nixon
O Leitor
Slumdog Millionaire

Direção de Arte
A Troca
O Curioso Caso de Benjamin Button
Batman – O Cavaleiro das Trevas
A Duquesa
Foi Apenas um Sonho

Maquiagem
O Curioso Caso de Benjamin Button
Batman – O Cavaleiro das Trevas
Hellboy 2 – O Exército Dourado

Figurino
Austrália
O Curioso Caso de Benjamin Button
A Duquesa
Milk
Foi Apenas um Sonho

Fotografia
A Troca
O Curioso Caso de Benjamin Button
Batman – O Cavaleiro das Trevas
O Leitor
Slumdog Millionaire

Montagem
O Curioso Caso de Benjamin Button
Batman – O Cavaleiro das Trevas
Frost/Nixon
Milk
Slumdog Millionaire

Trilha Sonora
O Curioso Caso de Benjamin Button
Defiance
Slumdog Millionaire
Milk
Wall-E

Canção
Down to Earth (Wall-E)
Jai Ho (Slumdog Millionaire)
O Saya (Slumdog Millionaire)

Mixagem de som
O Curioso Caso de Benjamin Button
Batman – O Cavaleiro das Trevas
Slumdog Millionaire
Wall-E
O Procurado

Edição de Som
Batman – O Cavaleiro das Trevas
Homem de Ferro
Slumdog Millionaire
Wall-E
O Procurado

Efeitos Visuais
O Curioso Caso de Benjamin Button
Batman – O Cavaleiro das Trevas
Homem de Ferro

Filme Estrangeiro
Der Baader Meinhof Komplex (Alemanha)
The Class (França)
Departures (Japão)
Revanche (Áustria)
Valsa com Bashir (Israel)

Filme de Animação
Bolt – Supercão
Kung-Fu Panda
Wall-E

Curta de Animação
La Maison en Petits Cubes
Lavatory – Lovestory
Oktapodi
Presto
This Way Up

Curta-metragem (Live Action)
Auf der Strecke (On the Line)
Manon on the Asphalt
New Boy
The Pig
Spielzeugland (Toyland)

Documentário (Longa)
The Betrayal
Encounters at the End of the World
The Garden
Man on Wire
Trouble the Water

Documentário (Curta)
The Conscience of Nhem em
The Final Inch
Smile Pinki
The Witness - From the Balcony of Room 306

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Jogo de Cena


O documentarista Eduardo Coutinho sempre foi da opinião de que todo mundo se transforma em ator diante de uma câmera. Para endossar sua tese, em 2006 a equipe do cineasta colocou um anúncio num jornal, procurando por mulheres que tivessem histórias para contar e se dispusessem a participar de um teste para cinema. Oitenta e três entrevistas foram realizadas, das quais vinte e três foram selecionadas e filmadas no Teatro Glauce Rocha. Posteriormente, atrizes – algumas famosas, outras desconhecidas – foram convidadas para dar sua interpretação às histórias contadas pelas entrevistadas. O resultado pode ser conferido em Jogo de Cena, que já está disponível em DVD.

Jogo de Cena tem um dos melhores títulos já dados a um filme, porque é exatamente a isso que se propõe: criar um jogo de interpretação onde a fronteira entre realidade e atuação muitas vezes não é perceptível. Não é ficção, mas tampouco é um documentário; trata-se de um híbrido dos dois. Alguns relatos são intercalados entre entrevistada e atriz, em outros não fica claro se quem está em cena é a pessoa que contou a história ou uma atriz desconhecida. Grande destaque para a cena da mulher que conta sua experiência com o despachante rodoviário na Praça da Sé. Excelente. Algumas coisas ditas pelas atrizes até parecem experiências pessoais, como a ida de Fernanda Torres ao terreiro de Candomblé ou a saudade de Andréa Beltrão de sua antiga babá. Será? Foi um comentário à parte ou 100% do que diziam fazia parte do depoimento que interpretavam?

Então esse jogo acaba envolvendo também o espectador e aguçando sua curiosidade. Aquilo é realidade encenada ou interpretação? E quando alguém conta um fato, mesmo sendo verdadeiro, essa pessoa não estaria representado pelo simples motivo de se ver diante de uma câmera? São estas questões conceituais e filosóficas que elevam para outro patamar um filme que, ao primeiro olhar, pode parecer menos atraente do que os longas anteriores de Coutinho.

Jogo de Cena tem como único ponto fraco o fato de nem todas as histórias relatadas serem interessantes. Eduardo Coutinho é um exímio entrevistador e tem um jeito amável e descontraído de deixar seu convidado à vontade, o que faz com que ele sempre extraia o melhor de cada um. Mas, ainda assim, os relatos estão longe de ter a pungência dos mostrados em Edifício Master, só para citar um exemplo. E isso causa estranhamento, já que originalmente eram oitenta e três histórias que foram reduzidas a vinte e três. Qual terá sido o critério adotado? Ou será que o relato em si não importava e o foco era selecionar as passagens que representassem, de algum modo, maior desafio às atrizes?

Um dos grandes momentos do filme mostra Fernanda Torres “saindo” do personagem para falar sobre sua dificuldade em interpretar uma pessoa real. Muito sincera e avessa a estrelismos, a atriz fala sem rodeios ou pudores sobre seus próprios bloqueios. É em momentos como este que o filme cresce em densidade e entendemos porque Fernanda é uma grande atriz.

No geral, Jogo de Cena é um filme muito bom. E suas maiores qualidades vêm justamente do que não é visto pelo espectador, ou seja, do conceito, do que não está em cena.

Novos Tempos?


Neste 20 de janeiro em que os cariocas comemoram o feriado de São Sebastião com chuva, Barack Obama faz história ao ser empossado como o primeiro negro no cargo mais importante do mundo: a presidência dos Estados Unidos. Eleito com um discurso onde a palavra-chave era mudança, vamos torcer para que a diferença de Obama em relação a seus antecessores vá além da cor de sua pele e signifique mudanças mais profundas. Porque, queiramos ou não, tudo que acontece por lá se reflete no mundo inteiro. Que diminua a sede imperialista, a xenofobia e o preconceito sob qualquer forma. Que se encerre de vez esse capítulo da malsucedida intervenção no Iraque. E, sobretudo, que os americanos comecem a olhar para trás e aprender com os erros do passado. Isso seria benéfico para todos.

Boa sorte, Obama!

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

O Curioso Caso de Benjamin Button


O cineasta David Fincher escreveu seu nome na sétima arte através de dois projetos bastante originais e polêmicos, Se7en e O Clube da Luta. Também dirigiu Alien 3, O Quarto do Pânico e, mais recentemente, Zodíaco. Se fosse preciso adjetivar toda a filmografia de Fincher com uma única palavra, certamente esta palavra seria “violenta”. O que só torna ainda mais admirável o fato dele realizar com extrema competência um filme totalmente diferente de tudo que havia feito anteriormente: o belo, delicado e apaixonante O Curioso Caso de Benjamin Button.

O filme, como diz o título, conta a história de um homem marcado por uma estranha anomalia: Benjamin Button envelhece ao contrário. Embora sua idade e maturidade avancem, seu corpo rejuvenesce ao invés de envelhecer. Benjamin nasce com todas as características de uma pessoa idosa: rugas na pele, artrite nos ossos, etc. Seu pai o abandona, assustado com sua aparência repulsiva e desorientado pela morte da esposa. Benjamin é criado por Queenie e Tizzy, um casal que dirige um lar para idosos. A princípio, eles acreditam que o esquisito bebê terá pouco tempo de vida. Só depois de alguns anos, começam a perceber que ele está crescendo e ficando menos frágil.

Uma criança com a aparência de um homem idoso, posteriormente um adolescente com aparência de meia-idade; Benjamin só encontra o equilíbrio e a realização do amor na metade de sua vida. Mas o tempo não para e ele sabe que aquele momento perfeito tem os dias contados, pois sua amada Daisy envelhecerá normalmente enquanto ele continuará a rejuvenescer. Como manter esse amor, se a diferença entre eles se aprofundará um pouco mais a cada dia?

O roteiro, baseado no conto homônimo de F. Scott Fitzgerald, foi escrito por Eric Roth, que venceu o Oscar em 1994 por Forrest Gump e foi indicado duas outras vezes (em 2000 por O Informante e 2006 por Munique). Embora tenha quase três horas de duração, em nenhum momento o longa é cansativo. A narrativa é tão redonda e bem estruturada que o espectador acompanha com atenção cada uma das fases da vida desse homem extraordinário e das pessoas que ele conhece ao longo do caminho, numa odisséia que se inicia em 1918 e atravessa o século XX. Outro destaque é o bom humor com que a trama é entremeada. Reparem na historinha bizarra do cara que foi atingido por raios sete vezes.

A parte técnica do filme é igualmente brilhante, com destaque para a maquiagem e os efeitos visuais que fazem Brad Pitt e Cate Blanchett parecer mais jovens ou mais velhos do que realmente são, conforme a fase em que se encontram seus personagens. Também a fotografia e direção de arte caprichadíssimas proporcionam momentos de puro deleite visual, cenas que dizem tudo através da poesia das imagens.


Mas nada disso faria de Benjamin Button o grande filme que é se não fosse o trabalho apaixonado de Brad Pitt e Cate Blanchett como Benjamin e Daisy. Talvez o nível de sensibilidade e minimalismo da interpretação de Pitt nem possa ser devidamente apreciado por conta do virtuosismo da caracterização, que chama para si muito da atenção do espectador. Mas trata-se da melhor interpretação de toda a carreira dele.

O Curioso Caso de Benjamin Button é a intrigante jornada de um homem impossibilitado de criar raízes. Um homem condenado a uma existência que sempre o distanciará de todas as pessoas que amar. Mas o filme não tem nenhum tom de amargura. Benjamin sabe que não vai viver feliz para sempre, mas será feliz enquanto for possível. E sua história emociona porque envolve o espectador. Não há um grande momento dramático, uma revelação bombástica, uma cena chocante, uma grande virada. O filme é um somatório de delicadeza, lirismo e beleza. É luar, chuva, beijo na boca, sorriso. É um gato se espreguiçando ao sol. É cinema com “C” maiúsculo. Que coisa boa e revigorante já no comecinho de 2009 assistir a um filme desse nível. Desde já, um dos melhores do ano!

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

As Testemunhas


Ambientado na Paris de 1984, As Testemunhas faz um painel da onda de histeria e preconceito que varreu o mundo nos anos 80 com a descoberta da AIDS. Adrien é um médico homossexual de meia-idade com uma queda por parceiros bem mais jovens. Uma noite, passeando por um local de “pegação”, conhece Manu. Embora o rapaz deixe claro desde o princípio que não tem atração por Adrien, os dois acabam se tornando amigos – o que não impede que Adrien fique cada vez mais apaixonado por ele. Um dia ambos visitam um casal de amigos de Adrien: Sarah, escritora de livros infantis com pouquíssima paciência para o filho recém-nascido, e Mehdi, um policial durão. Mehdi e Manu logo iniciam um romance proibido, que sofre um baque quando Manu começa a apresentar sintomas de uma moléstia desconhecida.

As Testemunhas é um filme estranho. Seu lado mais interessante é como o retrato de uma época, a perda da inocência das pessoas que pensavam ser livres e, de repente, se viram aterrorizadas por sua própria e duramente conseguida liberdade sexual. Por outro lado, o longa tem um tom de denúncia e alerta que não faz muito sentido hoje em dia, quando as informações sobre o vírus da AIDS e sua prevenção são fartas e abundantes.

Também não ajuda o fato de todos os personagens serem egoístas e sem carisma, cada qual encarcerado no seu mundinho particular sem dar nenhuma atenção às necessidades de mais ninguém. Estamos falando de uma mãe que deixa o filho recém-nascido se esgoelando no berço e bota um walkman para não escutar seu choro; de um sedutor que se aproveita do afeto de um homem com quem não tem a mínima intenção de se envolver; de um cara de meia-idade que vive atrás de rapazinhos recém-saídos da adolescência; de um machão cheio de pose que arruma um romance secreto justo com o objeto de afeto de um amigo.

Somado ao fato de não ter uma condução das mais interessantes, resta ainda o problema da falta de ritmo do filme. As cenas alongadas e os diálogos desnecessários incomodam ainda mais na meia hora final, quando temos a sensação de que tudo já foi dito e o diretor está “enrolando” o espectador. Noves fora, resta um filme irregular. Algumas qualidades, vários defeitos.

Estréia nesta sexta.

174 fora do Oscar


O filme Última Parada 174, de Bruno Barreto, está definitivamente excluído da disputa pelo Oscar 2009 de melhor filme estrangeiro. Foi divulgada ontem a pré-lista, contendo os nove filmes que ainda brigam pelas cinco vagas que serão anunciadas no dia 22 deste mês. A entrega dos Oscars ocorre exatamente um mês depois, em 22 de fevereiro.

Que a não-indicação do filme sirva de alerta ao nosso Ministério da Cultura: os votantes desta categoria têm rejeitado sistematicamente filmes com temáticas que envolvem drogas, miséria e violência nos últimos anos. Inclusive o italiano Gomorra (um dos favoritos até então), que também ficou a ver navios.

Confiram a lista de pré-indicados deste ano:

The Baader Meinhof Complex (Alemanha)
Revanche (Áustria)
The Necessities of Life (Canadá)
The Class (França)
Waltz with Bashir (Israel)
Departures (Japão)
Tear This Heart Out (México)
Everlasting Moments (Suécia)
3 Monkeys (Turquia)

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Danny Boyle e Kate Winslet rumo ao Oscar

Numa noite de poucas surpresas, a 66ª edição do Globo de Ouro consagrou a sempre injustiçada Kate Winslet e também o novo filme de Danny Boyle, Slumdog Millionaire. A talentosa Kate, depois de cinco derrotas em anos anteriores, levou as duas estatuetas a que concorria: melhor atriz em drama por Revolutionary Road e melhor atriz coadjuvante por The Reader. Confesso que cheguei a ficar triste quando a atriz levou o prêmio de coadjuvante, já que vitória numa categoria costuma ser derrota certa na outra. Mas que nada! Já o filme de Danny Boyle (na foto à esquerda, com dois atores do filme) foi o grande vencedor da noite, com quatro estatuetas: melhor filme/drama, direção, roteiro e trilha sonora. O longa, rodado na Índia, narra a história de Jamal Malik, um jovem órfão que faz de tudo para participar da versão local do programa Who Wants To Be a Millionaire? (o Show do Milhão).

O momento de emoção foi a esperada premiação póstuma de Heath Ledger como melhor ator coadjuvante por Batman – O Cavaleiro das Trevas (aliás, a única indicação que o filme obteve). Já cientes do favoritismo do ator, os organizadores da festa prepararam uma cena de Ledger como o Coringa para exibir após o anúncio de sua vitória. Christopher Nolan, diretor do longa, recebeu o troféu com as seguintes palavras: “Todos nós que trabalhamos com Heath em The Dark Knight aceitamos isto como um sentimento de tristeza, mas incrivelmente orgulhosos”.

A grande surpresa da noite foi a vitória de Sally Hawkins como melhor atriz em musical ou comédia por Simplesmente Feliz, desbancando a favoritíssima Meryl Streep no musical Mamma Mia! – além de Emma Thompson, Frances McDormand e Rebecca Hall. Sally estava tão surpresa que mal conseguiu fazer um agradecimento.

Nas categorias televisivas, os grandes vencedores foram a sitcom 30 Rock (melhor série, ator para Alec Baldwin e atriz para Tina Fey) e a minissérie John Adams (melhor filme para TV, ator para Paul Giamatti e atriz para Laura Linney). Já o prêmio Cecil B. De Mille, reconhecimento à carreira como um todo, foi entregue a Steven Spielberg pelas mãos do amigo Martin Scorsese. Vale lembrar que a homenagem estava prevista para o ano passado, mas foi adiada depois que a greve dos roteiristas causou o cancelamento da festa. E haveria algo de político na premiação da animação israelense Waltz with Bashir – filme de técnica bacana, porém chatíssimo – como melhor filme estrangeiro?

Os filmes O Curioso Caso de Benjamin Button, Frost/Nixon e Dúvida, que lideravam as indicações (cinco para cada), saíram de mãos abanando. Pelo menos no caso de Benjamin Button, o único que já assisti, é uma pena que isso tenha acontecido. Vamos ver como ele se sai no Oscar, onde deve faturar pelo menos os prêmios de fotografia e direção de arte, que não existem no Globo de Ouro.

Confiram abaixo os vencedores nas categorias de cinema:

Filme (drama) - Slumdog Millionaire
Atriz (drama) - Kate Winslet (Revolutionary Road)
Ator (drama) - Mickey Rourke (The Wrestler)
Filme (musical/comédia) - Vicky Cristina Barcelona
Atriz (musical/comédia) - Sally Hawkins (Simplesmente Feliz)
Ator (musical/comédia) - Colin Farrell (Na Mira do Chefe)
Filme de Animação - Wall-E
Filme em Língua Estrangeira - Waltz With Bashir (Israel)
Atriz Coadjuvante - Kate Winslet (The Reader)
Ator Coadjuvante - Heath Ledger (Batman - O Cavaleiro das Trevas)
Diretor - Danny Boyle (Slumdog Millionaire)
Roteiro - Simon Beaufoy (Slumdog Millionaire)
Trilha Sonora - A. R. Rahman (Slumdog Millionaire)
Canção Original - The Wrestler (The Wrestler)

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Sem Pornografia no título


Eis que o povo das traduções estapafúrdias ataca novamente. O novo filme do irreverente Kevin Smith, Zack and Miri Make a Porno (Zack e Miri Fazem um Filme Pornô), aqui no Brasil se chamará... Pagando Bem, Que Mal Tem? (!!!) Sem comentários...

O longa, que conta a história de dois amigos de longa data que resolvem fazer um filme pornô para resolver seus problemas financeiros, estréia no dia 16 de janeiro.

O Dia Em Que a Terra Parou


Desde 1938, quando Orson Welles leu no rádio uma versão dramatizada de A Guerra dos Mundos e causou uma tremenda confusão entre seus conterrâneos – o povo acreditou que estava de fato ocorrendo uma invasão alienígena –, o medo do desconhecido se instaurou de modo irreversível no imaginário dos americanos. Inúmeros filmes foram feitos explorando esse tipo de paranóia, em especial na década de 50. Só que o temor dos homenzinhos do espaço pouco a pouco foi cedendo lugar nos corações e mentes americanos a outras ameaças mais próximas. Considerando a evidente datação do tema, parece meio fora de propósito refilmar o clássico da ficção científica O Dia Em Que a Terra Parou.

Também vale lembrar que na época em que foi produzido o original (1951), a mensagem conciliatória do longa servia como uma luva para reforçar os argumentos dos que se posicionavam contra a Guerra Fria entre Estados Unidos e Rússia – impasse que mal havia começado. Nesta nova versão, a trama é essencialmente a mesma, acrescida apenas de uma melhor tecnologia em efeitos especiais. O extraterrestre Klaatu chega à Terra trazendo um alerta contra a destruição do planeta, mas suas intenções são mal-interpretadas pelos militares e governantes que o capturam. A única pessoa disposta a ouvir o que ele tem a dizer é a cientista Helen Benson, que o ajuda a escapar e se torna uma fugitiva também. E ela ainda terá que persuadir o alienígena de que a Terra e os humanos podem evoluir e merecem uma segunda chance.

Podemos definir O Dia Em Que a Terra Parou como um filme morno: sem grandes defeitos, mas igualmente desprovido de grandes qualidades. Um longa ao qual você assiste sem problemas, mas que não fará nenhuma diferença para sua cultura cinematográfica. Mesmo porque o original de 1951 está aí para servir de comparação, então não há muito sentido refilmar a trama sem ao menos tentar esboçar um olhar original sobre ela. Mas, infelizmente, a indústria hollywoodiana a cada dia que passa fica mais preguiçosa. É impressionante como os americanos gostam de refilmar as mesmas histórias de modo exatamente igual. Claro que existem bons remakes, como Os Infiltrados, mas são louváveis exceções. Mas também, o que sobraria da meca do cinema sem as adaptações de HQ's e remakes? Talvez uma meia dúzia de cineastas que têm estilo próprio.

Sobre o elenco, pode-se perguntar o mesmo a respeito de Keanu Reeves: o que seria dele sem os blockbusters? O ator é do tipo que nunca muda, nem de aparência nem de expressão facial. Então devem ter pensado que colocá-lo no papel de um ser vindo de outra galáxia seria uma boa opção. O problema é que, embora seja de outro planeta, Klaatu não é um robô. Se ele pode se comover com a afeição humana, como acontece ao presenciar um diálogo entre Helen e o enteado, deveria poder esboçar alguma reação. E Reeves mantém-se com a mesma cara de paisagem em todas as cenas, como se fosse um andróide. Jennifer Connelly faz o que pode, mas a coitada acaba contracenando sozinha. Tampouco ajuda sua personagem ser uma cópia de outro trabalho seu, a Dra. Ross do primeiro Hulk – de novo, fazendo as vezes da bela que compreende a fera. A curiosidade fica por conta de ver já crescidinho o Jaden Smith, filho de Will Smith dentro e fora das telas em À Procura da Felicidade.

Resumindo, o filme é como diz aquela música do Lulu Santos: “não vou dizer que foi ruim, mas também não foi tão bom assim”.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

A Troca


Clint Eastwood possui dois merecidos Oscars de melhor diretor, por Os Imperdoáveis (1993) e Menina de Ouro (2005). E só não tem três porque seu excelente Sobre Meninos e Lobos bateu de frente com Peter Jackson justamente no ano em que o neozelandês levou onze estatuetas para coroar seu tour de force O Senhor dos Anéis. Em plena atividade aos 78 anos, Clint é uma figura admirável em todos os aspectos. Mas até mesmo Dirty Harry pode se equivocar, como demonstra este A Troca.

O roteiro foi escrito a partir de um caso real, documentado pela prefeitura de Los Angeles. Em um sábado de 1928 como outro qualquer, Christine Collins, mãe solteira e independente, se despede do filho de nove anos, Walter, e sai para trabalhar. Ao retornar, constata que o filho havia desaparecido sem deixar nenhum vestígio. Cinco meses depois, a polícia lhe dá a boa notícia de que Walter foi encontrado vivo e longe dali. Um menino é trazido e Christine tem um grande choque ao ver que não o reconhece como seu filho. Pressionada pelos policiais e atordoada pela imensa quantidade de jornalistas e fotógrafos, ela acaba duvidando de seus próprios instintos e leva a criança para casa. Logo constata que aquele realmente não é seu filho, mas a polícia se recusa a admitir que errou e passa a tratar Christine como louca.

Angelina Jolie tem performance exagerada, cheia de caras, bocas e gritos de leoa ferida. Não chega a ser uma interpretação ruim, apenas meio over – daí indicá-la ao Globo de Ouro já acho um exagero. Aliás, todo o filme tem uma atmosfera de exagero e grandiloquência que não é muito comum na filmografia recente de Clint Eastwood. O figurino riquíssimo de Angelina, por exemplo, parece excessivo para uma mãe de família batalhadora. Sempre com boca e olhos bem delineados, esbanjando charme até quando leva choque elétrico, a caracterização de atriz exala uma sofisticação desnecessária e até mesmo falsa.


As cenas se alongam, especialmente na segunda metade, e a trama troca de foco várias vezes, indecisa entre seguir a busca incansável da mãe coragem por seu filho ou denunciar a arbitrariedade e corrupção das autoridades. E tudo fica ainda mais difuso depois que entra em cena uma variante a respeito de um fazendeiro psicopata e seu sobrinho. Como se não bastasse, o roteiro vai se embaralhando e deixando uma série de detalhes mal-explicados ao longo do caminho. É tanta perfumaria e tão pouca coerência que o espectador certamente se perguntará o quanto o roteiro foi fiel aos fatos que lhe serviram de base.

Agora nos resta esperar por Gran Torino, o outro filme de Clint Eastwood feito em 2008, e torcer para que o diretor tenha tropeçado apenas neste aqui. Gran Torino estréia somente em fevereiro; A Troca, nesta sexta-feira.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Globo de Ouro e as Novidades

Entro 2009 com mais uma novidade: em breve estarei colaborando também com o projeto Cinefilia, que congrega um site e mais uma revista virtual. Ambos devem ser lançados até semana que vem, mas deixo aqui como uma prévia a matéria escrita a quatro mãos com o colega Pedro Henrique a respeito dos atores que concorrem ao Globo de Ouro. O motivo do texto ter ficado de fora da edição inaugural é óbvio: a premiação ocorre já no próximo domingo, ou seja, antes do lançamento do Cinefilia. Segue nossa matéria:

Globo de Ouro – Atores Indicados

Por Erika Liporaci e Pedro Henrique

Melhor Atriz (drama)
Anne Hathaway (O Casamento de Rachel)
Angelina Jolie (A Troca)
Meryl Streep (Doubt)
Kristin Scott Thomas (I've Loved You So Long)
Kate Winslet (Revolutionary Road)

Estamos falando aqui de cinco trabalhos ainda não vistos em telas brasileiras. Apenas O Casamento de Rachel passou no Festival do Rio, e a opinião de alguns colegas exaltava a boa atuação de Anne Hathaway – o que essa indicação só veio confirmar. Mas Anne tem pela frente uma concorrência extremamente pesada e não deve conseguir levar o prêmio. Idem para a inglesa Kristin Scott Thomas que, com sua presença discreta e elegante, dificilmente terá cacife para vencer Angelina Jolie e Kate Winslet, as duas concorrentes de fato ao prêmio. Kate tem a seu favor o altíssimo índice de indicações não-convertidas em prêmios. Ao Globo de Ouro, já foram sete (duas só esse ano); ao Oscar, nada menos que cinco (três como atriz principal e duas como coadjuvante). Também lhe favorece o fato de ser uma atriz mais conceituada que sua rival, cuja sensualidade muitas vezes ofusca o talento. Já Angelina conta com o fator estrelato e a simpatia que vem angariando fora das telas graças a seu envolvimento com causas sociais. Também existe uma pré-disposição favorável a atrizes que, como ela, fazem uma guinada dos filmes comerciais para trabalhos mais elevados artisticamente, proeza que a atriz havia tentado anteriormente com O Preço da Coragem e repete agora sob a batuta de Clint Eastwood. Por fim, a diva Meryl Streep seria uma ameaça às duas belas se não estivesse concorrendo também na categoria melhor atriz em musical/comédia por Mamma Mia!, filme no qual arrasa e deve sair vitoriosa.

Erika Liporaci
Quem eu acho que vence: Kate Winslet
Quem eu gostaria que vencesse: Kate Winslet
Quem não vence de jeito nenhum: Kristin Scott Thomas

Pedro Henrique
Quem eu acho que vence: Kate Winslet
Quem eu gostaria que vencesse: Angelina Jolie
Quem não vence de jeito nenhum: Kristin Scott Thomas


Melhor Ator (drama)
Leonardo DiCaprio (Revolutionary Road)
Frank Langella (Frost/Nixon)
Sean Penn (Milk)
Brad Pitt (O Curioso Caso de Benjamin Button)
Mickey Rourke (The Wrestler)

Terá chegado a vez de Leonardo DiCaprio? O rapaz, que era uma promessa no início de carreira, quase naufragou junto com o Titanic. Levou quase uma década para retomar o prestígio perdido, mas atualmente está em sua melhor fase. Foi ótimo em Diamante de Sangue, arrasou em Os Infiltrados e agora reencontra Kate Winslet sob a direção de Sam Mendes. Pode ser sua chance. Brad Pitt, o outro bonitão que luta para provar seu valor, concorre por um filme de David Fincher – o que é sempre um bom sinal. Mas pelas imagens mostradas até agora, o apelo maior de seu personagem parece ser a caracterização (Pitt começa o filme velhinho e vai rejuvenescendo). Sean Penn é sempre competente, mas tem contra si o fato de ter ganho um Oscar há pouco tempo (por Sobre Meninos e Lobos, há quatro anos). Mickey Rourke, apesar de bom ator, andava tão decadente que a mera indicação já é motivo de comemoração. Já o veterano Frank Langella parece ser a ameaça mais perigosa a DiCaprio. Grande ator que costumamos ver em papéis coadjuvantes, talvez tenha nesta indicação uma oportunidade única de ser premiado. E os votantes costumam se comover com esse tipo de reconhecimento.

Erika Liporaci
Quem eu acho que vence: Leonardo DiCaprio ou Frank Langella
Quem eu gostaria que vencesse: Leonardo DiCaprio
Quem não vence de jeito nenhum: todos têm chance

Pedro Henrique
Quem eu acho que vence: Mickey Rourke
Quem eu gostaria que vencesse: Mickey Rourke
Quem não vence de jeito nenhum: Leonardo DiCaprio

Melhor Atriz (musical/comédia)
Rebecca Hall (Vicky Cristina Barcelona)
Sally Hawkins (Simplesmente Feliz)
Frances McDormand (Queime Depois de Ler)
Meryl Streep (Mamma Mia!)
Emma Thompson (Last Chance Harvey)

Woody nos trouxe, com seu engraçadíssimo Vicky Cristina Barcelona, uma atriz que se mostrou competente do primeiro ao último minuto da metragem. Rebecca Hall, que já aparecera em O Grande Truque, de Chistopher Nolan, entrou de cara no espírito do filme e entregou uma atuação segura e promissora. Apesar disso, dificilmente será páreo para Meryl Streep, assim como Sally Hawkins, que apareceu bem em O Sonho de Cassandra, mas que dificilmente terá seu trabalho em Simplesmente Feliz premiado aqui. Aliás, Meryl entra como favorita na briga pela estatueta por seu trabalho em Mamma Mia!, filme que só respira graças ao seu talento. Surpresa agradável seria ver a sempre competente senhorita Coen, Frances McDormand, levar o caneco, pois ela está hilária no mais recente filme dos irmãos Coen. Emma Thompson, que conta com um currículo bastante interessante e já tem um Globo em casa, pode surpreender.

Erika Liporaci
Quem eu acho que vence: Meryl Streep
Quem eu gostaria que vencesse: Meryl Streep
Quem não vence de jeito nenhum: Rebecca Hall

Pedro Henrique
Quem eu acho que vence: Meryl Streep
Quem eu gostaria que vencesse: Frances McDormand
Quem não vence de jeito nenhum: Sally Hawkins


Melhor Ator (musical/comédia)
Javier Bardem (Vicky Cristina Barcelona)
Colin Farrell (Na Mira do Chefe)
James Franco (Segurando as Pontas)
Brendan Gleeson (Na Mira do Chefe)
Dustin Hoffman (Last Chance Harvey)

Tudo indica que esse prêmio consagrará o espanhol Javier Bardem. Colin Farrell está bem como o aprendiz de mafioso de Na Mira do Chefe, mas sua carreira é tão irregular que só esta indicação já é uma vitória. O mesmo se pode dizer do geralmente inexpressivo James Franco. Brendan Gleeson poderia surpreender. Dustin Hoffman é sempre um nome de peso, embora há muito tempo não apresente um trabalho no mesmo nível de antigamente. Posto isso, pode-se até dizer que dificilmente o prêmio sairá das mãos do ator espanhol, que levou a estatueta no ano passado pelo seu trabalho no filme dos irmãos Coen, Onde Os Fracos Não Têm Vez. Apesar dos bons trabalhos realizados pelos demais indicados, provavelmente nenhum deles terá poder de fogo para rivalizar com um dos atores que mais cresce ultimamente.

Erika Liporaci
Quem eu acho que vence: Javier Bardem
Quem eu gostaria que vencesse: Javier Bardem
Quem não vence de jeito nenhum: James Franco

Pedro Henrique
Quem eu acho que vence: Javier Bardem
Quem eu gostaria que vencesse: Javier Bardem
Quem não vence de jeito nenhum: James Franco


Melhor Atriz Coadjuvante
Amy Adams (Doubt)
Penélope Cruz (Vicky Cristina Barcelona)
Viola Davis (Doubt)
Marisa Tomei (The Wrestler)
Kate Winslet (The Reader)

A exemplo do que ocorre com seu compatriota Javier Bardem, as indicações desta categoria parecem conspirar em favor de Penélope Cruz. A presença da atriz é tão forte em Vicky Cristina Barcelona que chega a ofuscar as moças do título. Depois de um começo promissor na Espanha e uma carreira hollywoodiana que começou mal, Penélope encontrou o ponto de equilíbrio em sua carreira internacional com Volver. Amy Adams, indicada ano passado por Encantada, continua esbarrando em concorrência pesada. Kate Winslet concorre também na categoria principal e, como uma vitória numa categoria indica derrota em outra, a atriz deve perder aqui e sair vencedora lá. Marisa Tomei, boa atriz que ganhou um Oscar no começo da carreira e nunca mais acertou o passo, pode estar no caminho para retomar o prestígio perdido. Viola Davis, atriz televisiva vista recentemente como a dona da pousada de Noites de Tormenta, tem que comemorar a indicação e só.

Erika Liporaci
Quem eu acho que vence: Penélope Cruz
Quem eu gostaria que vencesse: Marisa Tomei
Quem não vence de jeito nenhum: Viola Davis

Pedro Henrique
Quem eu acho que vence: Penélope Cruz
Quem eu gostaria que vencesse: Penélope Cruz
Quem não vence de jeito nenhum: Viola Davis

Melhor Ator Coadjuvante
Tom Cruise (Trovão Tropical)
Robert Downey Jr. (Trovão Tropical)
Ralph Fiennes (A Duquesa)
Philip Seymour Hoffman (Doubt)
Heath Ledger (Batman - O Cavaleiro das Trevas)

Alguém realmente acha que há a mais remota possibilidade de Heath Ledger não ganhar esse prêmio? E premiar a performance do saudoso ator não vai ser nenhuma condescendência, já que seu trabalho é, de longe, uma das grandes performances vistas no cinema de todos os tempos. Somando o merecimento natural ao apelo afetivo por sua morte prematura, Ledger é simplesmente imbatível. E a concorrência fraca também ajuda: tanto Tom Cruise como Robert Downey Jr. têm participações divertidas em Trovão Tropical, mas que dificilmente poderiam ser consideradas interpretações de peso (mais uma vez, a grande curiosidade é a caracterização); Ralph Fiennes apresenta atuação apenas correta em A Duquesa e tem suas chances anuladas pelo fato do filme não ser grande coisa; e Philip Seymour Hoffman, o único dos cinco ainda não visto por aqui, tem contra si a premiação recente por Capote. Considerando tudo isso, será realmente uma grande surpresa se o Coringa não sair da festa consagrado e pronto para arrasar também no Oscar. Por que tão sério?

Erika Liporaci
Quem eu acho que vence: Heath Ledger
Quem eu gostaria que vencesse: Heath Ledger
Quem não vence de jeito nenhum: Tom Cruise

Pedro Henrique
Quem eu acho que vence: Heath Ledger
Quem eu gostaria que vencesse: Heath Ledger
Quem não vence de jeito nenhum: Tom Cruise

sábado, 3 de janeiro de 2009

Deserto Feliz


Podemos dizer que Deserto Feliz é um début na direção para o pernambucano Paulo Caldas, já que embora tenha co-dirigido anteriormente Baile Perfumado (com Lírio Ferreira) e O Rap do Pequeno Príncipe contra as Almas Sebosas (com Marcelo Luna), este é o primeiro longa-metragem que Caldas assina sozinho. Co-produção entre Brasil e Alemanha, o filme teve sua primeira exibição no Festival de Berlim de 2007 e, pouco depois, saiu de Gramado vencedor de seis prêmios: direção, fotografia, direção de arte, música, prêmio do júri popular e filme da crítica. E, como acontece cada vez mais com produções nacionais, teve que amargar mais de um ano engavetado antes de finalmente chegar ao circuito.

A trama é centrada em Jessica, uma adolescente que, cansada de ser abusada pelo padrasto sob a conivência da mãe, deixa a cidadezinha nordestina de Deserto Feliz e foge para Recife. Mas a vida na cidade grande também cobra seu preço e Jessica se estabelece na prostituição. Dividindo um conjugado com duas outras garotas, o pensamento reinante entre elas é o de que o melhor atalho para sair daquela vida é caindo nas graças de um “gringo”. Até que um dia o sonho personifica-se na figura de Mark, um turista alemão.

O grande diferencial do filme em relação a outros similares é sua opção pela poesia e delicadeza. Como tantas outras meninas, Jessica virou mulher antes de terminar de ser criança. O sexo foi sua primeira moeda de troca. Primeiro, forçada pelo padrasto; depois, como o meio de sobrevivência natural de quem perdeu a inocência da forma mais violenta possível. Mas, ao contrário do que se poderia esperar de um filme que lida com tal temática, Deserto Feliz deixa que a denúncia social se faça pelo contexto e não pelo que é exibido na tela. É um filme que evita a brutalidade explícita e mostra a violência de forma mais subtendida, quase metafórica. E nem por isso deixa de ser contundente.

O filme apresenta um ritmo deliberadamente lento e, embora esteja evidente que isso ocorra como uma intenção do diretor, em certos momentos esta opção narrativa torna a história pouco dinâmica. Algumas tomadas são tão contemplativas que acabam “tirando” o espectador da trama ao invés de conectá-lo. É claro que trata-se de um trabalho muito mais calcado em imagens do que em palavras (a protagonista, por exemplo, fala muito pouco), mas não era preciso exagerar na extensão de algumas cenas.

Felizmente, o elenco excepcional e lindamente dirigido faz com que o interesse seja mantido. A estreante Nash Laila (a cara da Natalie Portman), que antes desse filme só havia participado de duas peças de teatro, revelou-se um grande achado e leva toda a carga dramática do filme nas costas a despeito da juventude e pouca experiência. Também têm presença marcante o alemão Peter Ketnath (o mesmo de Cinema, Aspirinas e Urubus) e os expoentes atuais do cinema nacional João Miguel e Hermila Guedes, sem contar a luxuosa participação de Zezé Motta como a ex-prostituta que agora vive de alugar conjugados. Destaque para a cena em que sua personagem explica a Jessica como chegou a sua atual vida mansa.

O desfecho deixa no ar a dúvida sobre certos acontecimentos. Teriam de fato ocorrido ou representavam uma projeção desesperada da menina-mulher, uma versão de contos de fada adaptada para sua triste realidade? A conclusão fica a cargo do espectador, embora ambos os caminhos levem ao mesmo desenlace.