sexta-feira, 26 de abril de 2013

Reality – A Grande Ilusão


Reality, novo e badalado filme de Matteo Garrone chega às salas brasileiras com um ano de atraso. Antes de mais nada, preciso confessar que não conheço a filmografia do cineasta de uma maneira mais ampla e que, até então, só havia visto seu longa anterior, Gomorra. Só que, mais uma vez, seu trabalho decepciona. Se Gomorra é um filme que sempre me pareceu supervalorizado como um todo, este Reality decepciona de outra forma: inicia de forma espetacular, vai se enrolando lá pela metade e culmina em um desfecho frustrante.

O argumento é muito original: com uma crítica ferina ao conceito de fama nos dias atuais, a história acompanha o processo de desestabilização emocional de um napolitano simples que pira geral diante da possibilidade de ser selecionado para o Big Brother. De repente, tudo para Luciano é um teste e cada pessoa desconhecida, um olheiro da emissora. O problema é que o filme também vai pirando geral, exagera muito em algumas situações (mas sem um tom de alegoria que as justifique) e descamba para essa cena final que dá a impressão de que alguém deu a Garrone um roteiro incompleto e ele teve que improvisar qualquer coisa na hora – o que não é verdade, já que o roteiro foi escrito pelo próprio Garrone e outras três pessoas.

Há outra coisa que incomoda um pouco em Matteo Garrone: é pelo menos o segundo filme no qual esse cineasta romano ambienta sua trama em Napoli, e acaba sempre deixando muito claro o seu olhar de superioridade sobre a cidade e seus habitantes. Em Gomorra, as mazelas de uma cidade dominada pela máfia; em Reality, a personalidade do napolitano médio, um misto de extrema ingenuidade e malandragem.


Ressalva positiva e fator que segura o filme: o talento inquestionável e carisma imenso de Aniello Arena, mafioso da Camorra condenado por assassinato que se redescobriu em um grupo de teatro na prisão. Qualquer semelhança com Cesare Deve Morire não é mera coincidência.

Já nos cinemas.

domingo, 21 de abril de 2013

Bates Motel



Eu confesso que fico muito apreensiva quando alguém resolve mexer com um grande clássico, ainda mais no caso de Psicose – ainda estou traumatizada com o remake desastroso feito por Gus Van Sant em 1998. Por isso demorei um pouco a me inteirar de Bates Motel. Mas não há motivo para temor: a série não somente é muito boa como também tem identidade própria.

Bates Motel é focada na juventude de Norman Bates e sua sufocante relação com a mãe, Norma. O grande mérito da trama é nos apresentar Norman como um adolescente meigo e problemático, mas ainda totalmente dentro dos limites da sanidade mental. Aliás, na maior parte do tempo é a possessiva mãe que se sobressai como a louca da história.


Embora a trama seja atualizada para os dias de hoje, com direito a celulares e fones de ouvido, o design de produção cria uma aura atemporal, clássica, mantendo uma certa atmosfera de romantismo e decadência nos cenários da casa e do motel. Muito interessante também o acréscimo de mostrar um pouco sobre os habitantes da cidade e as tumultuadas relações entre eles, o que só reforça a ideia inicial de que Norman é um psicopata sim, mas o ambiente no qual foi criado e seu entorno não ajudaram nem um pouco.

Nos papéis de Norma, a mãe, e Norman, o filho, a sempre ótima Vera Farmiga e Freddie Highmore. É uma grata surpresa ver que o garotinho de Em Busca da Terra do Nunca e A Fantástica Fábrica de Chocolate cresceu em tamanho e talento, nos brindando com essa bela composição de um adolescente dividido entre desejos antagônicos. Seu Norman Bates é doce e charmoso, mas sempre deixa entrever uma centelha doentia e assustadora. Ou seria mero efeito de sugestão de nossas mentes, que já conhecem o que ele se tornaria no futuro?


Por essas e outras, Bates Motel é uma das séries mais festejadas do momento na TV americana. Assim como o filme original de Hitchcock, o seriado da A&E busca inspiração no livro Psycho, de Robert Bloch. Infelizmente, aqui no Brasil ainda não existe uma data para que a série chegue ao A&E ou a qualquer outro canal. Aguardemos.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Querida, Vou Comprar Cigarros e Já Volto


Ernesto é um corretor de imóveis de 63 anos que tem uma rotina tediosa em um pequeno povoado argentino, com a incômoda sensação de que nunca aproveitou a vida de verdade. Um dia aparece um homem misterioso que lhe propõe um pacto: caso concorde em passar dez anos em uma época qualquer do seu passado, Ernesto receberá uma mala contendo um milhão de dólares quando retornar a 2011. Esses dez anos, no tempo presente, serão somente cinco minutos. Portanto, bastaria que ele dissesse à esposa a frase-título do filme para justificar sua ausência.

O filme foi exibido no Festival do rio de 2011 e ninguém imaginou que um dia chegasse ao nosso circuito comercial. Mas ainda bem que, mesmo tardiamente, alguém acreditou em seu potencial, porque foi um dos mais criativos do evento. Nem tanto pelo argumento, já que a ideia de viajar no tempo é uma constante do cinema moderno, mas pela própria estrutura do longa. Começando sua história pelo dado mais nonsense, ou seja, o tal homem misterioso que ganha poderes depois que um raio o atinge duas vezes, o divertido roteiro ainda tem a cara-de-pau de fazer coisas como colocar na tela o autor do conto que originou o filme ajudando a explicar certas passagens e uma sonora claque aplaudindo o filme ao final.

Ao contrário de outras produções com a mesma temática, nos quais as pessoas costumam querer voltar ao passado para evitar traumas inesquecíveis ou recuperar um grande amor, Ernesto quer mesmo é se dar bem e conseguir fama, dinheiro, belas mulheres, enfim, tudo que nunca teve em sua vidinha modorrenta e, para tanto, inventa expedientes cada vez mais estapafúrdios, que vão desde plagiar Lennon e escrever uma cópia mal-acabada de Imagine – que não é igual ao original porque Ernesto nunca soube a letra – até inventar o formato reality show e vender para a TV local. Esse trecho, aliás, é hilário, porque o protagonista consegue vender a ideia e produzir uma cópia do Big Brother, mas o programa acaba sendo um fracasso porque “numa cidade onde até mesmo as moscas são chatas”, conforme diz o narrador, absolutamente nada acontece dentro da casa.

Estes são apenas alguns exemplos do estilo de humor desta deliciosa comédia protagonizada por um velhinho amoral e uma entidade mágica de origem indefinida. De trapalhada em trapalhada, Querida, Vou Comprar Cigarros e Já Volto é garantia de alto astral e boas risadas.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Mama


O cineasta mexicano Guillermo Del Toro tornou-se conhecido nos últimos anos por um estilo de terror/suspense muito interessante, no qual o foco da história sempre recai sobre uma criança em um ambiente hostil e a trama faz um paralelo entre o imaterial e a realidade, que muitas vezes é mais assustadora para essa criança do que o universo sobrenatural. Com o sucesso de A Espinha do Diabo e do fabuloso O Labirinto do Fauno, Del Toro passou a produzir filmes de jovens cineastas que seguiam seus passos. Fórmula que deu muito certo em O Orfanato, mas foi menos feliz em Não Tenha Medo do Escuro e agora se mostra totalmente desgastada neste Mama.

O longa fala sobre duas irmãs de seis e oito anos, Lily e Victoria. Devido a uma série de circunstâncias que não vale a pena detalhar aqui, as meninas são resgatadas após terem vivido sozinhas e de modo precário em uma cabana na floresta por cinco anos. Levadas para morar com o tio e sua esposa, elas precisam reaprender a se relacionar com outras pessoas e viver em sociedade, já que passaram praticamente a vida inteira em um ambiente selvagem. Como logo se pode perceber, Victoria e Lily não viveram esse tempo todo sozinhas e, ao deixar a cabana, levam com elas uma entidade que chamam de “Mama”.


Mama é escrito e dirigido pelo estreante em longas Andrés Muschietti, que chamou a atenção de Guillermo Del Toro com um curta de mesmo nome. Ou melhor, quase mesmo nome, já que não se sabe em que momento a palavra Mamá (mamãe em espanhol) perdeu o acento. Mamá, o curta, era instigante justamente porque mostrava de forma bem rápida a mãe que assombrava as meninas. É aquela velha regra: só mostre explicitamente uma criatura sobrenatural se ela for muito convincente. Caso contrário, é bem melhor ficar na sugestão. Reside aí, na total inadequação visual do espírito, a maior fragilidade do filme. O argumento é repetitivo, a trilha sonora é estridente e irritante e a direção de arte parece copiada de outras produções, mas nada disso chegaria a ser um problema sério se a figura da “mamãezinha querida” funcionasse. Infelizmente, é justamente a sua aparição constante e com muitos detalhes toscos que compromete o envolvimento do espectador com a história.

Ponto positivo do filme? O elenco, em especial as crianças. O casal de tios é interpretado por Jessica Chastain e Nikolaj Coster-Waldau, que cumprem bem sua parte, mas são as meninas Megan Charpentier e Isabelle Nélisse que conseguem conquistar o espectador e prender sua atenção. Como é bom ver boas atrizes infantis que não parecem adultos em miniatura. Ponto, ainda, para a caracterização de Victoria e Lily em versão selvagem, muito mais impressionante do que o fantasma possessivo. Tudo somado, Mama é um filme que pode ser atrativo para aficionados do gênero ou fãs de Jessica Chastain e Nikolaj Coster-Waldau, que ficaram superbonitos em versão rock’n’roll.


Amanhã nos cinemas.