sexta-feira, 24 de abril de 2009

Encontros e Desencontros


Sofia Coppola começou no mundo do cinema com o pé esquerdo. Em 1990, atuou no fecho da trilogia O Poderoso Chefão a pedido do pai e foi execrada pela crítica. Chegou-se ao exagero de dizer que Sofia estragou o filme. Resta saber se os comentários seriam tão duros com a caloura se não fosse o sobrenome famoso. Mas ela não se abateu. Em 1999, se lançou como diretora com As Virgens Suicidas. Embora tenha demonstrado segurança atrás das câmeras e obtido alguns elogios, o filme estava longe de ser uma unanimidade. Serviu mais para apagar a péssima imagem que o mundo artístico tinha da filha de Francis Ford.

Treze anos após seu desastrado début, Sofia Coppola riu por último e realizou o filmaço Encontros e Desencontros - escrito, dirigido e produzido por ela. A primeira coisa que chama a atenção é que a história fala de solidão e desencanto sem resvalar para o tom depressivo. Pelo contrário. O clima é de sarcasmo e auto-gozação, evitando o sentimentalismo barato. Sofia declarou que teve a idéia para o argumento a partir de uma experiência pessoal: numa de suas entressafras artísticas, criou uma confecção de roupas que eram exportadas, basicamente, para o Japão. Em tantas idas e vindas para a terra do sol nascente, crescia a sensação de atordoamento diante daquele país colorido e barulhento e a noção do quanto é fácil se perder no anonimato de suas ruas.


Assim nasceu a história de dois turistas involuntários que se encontram em Tóquio. Bob Harris é um astro de cinema decadente, que está na cidade para fazer uma campanha publicitária de uísque. Ele não entende o idioma nem o modo de ser do povo japonês. Charlotte está acompanhando o marido, um fotógrafo de celebridades que a deixa largada em um quarto de hotel o tempo todo. Sofrendo com o fuso, a solidão e as crises pessoais, Bob e Charlotte não conseguem dormir. Eles se esbarram repetidamente no bar do hotel, tentando afogar as mágoas em drinks, e logo iniciam uma amizade que brota da cumplicidade. Mais do que amigos, se tornam cúmplices em suportar as esquisitices daquele admirável mundo novo.

Bill Murray está surpreendentemente perfeito no papel de Bob. Chega a ser espantoso ver o comediante numa atuação tão contida, transmitindo a desesperança de seu personagem através de olhares entediados e comentários ácidos. Destaque para a seqüência das fotos, quando o tresloucado fotógrafo exige que ele imite o olhar de personalidades como Frank Sinatra e Roger Moore. É preciso ressaltar, ainda, a imensa empatia entre Murray e a então iniciante Scarlett Johansson, criando um sensível contraponto entre o cinismo do homem maduro que já viu de tudo e a fragilidade da garota que quer tomar um rumo, mas não sabe exatamente qual. Aliás, o sentimento de estar perdido é algo que pontua toda a história. Como diz o tagline do longa, everyone wants to be found.


Vale ressaltar, ainda, que Sofia Coppola encontrou um título brilhante para seu filme: Lost in Translation (Perdidos na Tradução) é um conceito óbvio e profundo ao mesmo tempo. Embora estejam literalmente perdidos na tradução por conta da estranheza ao idioma, Bob e Charlotte também se perderam na falta de equivalência entre os ideais que tentam preservar e o modo autômato como age a maioria das pessoas que os rodeia. Aqui no Brasil, o filme ganhou a denominação banal de Encontros e Desencontros. A beleza (e adequação) do título original foi mais uma coisa que se perdeu na tradução.

O filme recebeu três Globos de Ouro (melhor filme comédia/musical, roteiro e ator) e obteve quatro indicações ao Oscar 2004: melhor filme, direção, ator e roteiro original, vencendo este último.

Um comentário:

  1. Sem falar na ótima trilha sonora mesclando músicas de bandas sonoras perfeitas...e o que falar da 'Alone in Kioto', da banda francesa Air?

    Um filme intenso, ainda que sutil.

    Gosto muito também!

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