quarta-feira, 9 de abril de 2014

Hoje Eu Quero Voltar Sozinho


O título deste primeiro longa do paulista Daniel Ribeiro faz referência ao curta lhe deu origem (Eu Não Quero Voltar Sozinho, 2010) e conta com os mesmos personagens, interpretados pelos mesmos atores. A trama é centrada em três adolescentes: Leonardo é cego de nascença e melhor amigo de Giovana. Os dois estudam juntos, são companheiros inseparáveis e logo percebemos que Gi está sempre incentivando Leo a namorar porque ela mesma sente mais do que amizade por ele. A dupla vira trio com a chegada de Gabriel, que atrai primeiro o interesse de Giovana e, depois, o ciúme, já que ela começa a sentir excluída pelos meninos.

A trama é bastante parecida com a da sua versão curta-metragem, embora agora haja mais espaço para desenvolver a contento a história e, ainda, acrescentar novas questões que não existiam antes – não somente pela falta de tempo, mas também pelo fato dos personagens serem ainda muito jovens. Um exemplo disso é a sede de independência de Leo, que faria pouco sentido para um menino de catorze anos, mas é totalmente de acordo com as expectativas de um jovem de dezessete. Como todo adolescente, Leo quer trilhar seus próprios caminhos, fazer escolhas, sair sozinho, viajar, e não acha que sua deficiência visual deva impedi-lo, mas primeiro precisa vencer a superproteção dos pais.


Trata-se de um filme pautado por puro afeto, mas que em nenhum momento soa apelativo ou piegas. Mérito da direção leve de Daniel Ribeiro, mas também da interpretação descontraída e cheia de naturalidade dos atores. Além do ótimo trio central, formado por Guilherme Lobo, Fabio Audi e Tess Amorim (cujas atuações certamente foram muito beneficiadas pelo fato de já terem trabalhado juntos no curta), destaca-se também Isabela Guasco, que interpreta a menina exibida da escola – impagável a cena em que ela passeia por sua festa com um cachorro nos braços. Os diálogos são divertidos e não têm pudor em reproduzir as conversas e brincadeiras próprias da idade. Ainda bem, por que poucas coisas são mais irritantes do que crianças e adolescentes caracterizados como adultos em miniatura.

Conforme declarado pelo próprio cineasta em uma entrevista recente, o universo retratado no filme, mesmo ainda não podendo ser considerado uma plena realidade, é totalmente possível. Nele, a descoberta da sexualidade é repleta de dúvidas e emoção independente da orientação sexual; a pessoa diferente não está isenta da implicância dos colegas, mas a coisa nunca atinge limites realmente dolorosos; o deficiente vive em um ambiente que lhe permite buscar a independência, bastando, para isso, superar a resistência dos próprios pais. Um mundo de delicadeza, sensibilidade e esperança, assim é este belo exemplar de cinema made in Brazil.


Hoje Eu Quero Voltar Sozinho estreia amanhã já trazendo ótimas recomendações na bagagem: o filme venceu os prêmios FIPRESCI e Teddy no último Festival de Berlim. Imperdível.

Clique aqui para ler entrevista com diretor e elenco.

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