segunda-feira, 31 de março de 2008

Elizabeth – A Era de Ouro


Eu me lembro bem da primeira vez que vi Cate Blanchett na tela. Foi em 1998, ao assistir a Elizabeth. Na época, fiquei igualmente impressionada com o talento e o que me pareceu uma incrível feiúra da atriz. Mas bastou que Cate aparecesse belíssima nas premiações para mostrar que a feiúra não passava de um excelente trabalho de caracterização. Ficou apenas o assombro com seu talento dramático que, aliás, continua me encantando até hoje. Sobre o primeiro Elizabeth, era um bom filme, ainda que Cate e sua hipnótica presença sempre tenham sido maiores que ele. Nove anos e um Oscar depois (por O Aviador), a atriz volta a encarnar a mítica rainha inglesa em Elizabeth – A Era de Ouro.

Esta segunda parte da trilogia que o diretor Shekhar Kapur pretende realizar enfoca o período intermediário do longo reinado da chamada "Rainha Virgem". O ano é 1585 e Elizabeth está há quase três décadas no trono quando atrai a ira e ganância do poderoso rei espanhol Felipe II. Católico fanático e devoto dos terrores da Inquisição, Felipe anseia por conquistar a Inglaterra, destronar a protestante Elizabeth e colocar em seu lugar a católica Mary Stuart, rainha da Escócia - além de prima e prisioneira de Elizabeth.

Enquanto se concentra no lado histórico e das intrigas palacianas, Elizabeth até consegue ser um filme interessante. Não apenas por mostrar os meandros do jogo político e da alta traição, mas também pelo modo como a rainha e seu conselheiro, Sir Francis Walsingham, realizam uma espécie de marketing político e torcem a seu favor o fato dela nunca ter se casado nem gerado um herdeiro, habilmente transformando a (suposta) castidade em santidade e dando-lhe uma aura divina.

O grande problema é quando, a certa altura, o filme centra seu poder de fogo no triângulo amoroso formado pelo aventureiro Sir Walter Raleigh, Elizabeth e sua dama de companhia preferida (aliás, o início do filme parece sugerir uma atração entre as duas que não se concretiza). Aí o filme vira novelão mesmo, com direito a ceninhas de ciúme e diálogos inacreditáveis. Nesta segunda metade, a fragilidade do roteiro ajuda a evidenciar ainda mais certos exageros que já estavam ocorrendo, como cenas alongadas muito além do necessário ou seqüências inteiras que nada acrescentam à trama e que parecem ter sido rodadas apenas para exibir a bela fotografia. Sem contar a irritante trilha sonora grandiloqüente, com direito até a violinos sublinhando a morte de um personagem.

Um bom exemplo dessa gratuidade visual está na cena em que Elizabeth aparece à frente de seu exército usando peruca de guerra. Eu explico: ao longo do filme vemos que ela tem cabelos quase tosados (e piolhos) e usa aquelas perucas elaboradas para aparecer na corte. OK. Normal. Mas, mesmo frisando bem este detalhe em inúmeras cenas, quando ela surge à frente do exército está usando armadura e longuíssimos cabelos ruivos ao vento. Por que alguém se vestiria para a guerra de armadura e peruca? Certamente a hair stylist argumentaria que a rainha queria se mostrar bela para os soldados, mas tal desvario só faz o espectador lembrar das rainhas de bateria.

Esse artificialismo pontua todo o filme, mas tudo fica mais incômodo à medida que a trama avança e vai deixando pontas soltas em vários aspectos importantes do lado histórico para se concentrar nos delírios estéticos. Vários assuntos explorados antes perdem importância subitamente, como a revolta interna dos católicos ingleses. Os revoltosos simplesmente desistiram diante da queda de Mary Stuart? Sem contar a batalha no mar, que parece se resolver sem muito esforço. O que não combina muito com uma cena anterior que mostra o poderio esmagador da armada espanhola. Mas, em vez de amarrar esses nós, o diretor prefere anestesiar o espectador com tomadas estonteantes, em que Elizabeth é vista por ângulos privilegiados e iluminada como se fosse o próprio astro-rei.

Claro que Cate Blanchett está, mais uma vez, muito bem no papel. Mas até mesmo esse ponto positivo parece levar esta seqüência a um patamar inferior ao do primeiro filme, já que é uma continuação do mesmo papel e, portanto, a ótima interpretação de Cate como Elizabeth não chega a ser uma novidade.

Elizabeth – A Era de Ouro é como um falso brilhante: belo e fascinante à primeira vista, mas não resiste a um exame mais cuidadoso.

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