segunda-feira, 31 de março de 2008

Sangue no Pescoço do Gato


A Escola de Teatro Leonardo Alves (ETLA), no Catete, vem apresentando espetáculos de formatura que conquistam o público pela originalidade e ousadia. A peça atual é Sangue no Pescoço do Gato, um texto do cineasta alemão Rainer Werner Fassbinder. Phoebe, um espírito, é enviada à Terra com a difícil missão de compreender a condição humana. Embora ela tenha aprendido as palavras, não entende o significado das mesmas. Uma vez em meio à diversidade de tipos e personalidades que compõem a espécie humana, Phoebe observa as pessoas e tenta aprender os sentimentos humanos através delas. Mas como um espírito inocente absorveria nossas contradições e incoerências?

Já os tipos "humanos" são arquétipos, máscaras que muitas pessoas usam para definir os outros ou até mesmo a si próprias. O policial tem uma exagerada masculinidade; o açougueiro visa o dinheiro para disfarçar as carências; o gigolô satisfaz os outros, mas só pensa em si próprio; as amantes entregam o corpo, mas não o coração; o soldado precisa de ordem e comandos para que sua vida tenha sentido; a mocinha não sabe exatamente o que fazer com a mulher que começa a surgir; o professor sabe tudo de literatura e nada de inteligência emocional; a modelo acha que sua vida só terá sentido enquanto for bela; e a viúva do soldado se acostumou demais a ser a esposa de alguém.

A direção é de Marcio Moreira que, além de professor de interpretação da escola, foi um dos criadores do espetáculo Expectantes, sucesso da Fundição Progresso no ano passado. A concepção da peça é pop, moderna. Logo de início, chama atenção o uso de um telão que alterna imagens dos personagens propriamente ditos – mostrando uma espécie de lado oculto de cada um – com outras dos atores se preparando, além de um pout-pourri de imagens da mídia que vão desde Osama Bin Laden a Hebe Camargo, passando por trechos do Hamlet de Laurence Olivier. Ou seja: aquela salada ali é o mundo, com tudo de bom e ruim que nele existe. É. Phoebe está em apuros, coitada.

O elenco demonstra uma segurança que nem sempre é comum em espetáculos de formatura e encara com coragem e atitude profissional as dificuldades de um texto fragmentado e provocador. Figura central do elenco no papel de Phoebe, a irretocável Lanna Jacomo chama atenção por sua incrível expressão corporal e facial. A atriz inclusive fica boa parte da peça sem falar e, mesmo assim, consegue ter a platéia na palma da mão. Muito bem estudado o modo como a personagem começa a peça meio "dura" – estilo bonequinho playmobil – e, conforme observa as pessoas, vai ganhando contornos mais maleáveis. O elenco é afinado em geral, com destaque especial para o desprendimento de Rafhael Garcez (que faz um strip-tease que anda dando o que falar), a energia de Marcelo José, a presença cênica de Silvana Medeiros e a veia cômica de Marcel Cavalcante.

O espetáculo tem mais uma apresentação neste sábado, dia 5, às 20h, com entrada franca. Mas essa não é a última chance de assistir à peça. Em breve haverá uma temporada na Fundição Progresso, em datas a serem definidas ainda. A ETLA fica na Rua Corrêa Dutra, 99, sobreloja.

Sangue no Pescoço do Gato, de Rainer Werner Fassbinder. Direção: Marcio Moreira, com assistência de Yuri Calandrino e Raphael Pinta. Trilha sonora: Katia Jorgensen. Produção: ETLA. Elenco: Esthevan Poubel, Karine Coelho, Lanna Jacomo, Luana Duccini, Lucas Abbondati, Marcel Cavalcante, Marcelo José, Marcia Borges, Rafhael Garcez, Roberta Moreira e Silvana Medeiros. 90 minutos.

4 comentários:

  1. É isso aí Erika! A galera toda tá de parabéns! Muito obrigado pelo comentário elogioso viu? Que o "sangue" tenha vida longa!!!

    Um Grande Abraço a Todos
    Marcel Cavalcante

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  2. A peça é interessante demais. Questões realmente polêmicas são abordadas de forma criativa e original. As imagens na tela em sobreposição à ação no palco são legais também.
    E a protagonista é ótima.
    Achei que a peça poderia ser mais dinâmica, mas é boa assim mesmo.

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  3. Não vou me extender muito, pois meus comentários costumam ser prolixos.

    Primeiramente, eu queria agradecer a Erika por ter aceitado a sugestão de publicar um texto sobre esse espetáculo. Agradeço em nome de toda a equipe pelas palavras e pelo carinho com esse espetáculo tão especial!

    Realmente, "Sangue" está tomando uma forma que tende a crescer mais e mais, trazendo questões polêmicas da vida que a gente vê constantemente e muitas vezes mascara pra não encarar. É uma peça diferente, com mescla de cinema e teatro, atores que dão literalmente o sangue em cena, se desafiando constantemente a cada apresentação. Quem ainda não conferiu, vale muito a pena! E quem já conferiu, é só deixar os comentários. A voz do povo é a voz de Deus!

    Abraços a todos e Vida Longa ao "Sangue no pescoço do Gato"!

    Yuri Calandrino

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  4. Parabéns pela iniciativa do Blog !
    O espetáculo é o meu preferido de todas as montagens do Márcio até hoje!!!Acho que o dinamismo é uma questão também de "padrão" que estamos acostumados a assisitr por aí...
    É um texto muito, muito difícil pela repetição de diálogos seguidos. Os atores ainda vão encontrar essa medida..espero que continuem para o espetáculo ficar ainda melhor!

    bjsss
    Kátia jorgensen

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