segunda-feira, 31 de março de 2008

Sem Reservas


O cinema americano sempre adorou refilmagens. Alguns dos produtos mais célebres que Hollywood produziu tiveram até três versões diferentes, como é o caso de Duas Vidas (posteriormente, Tarde Demais para Esquecer e Love Affair – Segredos do Coração) e Ana e o Rei do Sião (depois, O Rei e Eu e Anna e o Rei). Mas a eterna febre por remakes vem ganhando uma feição inusitada nos últimos anos: agora os americanos andam se especializando em refazer filmes europeus lançados pouquíssimos anos antes. Ou seja: pegam um filme independente que fez sucesso no circuitinho dos cinemas de arte, mas não atingiu o grande público, e fazem um clone americano. Geralmente, igualzinho ao original. Aliás, isso tem acontecido não apenas com filmes europeus. O excelente longa argentino Nove Rainhas (2000) foi transmutado sem a menor cerimônia no fraquinho Criminal apenas quatro anos depois. Considerando essa preguiça intelectual, foi com uma certa má-vontade que fui assistir a Sem Reservas, primo ianque do alemão Simplesmente Martha (2001). Mas não é que dessa vez a receita não desandou?

A protagonista dessa nova versão é Kate Armstrong, a talentosa e estressada chef de um dos melhores restaurantes de Nova Iorque. Enquanto a carreira vai de vento em popa, a vida pessoal é inexistente. Seu temperamento obsessivo e controlador entra em choque quando o animado subchef Nick invade sua cozinha e logo conquista todos com seu jeito empolgado e descontraído. Ao mesmo tempo, Kate tem que lidar com a inesperada responsabilidade de criar Zoe, sua sobrinha de 9 anos.

A história é praticamente gêmea à do longa alemão, com direito inclusive a seqüências idênticas. Mas, de alguma forma, Sem Reservas consegue ser um filme mais simpático do que seu inspirador. Certamente isso se deve ao muito bem escolhido elenco. Aaron Eckhart (o canalha charmoso de Obrigado por Fumar) é infinitamente mais carismático e também melhor ator do que Sergio Castellito. Outro ponto negativo de Simplesmente Martha era a sem-gracice da menininha alemã, aqui substituída pela fofíssima Abigail Breslin – indicada ao Oscar do ano passado por Pequena Miss Sunshine. Até mesmo Catherine Zeta-Jones, que não é uma atriz que se pode chamar de "simpática", consegue criar identificação com a mulher moderna, consumida pela vida profissional, ao se mostrar levemente desarrumada e sem o seu habitual ar de grande dama na maioria das cenas. Sem contar que seu característico jeito mal-humorado casa perfeitamente com a personagem.

A única coisa que se perdeu na transferência de cenário foi a piada do choque de culturas. No filme original, o personagem de Castellito atraía tanta atenção pelo fato de ser um escandaloso italiano no meio de contidos alemães. Mas a verdade é que isso não fez tanta falta no resultado final. O roteiro de Sem Reservas também foi sábio ao extirpar a subtrama envolvendo o pai da sobrinha da protagonista, já que esse desvio, além de desnecessário, conferia uma certa pieguice ao filme.

O diretor Scott Hicks, que é mais conhecido pelo conturbado Shine - Brilhante (1996), mostra aqui que sabe filmar com leveza também. E essa é a melhor palavra para definir o filme: leveza. Uma comédia romântica de receita bem parecida com tantas outras, mas que acaba agradando ao paladar por possuir os ingredientes certos. Recomenda-se consumir. Sem reservas.

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