terça-feira, 6 de setembro de 2011

Riscado


(texto escrito no final de julho e reposicionado devido ao adiamento da estreia do filme)


Digam o que quiserem, mas, noves fora, este está sendo um bom ano para o cinema nacional. Ainda estamos na metade de 2011 e pelo menos duas produções excelentes já abrilhantam nossas telas. A primeira foi A Falta Que Nos Move, resistindo bravamente em cartaz no Rio de Janeiro ao longo de várias semanas, em três salinhas (e mesmo assim, dividindo horário); já a segunda pérola brazuca do ano ganhará os cinemas na próxima sexta-feira. Trata-se de Riscado, longa de estreia do jovem Gustavo Pizzi.

Coincidência ou não, ambos os filmes fazem um interessante paralelo entre os sempre difusos limites entre realidade e ficção e tem seus atores interpretando personagens que poderiam ser eles mesmos. Ou não. No caso de Riscado, o roteiro busca investigar o quanto a sorte pode influenciar uma carreira. Karine Teles, também co-autora do roteiro, é Bianca Ventura. Bianca, assim como Karine, é uma excelente atriz. Entende do Riscado. Então por que sua carreira não está chegando a lugar algum? Por que ela está sempre devendo o aluguel e tem que custear seu sonho com subempregos, ainda por cima ouvindo piadinhas de quem não tem a mínima sensibilidade para entender que arte é uma forma de vida e não um capricho?

A propaganda, a mídia, os programas de TV, os livros de autoajuda, enfim, toda essa indústria de felicidade dos tempos modernos sempre nos fez acreditar que, para atingir o sucesso, basta fazer a sua parte e ser perseverante. Fazer por onde. Quem espera sempre alcança. Deus ajuda quem cedo madruga. Mas seria simples assim, uma mera equação entre esforço dispendido e resultado alcançado? Bianca é talentosa, guerreira, disponível. Ainda acredita no que faz mesmo quando o mundo lhe diz não, mesmo quando confundem atriz com prostituta, mesmo quando lhe jogam na cara que ela estaria “velha demais” para sonhar.


Mas eis que um belo dia a sorte (olha ela aí de novo) sorri para Bianca. A moça faz um teste para um longa-metragem, coprodução entre Brasil e França, e o diretor não somente se encanta com seu trabalho como também resolve se basear na experiência pessoal dela para enriquecer a personagem do filme. Bianca estará contando sua própria vida nas telas, fazendo um filme sincero, que inspirará as pessoas. Tudo que ela sofreu, afinal, não foi em vão.

A partir desse ponto, o longa ganha três desdobramentos muito próximos: a atriz de Riscado, Karine Teles, se mescla com sua personagem Bianca Ventura, que, por sua vez, se confunde com a atriz do filme dentro do filme que terá Bianca como protagonista. Mas até onde essas três atrizes caminharão juntas? Terão todas o mesmo destino? Na verdade, o que o filme sugere é bem essencial: aquelas atrizes são todas as atrizes.

Karine Teles e Gustavo Pizzi – que são casados na vida real, criando aí mais uma leitura metalinguística – entregam para nós o que promete o diretor do filme de dentro: uma história sincera, que vai tocar o coração das pessoas. E que certamente tocará ainda mais fundo na alma de todos aqueles que tentam sobreviver de sua arte no Brasil. Que são denegridos, humilhados, menosprezados, tão-somente por estarem à margem da engrenagem de lucro, poder e satisfação imediata que rege o mundo das ditas “pessoas sérias”. Por serem diferentes. Por serem ingênuos a ponto de terem se tornado adultos que sonham.


O filme fez bonito no último Festival do Rio, agradando público e crítica, e dando o troféu Redentor de melhor atriz para a performance arrasadora de Karine Teles. Vamos torcer para que repita esse sucesso agora no circuito comercial. Gustavo e Karine merecem. Eles entendem (e muito) do riscado.

9 de setembro nos cinemas. Não percam!

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