sexta-feira, 30 de abril de 2010

Tudo Pode Dar Certo


Woody-allen-maníacos, alegrai-vos! Finalmente chega aos cinemas do país Tudo Pode Dar Certo, seu novo longa-metragem. De volta a Nova Iorque depois de quatro filmes rodados na Europa, Woody retorna não somente à cidade-musa, mas também ao seu estilo de trabalho mais típico, ou seja, a uma produção onde a trama é menos importante do que as angústias e idiossincrasias do protagonista – que se apresenta como um alter ego de Allen, independentemente de ser interpretado ou não por ele.

O personagem hipocondríaco e depressivo da vez atende pelo nome de Boris Yellnikoff, um intelectual divorciado e rabugento que não acredita em quase nada e não suporta a companhia de quase ninguém, salvo dois ou três velhos amigos. E, mesmo assim, só consegue estar com eles por um curtíssimo período de tempo. Professor aposentado e candidato frustrado a um prêmio Nobel, Boris ensina xadrez a crianças, atividade que parece desempenhar apenas com o objetivo de destratar, ofender e até mesmo agredir fisicamente os indefesos alunos. Sem contar que ele tem absoluta certeza de estar sendo observado por pessoas que pagaram ingresso para ver sua vida, brincadeira metalinguística que faz com que os outros personagens o classifiquem como neurótico.

Uma noite, ao retornar para seu apartamento, Boris é surpreendido por Melodie St. Ann Celestine, que dorme na rua e lhe implora um prato de comida. Boris deixa que ela entre, ainda que a contragosto. Ao saber que a garota, vinda do sul, fugiu de casa e não tem para onde ir, permite que ela passe a noite. A noite se converte em dias, os dias em meses, e, com o passar do tempo, o rabugento acaba gostando de ter alguém para quem expressar toda sua frustração e egocentrismo, já que Melodie o acha genial e recebe cada ofensa como um ensinamento. Está estabelecida a base para os diálogos afiados e ironias finas em cima dos problemas do cotidiano.

Não tarda para que o improvável torne-se realidade e os dois se envolvem, mais por carência de ambas as partes do que propriamente por amor, e poderiam ter uma vida tranquila caso Melodie não fosse encontrada primeiro por sua mãe, fanática religiosa e perua preconceituosa, e depois pelo pai, mulherengo com muitas coisas a esconder. É a partir desse ponto que a trama ganha novo e insuspeito fôlego e o que parecia pré-estabelecido vira de pernas para o ar. A chegada dos novos personagens e os novos conflitos por eles criados acrescenta inesperados desdobramentos e leveza a uma história que até então pendia mais para a melancolia, apesar de suas tiradas irônicas e diálogos cheios de sarcasmo.

Larry David está perfeito como Boris, uma visão extremada e mais dura da habitual persona neurastênica interpretada por Woody Allen nas telas. Ao mesmo tempo, o comediante-roteirista consegue conferir alguma dose de fragilidade a um personagem que, se interpretado sem nuances, poderia ser insuportável. Evan Rachel Wood também convence com sua burrice ingênua e doce, fazendo parecer viável que uma jovem como ela se interesse por uma figura como Boris. Outro grande destaque do elenco é a sempre competente Patricia Clarkson como a mãe conservadora que acaba por soltar a franga quando liberta do ambiente sulista onde vivera até então. Sensacional.

Tudo Pode Dar Certo, tradução não muito fiel de Whatever Works, é daqueles filmes que passam em instantes, tamanho o prazer do espectador em assisti-lo. E ainda tem o charme extra de deixar um sorriso de indulgência e compreensão no nosso rosto muito tempo depois das luzes se acenderem. Afinal de contas, a vida é louca e vale a pena tentar seja lá o que for que funcione.

2 comentários:

  1. Baita filme, sem dúvida. Resenhei ele lá no blog também. Claro que os detratores estão dizendo que é um Woody Allen "menor", mas é um filme de extremo bom gosto.

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  2. Eu, particularmente, gosto muito mais de filmes como esse do que de outros mais badalados, como Vicky Cristina Barcelona.

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