quinta-feira, 19 de abril de 2012

Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios


O cinema personalíssimo de Beto Brant tem alguns aspectos recorrentes que o acompanham desde seu longa-metragem de estreia (Os Matadores, 1997): o flerte com o inusitado, os personagens empurrados para situações limítrofes, a ousadia estética e, sobretudo, a parceria constante com o escritor e roteirista Marçal Aquino. Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios é o segundo no qual divide a direção com o produtor Renato Ciasca (o anterior foi Cão Sem Dono, 2007) e o sexto escrito por Marçal Aquino, também autor do romance que deu origem ao roteiro.

O filme foi exibido no último Festival do Rio, de onde Camila Pitanga saiu (merecidamente) vencedora do Troféu Redentor de melhor atriz. Camila apresenta um trabalho simplesmente primoroso na construção da personagem Lavínia, uma mulher que ao longo do filme passa por diversas transições de ordem moral e psicológica. Quando o fotógrafo Cauby, um forasteiro de passagem pelo interior da Amazônia, cai de amores pela linda Lavínia, não poderia imaginar que as complicações iriam além do fato da moça ser casada com Ernani, o popular pastor da comunidade.


O triângulo amoroso se estabelece ao mesmo tempo em que Cauby começa a perceber que naquele confim de mundo muitas coisas ainda se resolvem à moda antiga. O filme tem uma pegada expressionista e é muito feliz ao apresentar algumas figuras tipicamente interioranas, como, por exemplo, o delegado de distintivo à mostra. O fato de utilizar alguns atores desconhecidos nesses papéis reforça a sensação de realismo, embora o tom levemente documental dado a algumas sequências não combine muito com o intenso erotismo e poesia da trama central. Não se vê muita função em algumas cenas, como, por exemplo, a longa tomada sobrevoando a mata que surge na tela justamente em dos momentos mais tensos da história ou uma sequência inteira de um número circense – a da “mulher que vira peixe”. Não que essas e outras passagens semelhantes comprometam o andamento da trama, mas elas soam desconexas com o restante, dispersando o foco da história sem que haja uma razão aparente. Por outro lado, algumas questões fundamentais parecem pouco evidenciadas na meia hora final.


O filme é lindamente fotografado e vale dizer que o papel que a fotografia desempenha na trama vai além dos fotogramas em si, alcançando um desdobramento interessante através do olhar de Cauby e sua câmera sobre Lavínia. Além da força da já citada interpretação de Camila Pitanga, é preciso destacar Zecarlos Machado (do Grupo Tapa) e Gustavo Machado, os bons atores que completam as outras pontas do triângulo, e ainda a participação de Gero Camilo como um inescrupuloso e infeliz paparazzo. Regendo esses personagens complexos e confusos em busca de rumo, Beto Brant entrega um filme bastante intenso e impressionante e que certamente merece ser visto. 

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