sexta-feira, 18 de maio de 2012

JT – Um Conto de Fadas Punk


A temporada está quase acabando, mas ainda dá tempo de compartilhar – e recomendar – a boa surpresa que foi assistir a este inteligente e divertido espetáculo. O texto é da jornalista Luciana Pessanha, que, baseada na polêmica real envolvendo uma fraude literária, criou este texto esperto, sarcástico e cheio de referências ao universo pop e à era das celebridades.

Em 1999 foi publicado o livro Maldito Coração, supostamente um relato autobiográfico de um adolescente traumatizado e que teria passado por todo tipo de abusos em sua infância. O mistério em torno da identidade do autor vai ganhando proporções épicas, já que ninguém sabe quem é este JT Leroy que se esconde da mídia e dá entrevistas somente por telefone. Quando JT finalmente aparece, a curiosidade em torno dele fica ainda maior, graças à sua figura andrógina, sempre oculta por trás de enormes óculos escuros. O rapaz teria fobia social e estaria sujeito a ataques de pânico, não sendo raro que saísse correndo dos eventos que participava.

Luciana Pessanha teve oportunidade de entrevistar JT Leroy em 2005, quando ele esteve em Paraty, participando da Flip. Alguns meses depois, veio a público o grande segredo: os livros de Leroy haviam sido escritos por Laura Albert, ex-cantora punk e escritora frustrada que havia inventado o personagem com o intuito de alcançar a fama. A pessoa que se apresentava como JT, na verdade, era sua cunhada Savannah. Na imaginação delirante de Laura, era preciso dar ao público o personagem esperado. A essa altura, Maldito Coração já havia sido filmado por Asia Argento e JT era cultuado por celebridades como Madonna e Bono Vox.


O texto de Luciana conta, de modo não-linear, a trajetória desta celebridade fabricada. Em uma era onde as pessoas matam e morrem por um pouquinho de exposição, cria-se um fenômeno da mídia conhecido justamente por sua reclusão ferrenha. No palco, Débora Duboc e Natália Lage encarnam essas duas metades de uma mesma personalidade. Muito interessante a discussão das duas, quando Laura expõe a mágoa de ser a verdadeira autora dos livros e Savannah questiona se os escritos teriam a mesma visibilidade sem sua interpretação pungente de um jovem soropositivo drogado e prostituído. Roberto Souza, Nina Morena e Hossen Minussi, com timing perfeito, dão vida às muitas pessoas que gravitam em torno das duas: amigos, fotógrafos, agentes e até mesmo a atriz e diretora italiana Asia Argento.

Repleta de projeções, música, som e fúria, a encenação dirigida por Susana Ribeiro sob supervisão de Paulo José é dinâmica e muito engraçada, ao mesmo tempo em que propõe uma reflexão bastante séria sobre o poder do mito e o sempre difuso limite entre o marketing agressivo e a desonestidade. Em que ponto a criação do personagem JT deixa de ser uma representação artística inocente para se tornar uma fraude?

Quem quiser conferir este ótimo espetáculo deve se apressar. JT – Um Conto de Fadas Punk fica em cartaz no Teatro I do CCBB-RJ somente até o dia 27 de maio. Quarta a domingo, às 19h. Ingressos a 6 reais.

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