quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

O Lobo de Wall Street


Ser ganancioso é bom, já propagandeava Gordon Gekko, o célebre personagem de Michael Douglas no filme Wall Street. Jordan Belfort, interpretado por Leonardo DiCaprio neste O Lobo de Wall Street, eleva essa ganância a outro patamar. Evidente que Jordan e seus seguidores almejavam o poder e a riqueza, mas o que eles ambicionavam era, sobretudo, o sentimento de invencibilidade que acompanha o dinheiro. A fome que os consumia ultrapassava a mera acumulação de capital, já que suas fortunas funcionavam como veículo para uma vida sem limites: mulheres, drogas, festas extravagantes, brincadeiras imorais, tudo acompanhado de um imenso desprezo por quem levava uma vida moderada.

O Lobo de Wall Street narra a trajetória verídica de Jordan Belfort, um jovem ambicioso que sonha fazer fortuna como corretor de Wall Street. O problema é que ele dá o azar de conseguir seu emprego ideal às vésperas da chamada “segunda-feira negra” (19 de outubro de 1987, o maior desastre do mercado financeiro depois da quebra da Bolsa de 1929). De uma hora para outra, Jordan se vê de volta à estaca zero. Mas o imprevisto não o detém. Depois de aprender soluções pouco ortodoxas em uma corretora de fundo de quintal, Jordan abre sua própria empresa e, em pouco tempo, consegue ir além das suas mais loucas ambições graças a seu estilo ousado e sua pouca atenção às leis. Jordan torna-se ídolo para seus funcionários, mas sua vida surreal também chama a atenção das autoridades.


Assim como o estilo de vida pregado por seus personagens, também o filme acompanha essa cadência: O Lobo de Wall Street tem um ritmo frenético e alucinógeno. São três horas de projeção que passam muito velozes diante dos olhos do espectador, que mal se recupera de uma orgia e é jogado em outra, desse modo trazendo o público para muito perto do universo de excesso e loucura no qual se ambienta a história. Interessante também é a opção de Scorsese de abrir mão da tradicional narração em off para colocar seu protagonista falando diretamente com a câmera. Mas o recurso faz todo sentido se considerarmos que o roteiro é baseado na autobiografia do próprio Jordan e que o moço fez fortuna justamente desse modo: convencendo as pessoas de que seu ponto de vista é o correto.

Leonardo DiCaprio carrega o filme nas costas, ajustando sua interpretação de modo exemplar a cada uma das fases e facetas do personagem, que começa como um rapaz esperto e ambicioso e logo parte para caminhos fascinantes e, ao mesmo tempo, sombrios. Qual é o limite de alguém que de fato chega a ser o “rei do mundo”? O que satisfaz a sede de adrenalina de quem já fez de tudo e, pior, que pode tudo? Os demais atores também estão bem, mas o filme é todo de Leo. Jonah Hill convence com uma boa composição, embora sua indicação ao Oscar não seja merecida por ter deixado de fora candidatos mais interessantes. Outras participações que se destacam são as do cineasta Rob Reiner como o pai de Jordan (alcunhado “Mad Max”) e do francês Jean Dujardin como um banqueiro suíço.


A direção de Martin Scorsese é tão precisa e leve que pode dar ao espectador a impressão de que o filme se dirigiu sozinho. Mas não. O trabalho do cineasta aqui lembra o que se costuma dizer dos grandes escritores, que sempre dão a impressão de que tudo que fazem foi realizado com extrema facilidade. É um filme de inúmeras qualidades, mas talvez a que mais se sobressaia seja a total ausência de hipocrisia na condução da trama. O hedonismo dos personagens é mostrado em toda sua extensão: com os danos físicos e emocionais, mas também com todo seu poder de sedução e glamour. Em nenhum momento, Scorsese ou o roteirista Terence Winter (que também escreveu Os Sopranos e Boardwalk Empire) tentam passar uma lição de moral ou convencer o espectador de que ser pobre é melhor do que ser milionário. É um filme que passa ao largo do edificante e do politicamente correto, o que é muito saudável nos tempos atuais.


O Lobo de Wall Street concorre a cinco Oscars: melhor filme, ator, ator coadjuvante, direção e roteiro adaptado. Leonardo DiCaprio já venceu o Globo de Ouro como melhor ator em comédia, mas dificilmente repetirá a vitória no Oscar. O que é uma pena, porque será a quarta vez que o ator tem uma indicação (merecida) que não se converterá em prêmio.

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