quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Fonte da Vida


O projeto de Fonte da Vida começou a ser desenvolvido em 2002, tendo Brad Pitt e Cate Blanchett à frente do elenco. Um belo dia, mais de dois anos após o início dos trabalhos, surgiram as chamadas diferenças criativas entre o astro e o cineasta Darren Aronofsky. Tendo perdido sua principal garantia de gordas bilheterias, o diretor sofreu o desgosto de ver seu projeto de estimação cancelado pelo estúdio. A solução encontrada por Aronofsky para salvar a produção foi refazer o roteiro, cortando o supérfluo e enxugando o que fosse dispendioso em excesso. E assim o filme, que inicialmente estava orçado em 90 milhões de dólares, acabou tendo quatro anos depois um custo bem modesto para os padrões americanos: 35 milhões. No lugar de Pitt e Blanchett, foram escalados Hugh Jackman e Rachel Weisz - esposa do diretor e premiada com um Oscar por O Jardineiro Fiel.

Fonte da Vida é uma viagem psicodélica que se desenvolve em três eras distintas: no século XVI, quando o conquistador espanhol Tomás se embrenha nas selvas da Guatemala em busca da Fonte da Juventude como arma para salvaguardar o reinado de sua idolatrada rainha; no século XXI, enfocando um cientista obcecado em descobrir a cura para o câncer que corrói impiedosamente sua amada esposa; e no século XXVI, quando um desdobramento desse mesmo homem vaga pelo espaço ainda em busca de respostas que acalmem seu irrequieto coração. As três narrativas sofrem interseções em diversos pontos, assim como as três manifestações desse personagem - guerreiro, cientista e viajante - buscam, de diferentes formas e por diferentes motivações, um modo de parar o tempo e vencer a morte.

A subjetividade talvez seja o que há de mais fascinante em Fonte da Vida: é um filme mais para ser sentido, experimentado, do que propriamente entendido. Pelo menos, não em seus mínimos detalhes. Muitas coisas dão margem a interpretações pessoais. Não por alguma falha no roteiro e sim por colocar as situações em termos metafísicos. Tomás, Tommy e Tom são, de fato, o mesmo homem ou apenas simbolizam que o desejo de desafiar o destino é constante através dos tempos? Seriam eles arquétipos da negação humana diante do inevitável? Afinal, morrer faz parte do ciclo da vida e, em muitas culturas, tal transição simboliza tão-somente um renascimento. É especialmente triste a situação de Tommy Creo, o cientista dos dias atuais. O personagem está tão determinado em encontrar uma cura para a doença da esposa que gasta o escasso tempo que poderia passar ao lado dela afundado em seus desesperados experimentos. Embora a trama se estenda por um período de mil anos, é justamente contra o tempo que correm os personagens. Todas as histórias - que podem ser encaradas como uma só - são centradas em um homem que se revolta por não aceitar a perda de quem ama. E o tempo é sempre um fator determinante contra ele. Esse método peculiar de criar universos independentes e uni-los, convergindo para uma conclusão em comum, lembra um pouco a estrutura dramática de As Horas.

O principal problema de apostar numa abordagem tão etérea é dar ao espectador a impressão de que o filme, deslumbrante visualmente, tem pouco a dizer. Neste ponto, devo confessar ao caro leitor que tive essa sensação num primeiro momento. Mas, ao ver o longa pela segunda vez, tive uma nova percepção que, de alguma forma, me passou despercebida anteriormente. Tudo se resume a isso, no final das contas: ser tocado ou não por essa odisséia milenar em busca de vida, sabedoria e amor.

Embora os efeitos especiais - pontuados por uma bela trilha musical - sejam a primeira coisa que salta aos olhos, é a interpretação competente de Hugh Jackman e Rachel Weisz que dá sustentação ao filme. Jackman já provou que não vai ficar o resto da vida colhendo os louros do sucesso do Wolverine da série X-Men e vem se mostrando a cada dia mais versátil. E Fonte da Vida é uma bela amostra disso, especialmente pelo modo como o ator diferencia os diversificados estados de espírito de suas três encarnações. Uma atuação segura e apaixonada, como convém à história contada pelo longa. A também ótima Rachel Weisz ilumina a tela com seu sorriso doce, fazendo um contraponto radiante ao sombrio e atormentado companheiro. Podemos notar que a imagem da atriz está sempre destacada, clara, idealizada, enquanto o personagem de Jackman é mantido nas sombras. O que abre mais uma possibilidade: seria ela, a mulher amada, a verdadeira fonte da vida deste homem?

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