quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Os Estranhos


A cultura americana considera o lar de uma pessoa santuário sagrado, tanto que é perfeitamente admissível um cidadão assassinar alguém a tiros se esta pessoa profanou a propriedade privada dele. Coisa de raiz cultural mesmo. Isso dá uma pálida idéia do quanto o atentado ao World Trade Center feriu o povo americano. Mais do que o saldo de mortos, o que realmente os apavora é a exposição da própria fragilidade e da incapacidade de defender seu território.

Partindo do geral para o particular, Os Estranhos mostra um jovem casal acuado madrugada adentro por três delinqüentes. Ao voltar do casamento de um amigo, Kristen e James se dirigem à casa de campo da família dele. Durante a festa, os dois têm um desentendimento e chegam ao local onde deveriam passar uma noite romântica no pior dos climas. É quando uma garota bate à porta às três da manhã perguntando por alguém chamada Tamara. Como o casal logo percebe, ela não está sozinha. E aquelas pessoas parecem dispostas a apavorá-los até o limite de sua forças, num jogo inexplicavelmente perverso.

Apesar de iniciar com legendas que dizem que o filme é baseado em um caso verídico ocorrido em 2005, o diretor e roteirista Bryan Bertino confessou que, na verdade, sua trama foi costurada a partir de várias histórias reais e não uma em particular. Estreante em longas, Bertino demonstra habilidade ao criar um clima progressivamente assustador, que começa a se insinuar muito antes que qualquer ameaça real seja mostrada na tela. Os personagens de Liv Tyler e Scott Speedman ganham nossa simpatia ao acompanharmos sua ameaça de rompimento, que posteriormente se revela o menor dos sofrimentos pelos quais os dois irão passar naquela longa noite.

Parente direto de Violência Gratuita, de Michael Haneke, Os Estranhos acaba sendo um filme mais bem-resolvido justamente por sua falta de pretensão intelectual. O problema está no uso indiscriminado que o roteiro faz dos clichês habituais do gênero, sendo o pior deles o exagero na invencibilidade dos vândalos. A força e agilidade do trio é tão espantosa que em determinadas seqüências eles parecem mais fantasmas do que pessoas. Isso sem contar as decisões absurdas dos protagonistas, como, por exemplo, o momento em que James resolve ir ao celeiro tentar pedir socorro através de um rádio velho (!!!) e deixa Kristen sozinha e desprotegida ao invés de irem os dois juntos. Mesmo considerando que o pânico faz com que as pessoas não raciocinem direito, não dá para engolir uma atitude tão estúpida.

De qualquer maneira, Os Estranhos se mantém acima da média deste estilo de filme. A montagem é ágil sem ser histérica, a trilha sonora é usada nos momentos certos, a câmera é manejada de modo a criar medo (e não apenas dar sustos) e Liv Tyler e Scott Speedman dão credibilidade à situação desesperadora que seus personagens vivem. Mas creio que a grande sacada do filme está em seu assustador recado subliminar: por mais que as portas estejam trancadas, nem sempre é possível manter o inimigo de fora.

Um comentário:

  1. Menos intectual que "O Nevoeiro" e mais tenso que "[REC]". Gostei muito do filme, apesar da estupidez que você bem apontou!

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