quarta-feira, 22 de julho de 2009

À Deriva - Coletiva de Imprensa


Aconteceu hoje à tarde em um hotel em Copacabana a coletiva de imprensa do filme À Deriva, o novo longa-metragem de Heitor Dhalia (Nina, O Cheiro do Ralo). O filme foi exibido no Festival de Cannes deste ano. Além do diretor, estavam presentes os atores Vincent Cassel, Débora Bloch e Laura Neiva. Num clima bastante descontraído, o papo começou com algumas explicações de Heitor a respeito do filme, que é livremente baseado em suas memórias sobre a época em que seus pais se divorciaram.

“Na verdade, quando o projeto começou eu queria contar a história dessa menina que descobre que o pai está tendo um caso e sente o despertar da própria sexualidade a partir dessa experiência. Depois que eu fui entendendo que o filme faria mais sentido para mim se eu acrescentasse elementos da minha própria história. Aí foi ficando realmente mais pessoal, mas não é exatamente a história da separação dos meus pais. Eu fiz outras inversões, além da protagonista ser uma menina.”

Perguntei ao ator Vincent Cassel como ele vê o fato de pela primeira vez interpretar um pai de família pacato, considerando seu histórico de personagens rebeldes e explosivos. O ator respondeu com a costumeira irreverência, dizendo que o tempo passa e ele tem idade para esse tipo de papel agora, mas logo completou: “Foi uma oportunidade de fazer uma coisa diferente, mas eu também gosto dos personagens violentos e não vou abandoná-los.”



Sobre a coincidência de estrear um filme que trata de conflito familiar ao mesmo tempo em que interpreta uma personagem que vive o mesmo problema numa novela, Débora Bloch disse que acredita estar representando as mulheres da sua geração e está muito satisfeita com o trabalho em À Deriva, principalmente devido aos conflitos de sua personagem: “Acho que é um papel muito bem construído. A Clarice tem muitos conflitos e, quanto mais conflitos, melhor para a atriz. Os personagens em crise são sempre mais interessantes.”

Quanto às relações de trabalho no set, Vincent Cassel comentou que Heitor Dhalia os deixava livres para seguir as próprias intuições e não tinha costume de falar com o elenco, ao que o cineasta, sereno, completou: “Mas você só fala quando é necessário falar. Se você tem atores que já entregam tudo que você precisa, é só deixá-los à vontade. A primeira sorte que um diretor pode ter é na escolha do elenco, porque se você escolhe bem é só seguir adiante.”

A estreante Laura Neiva, grande revelação do filme, foi a última integrante a se juntar à equipe. Dhalia conta que já tinha recebido o sinal verde para iniciar as filmagens e ainda não tinha encontrado a atriz certa para o papel, mesmo após ter testado mais de 600 meninas. Segundo o diretor, assim que viu o teste de Laura sabia que a escolheria. Vale dizer que a jovem foi contactada inicialmente através do Orkut e achou que era brincadeira. O diretor explicou ainda que Laura nunca teve em suas mãos um roteiro porque ele preferia que ela entendesse a essência da cena e improvisasse. Laura, apesar de ter feito alguns trabalhos como modelo, não pensava em ser atriz porque fez teatro na escola quando era criança e não gostou, mas agora quer continuar.

Perguntei a Heitor se a decisão de ambientar o filme no início dos anos 80 era uma forma de aproximar a trama de sua juventude, no que ele concordou: “Foi sim, porque era a época em que aconteceu a separação dos meus pais e eu quis aproximar dos elementos pessoais e também pelo filme ter uma construção baseada na memória e uma abordagem mais nostálgica de uma infância deixada para trás, a inocência perdida, enfim, o filme tem essa busca narrativa pela memória. E não só a minha. Junto com a equipe construímos uma memória coletiva, todo mundo foi trazendo fotos de álbuns de família e do conjunto disso tudo surgiu o filme. Mas a gente não queria fazer um filme tipo 'almanaque', foi uma coisa bem suave, um ou outro elemento. É como diz a Guta (Guta Carvalho, diretora de arte), a época não importa, o que importa é a memória daquela época.”

Sobre o porquê de estar há tanto tempo afastada das telonas, Débora Bloch lamentou que o Brasil tenha poucos incentivos na área: “Eu acho que a gente não tem ainda uma produção de cinema. Quando eu comecei a fazer cinema, veio o Collor e acabou com o cinema no Brasil. Está mudando, é claro, mas a gente passou por um período difícil e ainda não temos uma indústria ou apoio do governo suficiente para ter uma produção tão grande. E tem muitas atrizes boas da minha geração, então nem sempre tem muitas opções para o meu perfil assim como tem na TV.” Sobre a experiência de levar o filme ao Festival de Cannes, a atriz arrancou risadas dos presentes ao resumir: “Ah, foi ilha da fantasia. Para o Vincent não, que ele está acostumado, mas para a gente foi incrível.”

Curiosa sobre a ordem natural das coisas, quis saber de Heitor Dhalia se o personagem Mathias já era desde o princípio francês ou se a mudança foi feita em razão de Vincent Cassel ter sido contratado para o papel. Dhalia disse que já imaginava que haveria espaço para um estrangeiro, embora pensasse originalmente em um ator argentino ou espanhol. Quando descobriu, através de uma entrevista na televisão, que Cassel falava português (e muito bem), resolveu tentar contatá-lo porque já era um fã do seu trabalho.

Aproveitando o gancho, perguntei a Vincent como foi interpretar em português, no que o ator fez piada, dizendo que usou o filme apenas para aprimorar seu português. Depois disse que sempre gostou do idioma e que achou que seria um bom desafio. “Ao menos, eu já falava um pouquinho. Eu fiz um filme russo sem falar nada de russo, então depois disso português foi super fácil. Mas também minha única responsabilidade de ator foi essa do idioma. Não de perder o sotaque, que é impossível, mas de ficar com uma articulação boa. No filme, eu falo muito melhor do que na vida”, completa, em um português perfeito. Perguntado sobre sua integração com a família retratada no filme, o ator afirmou se identificar e pontuou que a família mostrada em À Deriva poderia ser de qualquer nacionalidade. O elenco comentou ainda que o filme atinge todas as faixas etárias, desde os adolescentes, que se identificam com a personagem de Laura Neiva, até as pessoas mais maduras, que se veem retratadas no casal em crise.


Encerradas as perguntas, atores e diretor posaram para mais fotos no saguão do hotel. Débora Bloch achou graça da minha maquininha digital em meio aos fotógrafos profissionais e suas teleobjetivas gigantes. A gente faz o que pode, né?


À Deriva estréia em circuito comercial na sexta-feira da próxima semana (dia 31). Em breve, texto sobre o filme. Desde já, posso adiantar que adorei.

Nenhum comentário:

Postar um comentário