quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Deixa Ela Entrar


Em tempos de intensa massificação de tudo que diz respeito a vampiros e vampirismo, é um alívio assistir a um filme como este Deixa Ela Entrar. Embora o tema realmente esteja batido ao ponto de não ser possível vislumbrar no horizonte nada de realmente original em termos de argumento, este interessante longa sueco consegue surpreender justamente por tratar um assunto manjadíssimo por uma perspectiva completamente original.

Podemos dizer que Deixa Ela Entrar é o anti-filme de vampiro, já que passa bem longe de todas as vertentes usualmente exploradas no gênero. Não é um filme de terror e nem se rende a sustos, embora não fuja das tomadas sangrentas; não é uma história ao estilo “vampiros são descolados”, tão em voga graças aos filmes da série Crepúsculo e a seriados como True Blood e The Vampire Diaries; e muito menos podemos encaixá-lo no segmento do trash e suas irreverências. Nada disso se aproxima dos caminhos seguidos por esta bela e estranha história. Incrível como é mais fácil definir o filme pelo que ele não é.

Logo na primeira cena, conhecemos Oskar. 12 anos, frágil, pálido, arredio, perseguido pelos meninos mais velhos, filho de pais separados, vivendo com uma mãe pouco participativa, enfim, o protótipo de um garoto desajustado. Da janela de seu quarto, Oskar observa a chegada sorrateira de seus novos vizinhos. Não tarda até que ele se encontre no pátio com Eli, uma menina da mesma idade que ele. Embora a garota avise ao primeiro contato que não pode ser sua amiga, eles logo se tornam inseparáveis. Oskar não parece estranhar o fato da amiga só sair para brincar à noite e não ir à escola. Afinal, quem é ele para achar alguém esquisito, sendo ele próprio tratado como um anormal pelas outras crianças?

Ao mesmo tempo em que enfoca a pureza da amizade entre o garoto desajeitado e a vampira-menina de olhos melancólicos, o filme acompanha o crescente temor que vai tomando conta dos adultos conforme as autoridades da região começam encontrar cadáveres com o sangue drenado. Mas o filme não se detém no mundo dos adultos mais do que o estritamente necessário para contextualizar a trama. O foco do diretor Tomas Alfredson é o afeto incondicional que une Oskar a Eli enquanto enfrenta as dores do crescimento; ele é um menino prestes a se tornar um adolescente e ela, uma menina que nunca irá crescer. Seres muito diferentes, mas que, no fundo, não parecem ser. Pelo contrário: o amor entre os dois personagens – cada um indefeso a seu jeito –, rodeados por uma paisagem eternamente gelada e sentimentos idem, parece o caminho mais natural. Destaque para a comovente cena em que ela pede para entrar no quarto dele durante a noite.


O roteiro pleno de poesia e crueldade foi escrito pelo próprio autor do romance, John Ajvide Lindqvist. Uma pena que um trabalho tão caprichado derrape um pouco no desfecho, que soa meio em desacordo com o estilo que o filme vinha apresentando até então. Mais do que isso: parece um final desajeitado e apressado para um trabalho que estava quase atingindo a excelência. Fica aqui uma pergunta inversa à feita no post sobre Policial, Adjetivo (ver abaixo): um final decepcionante invalida um filme que foi todo bom até chegar lá? Não. Não chega a tanto. Mas quebra um pouquinho o encanto do espectador.

2 comentários:

  1. Querida Erika, após vários contratempos, consegui assistir a 'Deixa ela Entrar'. A princípio achei que fosse uma história focada no sentimento entre o menino e a vampira. Mas vampiros são conhecidos pela capacidade de sedução também, não é? Depois do final, fiquei pensando se a intenção dela não era justamente substituir seu servo humano já envelhecido (que poderia ter sido o Oskar de anos atrás) por um mais novo. De qualquer forma, achei muito belo o filme. Com essa última suposição, acho que o final não poderia fugir muito do que foi. Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  2. Marcelo,

    O que eu questiono não é nem o final e sim seu estilo, sua condução. A cena na piscina me pareceu meio terrorzinho B, coisa que o filme tinha evitado até aquele momento. Poderia ter sido exatamente o mesmo final, mas feito de um modo mais poético, mais de acordo com o proprio filme. Eu acho que o final tem um tom muito "prático", sei lá... Não sei se dá para explicar isso em palavras, mas eu senti claramente uma mudança de tom a partir da cena dos meninos com Oskar na piscina. Coisa de atmosfera mesmo, mas talvez tenha sido uma sensação só minha.

    Abs,
    Erika

    ResponderExcluir