Gostando ou não de seu trabalho, ninguém pode negar que Woody Allen tem uma marca inconfundível, como só os grandes gênios costumam ter. Quando pensamos no cineasta, a primeira palavra que vem à mente é neurose. E isso ocorre porque o foco central de seus filmes sempre foi a figura humana, com suas fobias e bizarras contradições. Woody é diretor, roteirista e, muitas vezes, protagonista de seus filmes. Mas o nova-iorquino Allan Stewart Konigsberg – ou simplesmente Woody Allen, apelido que inventou para si mesmo – passou por diversas fases até encontrar a maturidade atual. No começo de sua carreira, enveredou por comédias amalucadas, como Um Assaltante bem Trapalhão, Bananas e O Dorminhoco. Justamente nesta época, seu primeiro passo em direção ao cinema mais intelectual que ele faria a partir de Annie Hall (1977) se deu pelas mãos de outro diretor.
A despeito de ter sido dirigido por Herbert Ross, Sonhos de um Sedutor é a representação clara de uma transição na carreira de Woody Allen. Tanto que muita gente credita sua direção ao próprio Woody Allen e não a Ross – o que é compreensível, já que o roteiro foi escrito por Woody a partir de uma peça de teatro que ele escrevera alguns anos antes. De todo modo, o longa explora um tema que seria retomado com maestria em A Rosa Púrpura do Cairo: o do personagem que tenta obter através do cinema as respostas que não encontra na vida real. Já o título original, Play it Again, Sam (Toque de novo, Sam), brinca com a famosa frase de Casablanca que, na verdade, nunca foi dita desse modo no filme.
O protagonista da história é Allan (nome verdadeiro do cineasta), um crítico de cinema com tendências depressivas que acaba de ser abandonado pela esposa. Um casal de amigos, Dick e Linda, tenta lhe arrumar encontros com outras garotas, mas o coitado se atrapalha cada vez mais depois que começa a receber conselhos de Humphrey Bogart, ou melhor, Rick Blaine (com direto a sobretudo e chapéu). Boogie brinda Allan com conselhos no mínimo duvidosos e lhe diz pérolas como “nunca conheci uma mulher que não entendesse um tapa na boca”. Para embaralhar ainda mais as coisas, Allan começa a perceber que sente-se atraído por Linda e que ela é a única mulher com quem ele se sente à vontade.
Sonhos de um Sedutor é um trabalho divertido e referencial, mas ainda bastante imperfeito em termos de roteiro. Alguns diálogos soam um pouco artificiais e algumas gags parecem exageradas, mas essa sensação se impõe sobretudo pela comparação com a trajetória posterior do cineasta. O que é especialmente interessante de ser observando pelo espectador que admira a obra de Woody, já que a trama parece uma espécie de rascunho da maturidade artística que ele começaria a consolidar a partir de Annie Hall. Outra curiosidade é assistir à primeira das inúmeras parcerias entre o cineasta e a atriz Diane Keaton (com quem ele foi casado depois disso). E convenhamos, um trabalho imaturo de Woody Allen ainda é muito melhor do que a filmografia inteira de certos diretores.
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