sábado, 9 de janeiro de 2010

Cecil Bem Demente


Cecil Bem Demente, do irreverente John Waters, é um filme bastante curioso e não muito visto que vale a pena pescar nas prateleiras das locadoras. O longa conta a saga de um grupo de cinéfilos lunáticos que, liderados pelo auto-intitulado Cecil B Demented, decidem lançar-se num projeto ousado: seqüestrar Honey Whitlock, a maior perua de Hollywood, e obrigá-la a participar de seu filme terrorista. Honey (Melanie Griffith, como uma paródia dela mesma) está na cidade de Baltimore para a première de seu mais recente filme quando é levada pela gangue para um cinema abandonado e submetida a uma espécie de reeducação cultural por uma galera que está disposta a morrer para fazer um filme.

O filme em questão se chama Beleza em Fúria e nele Honey interpretaria uma dona de cinema de arte que, com ajuda de seu namorado e sua filha, começa uma revolução para destruir o cinema comercial – o filme dentro do filme também espelha a visão anarquista de Cecil. Os colegas de cena de Honey são Cherish, estrela pornô, e Lyle, um viciado em drogas. A princípio, a perua atua sob a mira de um revólver ou à base de choques elétricos mas, aos poucos, entra no espírito da trupe. Cecil a “motiva” mostrando vídeos de críticos de cinema arrasando com ela. Vale lembrar que Beleza em Fúria não é o único filme dentro do filme, existem várias cenas dentro de cinemas. Numa delas, Cecil comanda a destruição de um cinema que exibe Patch Adams, filme que ele considera lixo. Em outra, a equipe é perseguida e se esconde em um cinema pornô que passa um filme de Cherish. É quando a moça faz o apelo: “Fãs do pornô. Sou eu, Cherish! Preciso da ajuda de vocês!” e o bando de tarados assume a defesa da equipe. Assim, eles vão conquistando como admiradores os pervertidos, os rebeldes e os desajustados, ao mesmo tempo em que atraem o ódio da sociedade convencional.

Cecil Bem Demente mostra toda a irreverência de John Waters. A começar pelo título, referência debochada ao lendário Cecil B. de Mille, cineasta de clássicos como Cleópatra e Os Dez Mandamentos. Dizem, ainda, que um crítico de cinema certa vez chamou Waters de Cecil B. Demented e ele, ao invés de se ofender, achou tão engraçado que resolveu usar o nome para batizar seu filme. Também podemos perceber inúmeras citações. Numa das últimas cenas, Honey diz: “Sr. Demented, estou pronta para o meu close-up.”, parafraseando a famosa fala final de Norma Desmond em Crepúsculo dos Deuses. Outra mensagem de amor à sétima arte está nas tatuagens que os membros da equipe ostentam, cada um com o nome de um ícone do cinema gravado na pele.

Sobre o elenco, vale destacar algumas coisinhas. Melanie Griffith, quem diria, está ótima no papel. Talvez a qualidade do desempenho tenha a ver com estar interpretando uma personagem parecidíssima com a imagem de perua deslumbrada que se tem dela – ou será que ela não percebeu isso? Stephen Dorff, que tem uma filmografia bem extensa sem nada de relevante nela, teve no papel de Cecil B Demented sua melhor oportunidade até hoje. Maggie Gyllenhaal, desconhecida na época, interpreta uma satanista meiga que não espera a hora de terminar o filme para transar, já que Cecil prega canalizar todas as energias para o trabalho, filosofia resumida no slogan “castidade pelo celulóide”. Ao contrário de Dorff, a carreira de Maggie deslanchou pra valer a partir desse filme.

Cecil Bem Demente é, sobretudo, uma comédia sobre liberdade de expressão e um apelo à criatividade. Sem contar que o personagem do cineasta poderia ser uma versão extremista do próprio Waters, conhecido por suas opiniões pouco convencionais e sua estética underground. É certo que podemos perceber nessa fita uma defesa do cinema de autor, dos pequenos filmes massacrados pela indústria Hollywoodiana. Um filme tresloucado, mas com uma mensagem que convida à reflexão.

Um comentário:

  1. Deste eu lembro. Demorei a esquecer o grito "Demente for Ever". Acho que era isso. Muito engraçado...

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