terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

O Discurso do Rei


A realeza britânica é mesmo um manancial de boas idéias para a sétima arte, desde as intrigas palacianas envolvendo a trajetória de Elizabeth I até o impasse criado em Buckingham com a morte de Lady Di visto em A Rainha. O roteirista David Seidler, que teve problemas de gagueira na infância, encontrou um novo e curioso tema ao ler o livro Mark Logue e Peter Conradi e descobrir que um rei da Inglaterra já foi acometido pela mesma deficiência. Assim nasceu esse filme delicioso que é O Discurso do Rei.

A trama enfoca o Rei George VI, no início do longa apenas o pacato e tímido Duque de York (ou Bertie, para a família). Sendo o irmão mais novo, Bertie nunca teve sobre si a pressão da opinião pública nem a atenção dispensada a seu irmão mais velho David, o primeiro na linha de sucessão. O que é uma sorte, já que Bertie é acometido por uma gagueira de fundo psicológico que o impede de falar em público. Só que com a morte do Rei George V e a inesperada abdicação de David, Bertie se vê, contra todas as expectativas, coroado Rei da Inglaterra. Com o país à beira da Segunda Guerra Mundial e precisando de um líder que inspire o povo, seu problema precisa ser solucionado. Com a ajuda de Lionel Logue, um excêntrico terapeuta da fala de métodos nada ortodoxos, Bertie finalmente poderá superar seus traumas e encontrar sua própria voz.

A grande sacada de O Discurso do Rei é apresentar George VI como Bertie, ou seja, não o monarca poderoso e sim um homem lutando contra seu maior fantasma. A cena de abertura, que mostra a primeira tentativa fracassada do protagonista em se fazer ouvir e seu pânico perante o silêncio condenatório da multidão, já cria cumplicidade imediata com o espectador e inspira tanta empatia que dali em diante será impossível não torcer para o personagem. O filme também diverte ao mostrar a falta de protocolo de Logue ao lidar com a realeza. Não por desrespeito, mas por pura falta de conhecimento sobre um universo que não é o seu.

Colin Firth tem aqui mais um grande momento de sua carreira. Alguns dirão que sua quase certa premiação com o Oscar é devido ao fato de interpretar um personagem com deficiência, o tipo de papel que costuma agradar à Academia. Sim e não. É óbvio que um personagem com uma particularidade assim é um grande desafio e requer um ator de muito talento, mas, na verdade, Colin alcança uma excelência que transcende sua capacidade em interpretar “um gago” com propriedade. Existe muito de Bertie revelado com o olhar, como a já citada cena de abertura, quando o ator transmite toda sua angústia sem dizer uma única palavra.


Mas seria injusto elogiar apenas Firth, porque as cenas em conjunto com Geoffrey Rush e Helena Bonham Carter são de uma precisão, elegância e delicadeza comoventes. O filme acaba sendo do trio, que dá nova dimensão ao verbo contracenar. Michael Gambon também tem participação pequena, porém marcante. Em um elenco tão entrosado, apenas Guy Pearce parece meio fora do tom como David (ou Edward III). Mas nada que chegue a comprometer o resultado final.

O Discurso do Rei não é um filme que empolga ou tira o espectador dos eixos – como foi o caso de Cisne Negro –, mas é uma produção simpaticíssima e muito bem realizada em cada um dos seus detalhes. É filme para deixar o espectador com um sorriso no rosto e a sensação de que obstáculos estão aí para serem superados.

Sexta nos cinemas.

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