O trabalho de Baz Luhrmann não é o que se poderia chamar de discreto. Alguns adoram e outros odeiam, mas ninguém é indiferente à estética exuberante do cineasta australiano. Depois de uma breve carreira como ator, Luhrmann estreou na direção em 1992 com o ultra-colorido e simpático Vem Dançar Comigo. Quatro anos depois, realizou Romeu + Julieta, versão moderninha do clássico que associava visual psicodélico com reprodução fiel do texto de Shakespeare. Em 2001, o ponto alto de sua carreira: Moulin Rouge, simplesmente um dos melhores musicais de todos os tempos. O filme foi indicado a oito Oscars – e era, de longe, o melhor do ano –, mas acabou ficando só com os prêmios de figurino e direção de arte. Depois disso, Luhrmann se recolheu. É bem verdade que ele tentou dirigir uma biografia de Alexandre, mas Oliver Stone lhe passou a perna. Oito anos depois, o cineasta reaparece com um épico à moda antiga. E o mais surpreendente: sem números musicais.
Austrália é uma mistura de aventura e romance ambientada durante a segunda guerra. Lady Sarah Ashley, uma aristocrata inglesa, parte para o longínquo país do título atrás do marido. Chegando lá, Sarah encontra lorde Ashley morto e a fazenda de gado que ele tanto estimava à beira da falência. Obstinada, Sarah se recusa a ser enxotada de suas terras e consegue a ajuda de um homem rude e corajoso, conhecido como “o capataz”, ao mesmo tempo em que se afeiçoa a um menino aborígene. Juntos, eles tocarão o gado através de quilômetros de terreno selvagem para realizar uma grande venda e salvar a propriedade. No caminho, além dos obstáculos naturais, precisam enfrentar a traição e corrupção de um barão do gado.
É preciso deixar uma coisa bem clara: Austrália não é Moulin Rouge. Embora perceba-se o mesmo tom grandiloquente e excessivamente dramático, tudo que em Moulin Rouge causava encanto e arrebatamento em Austrália soa um pouco ultrapassado. Por vezes, brega mesmo. Com um tom de filme antigo, datado, que não sobreviveu bem à passagem do tempo – impressão esquisita, considerando que o filme acabou de ser feito. É claro que essa abordagem barroca, operística, faz parte do estilo de Baz Luhrmann, mas nem tudo que fica bem em um musical tem o mesmo impacto em um épico ao estilo Assim Caminha a Humanidade.
O mesmo se pode dizer de Nicole Kidman. A mesma voz e trejeitos afetados que ficavam adoráveis para a Satine de Moulin Rouge são um pouco irritantes quando aplicados a lady Ashley. Uma personagem que continua antipática, mesmo depois de sua conversão ao estilo australiano e aos beijos do charmoso capataz. Hugh Jackman, por sua vez, tem melhor desempenho e incorpora uma mistura da rudeza selvagem do jovem Clint Eastwood (reparem no figurino e nos closes na altura dos olhos) e do cinismo blasé de Humphrey Bogart (o que fica evidente quando ele diz que “não luta a guerra de ninguém”, em alusão ao “não arrisco meu pescoço por ninguém” do Rick Blaine de Casablanca).
Austrália é claramente dividido em dois segmentos distintos: o primeiro – e melhor – é o que trata da aventura com o gado através do deserto australiano. Inesquecível a empolgante sequência que mostra o grupo tentando conter um estouro da boiada perto de um precipício. Uma vez superado o desafio, com Nicole e Jackman já devidamente apaixonados, o longa torna-se mais um épico de guerra e tem como pano de fundo o bombardeio que a cidade de Darwin sofreu do Japão. O caos imposto pela guerra e algumas briguinhas sem importância acabam por deixar o casal separado, com obstáculos e desencontros a superar. E esse segundo segmento não tem tanto apelo quanto o primeiro, nem visualmente e muito menos dramaturgicamente.
Interessante mesmo é a subtrama a respeito do menino Nullah. Mestiço de mãe aborígene e pai branco, Nullah era chamamo pejorativamente de “creamy” (ou café-com-leite). Em um país segregado, o moleque não fazia parte de nenhum dos dois mundos. O que só piorava com a prática do governo australiano de levar meninos como ele para serem educados em missões jesuítas para futuramente servir à comunidade branca. Tal prática covarde e absurda, que roubou incontáveis meninos de suas mães, foi abolida pelo governo australiano somente em 1973.
No todo, podemos dizer que Austrália é um filme regular. Não tem nenhum defeito imperdoável, mas tampouco arrebata a ponto de nos fazer esquecer suas deficiências. A seu favor, tem alguns pontos de interesse na trama, cenas bem dirigidas, uma belíssima estética e, por vezes, até causa emoção genuína. Para o público feminino também acrescente-se a isso o apelo de Hugh Jackman exalando virilidade e beleza, com os músculos perfeitos sempre em evidência. Os pontos fracos seriam a banalidade dos diálogos e de algumas situações, o excesso de afetação de Nicole Kidman e a excessiva duração do filme (duas horas e cinquenta minutos), o que acaba criando uma barriga na parte central da história. Mas talvez a coisa toda seja menos racional e os pecados de Austrália se resumam a apenas um: não conseguir cativar completamente o coração do espectador, fazendo-o embarcar sem restrições nessa jornada por uma terra mística.
Quanto a Baz Luhrmann, desejo duas coisas: 1) Que ele não fique outros oito anos sem filmar; 2) Que seu próximo filme seja um musical.
Achei um tédio. Para mim, serviu para comprovar que o Luhrmann não é de nada. Sem contar que a Nicole Kidman está medíocre.
ResponderExcluirSinceramente não sei porque, mas 'Slumdog Millionaire' e 'Austrália' são dois lançamentos que não tenho a mínima vontade de ver. Talvez em dvd e só. =]
ResponderExcluirAté mais!
Como assim, "comprovar que o Luhrmann não é de nada", Pedro? Você não acha precipitado falar isso do cara que fez Moulin Rouge por causa de um filme menor?
ResponderExcluirNicole realmente errou o tom, do mesmo modo que fez em Cold Mountain. Acho que épicos não são o forte dela. Jackman entendeu a coisa bem melhor, brincando com o clichê de modo proposital.
Quanto ao Slumdog, Marcus, o que me deixa desconfiada é o fato do Danny Boyle não fazer um filme bom desde seu começo de carreira.
Eu vi Moulin Rouge recentemente e achei extremamente chato.
ResponderExcluirÃãã??? Você viu mesmo Moulin Rouge? Tem certeza de que não botou outro DVD qualquer no aparelho?
ResponderExcluirAcredite. Pois é. Foi sofrido, mas eu consegui assistir até o final.
ResponderExcluirUm dos melhores filmes de todos os tempos!!! Tá faltando amor nesse coraçãooooo, eheheh
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