terça-feira, 24 de junho de 2008

Jogos do Poder


Muitas vezes, a realidade é mais estranha que a ficção. Existem histórias que são tão improváveis que só podem ser reais, porque se tivessem saído da mente de um escritor não teriam a mínima credibilidade. Jogos de Poder, novo longa de Mike Nichols que chega às locadoras a partir de amanhã, conta a bizarra história por trás da expulsão do exército russo do Afeganistão no início dos anos 80.

Na época ninguém soube disso, mas o verdadeiro arquiteto da guerra em que os afegãos se libertaram da ocupação russa (para cair em piores lençóis depois, mas isso é outra história) foi um obscuro congressista texano chamado Charlie Wilson. Com o apoio de Joanne Herring, uma das mulheres mais ricas do estado, Wilson conseguiu arregimentar uma aliança secreta com parceiros improváveis como paquistaneses, egípcios e israelenses e ainda elevar o orçamento anual do fundo americano para operações secretas de modestos cinco milhões de dólares para mais de um bilhão. Ao mesmo tempo, o nada convencional político ainda precisava lidar com um escândalo associando seu nome a orgias, drogas e prostituição.

Em companhia de um indisciplinado agente da CIA e com o aval da amante poderosa e bem-relacionada, Wilson encontrou-se com presidentes, fez alianças absurdas e, graças a sua cara-de-pau ilimitada, conseguiu atingir seus objetivos sem que ninguém percebesse o que ele estava fazendo. Simplesmente porque tinha em seu crédito um histórico de favores concedidos e não cobrados que lhe permitiu conseguir o que queria quando se dispôs a pedir retribuição.

O filme tem um roteiro bastante inteligente, repleto de ironia e tiradas espirituosas. O roteirista Aaron Sorkin tem experiência em temas políticos: já venceu um Emmy por seu trabalho na série The West Wing, além de ter escrito Meu Querido Presidente. Embora abuse do sarcasmo em seus diálogos, Jogos do Poder não pode nem remotamente ser considerado uma comédia. O que leva à conclusão de que sua indicação ao Globo de Ouro deste ano como tal se deveu única e exclusivamente à já tradicional escassez de candidatos para a categoria comédia / musical.

As atuações são boas, porém nenhuma delas se destaca individualmente. O grande mérito interpretativo está na direção de atores, que conseguiu obter uma performance conjunta nivelada e harmoniosa. E não deixa de ser interessante a oportunidade de ver Tom Hanks e Julia Roberts em papéis totalmente diversos da imagem que se tem de ambos. O pacato cidadão Hanks como um mulherengo sem o mínimo de ética e a fina e discreta Julia como uma perua meio cafona – ou uma versão rica da Erin Brockovich, se preferirem. Já Philip Seymour Hoffman, que foi indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante deste ano, poderia ter deixado a vaga para Paul Dano (Sangue Negro) ou John Travolta (Hairspray). Mesmo porque o fato de seu personagem ser responsável pelas melhores falas é mais mérito do roteirista do que do ator.

Jogos do Poder é um bom filme, embora não tenha o mesmo grau de impacto e ousadia do trabalho anterior de Mike Nichols, Closer – Perto Demais. O mais curioso na trama é o fato de um sujeito que era um joão-ninguém no cenário político ter mudado os rumos de uma guerra e ainda conseguir manter tal feito em segredo por vários anos. Como bem enuncia o título original, Charlie Wilson’s War, o personagem de fato foi o “dono” de uma guerra. Parece mentira. Infelizmente não é.

Um comentário:

  1. Não gostei muito do filme. Apesar do roteiro, como você bem disse, ser inteligente.

    Abraço!

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