domingo, 1 de junho de 2008

Memória Afetiva de um Amor Esquecido



Este novo espetáculo da Cia. Os Dezequilibrados, que se desloca por todo o prédio da Oi Futuro, é baseado em Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, filme que deu o Oscar de melhor roteiro original ao cultuado Charlie Kaufman – o mesmo que escreveu Quero ser John Malkovich. Brilho Eterno conta a história do certinho Joel e da maluquete Clementine, um casal de personalidades completamente opostas. Desiludida com os tropeços da relação, Clementine decide tirar Joel da cabeça. Literalmente. Para isso, procura uma empresa especializada em apagar da memória lembranças indesejadas. Após descobrir o porquê da ex não se lembrar dele, Joel - magoado, mas ainda apaixonado - decide fazer o mesmo. Durante o procedimento, ele percebe que não quer esquecê-la e começa a tentar esconder Clementine em outras partes do seu cérebro para que o técnico não consiga removê-la.

Ao ler no jornal que a peça era inspirada nesse filme (que eu, aliás, adoro), minha curiosidade foi à estratosfera. Porque Brilho Eterno já é um filme bastante complexo, imaginem transferir essa mesma temática para o teatro. Como mostrar em cena, ao vivo, uma história que se passa em grande parte dentro da cabeça do protagonista? Mas o criativo diretor Ivan Sugahara não apenas deu conta do recado como também conseguiu criar uma proposta estética inovadora que extrapolou os limites da obra que serviu como base. Para completar, ainda recheou tudo com deliciosas referências ao cinema e à cultura pop.

O espetáculo parte de um argumento parecido com o do filme, mas segue caminhos um pouco diversos – até mesmo por se tratar de outro veículo. Podemos dizer que a experiência vai além do teatro e consegue ser sensorial em todos os níveis, utilizando recursos do cinema e da mídia eletrônica e colocando o espectador como participante ativo da situação. De cara, somos todos transformados em clientes em potencial da tal clínica que venderia a felicidade através do esquecimento. A peça começa ainda do lado de fora do prédio quando, ao sermos admitidos no pátio externo, recebemos um crachá de visitante da Be Happy. E o espectador adentra de fato na recepção da clínica com direito, inclusive, a tirar dúvidas com os robotizados atendentes. Num primeiro momento, cheguei a temer que a impressionante concepção e a parafernália multimídia acabasse sendo maior que o espetáculo em si. Mas Sugahara usa a tecnologia como acessório inteligente e não como uma muleta.

Como introduzir neste espaço cênico a história particular da desilusão do protagonista? Muito simples. Convidando-nos a acompanhar o procedimento que será feito em no cliente e testemunhar o sucesso do processo. E o público acompanha de muito perto, por vários recantos dos oito andares do edifício, a história de Vicente e Dora. Acreditando na promessa de felicidade vendida por uma criatura que parece um misto de charlatão e messias, Vicente contrata a Be Happy para apagar da memória a namorada que não quer mais saber dele. Dora é contra porque acredita que, mesmo não estando mais juntos, a lembrança de tudo que viveram é parte fundamental da personalidade de cada um. Mas ele está magoado e quer ir em frente.

Em paralelo à visualização de vários momentos do casal, que são representados como se as lembranças de Vicente se materializassem, a trama ainda conta com a hilária dupla formada pelo médico picareta e sua assistente que encontrou a razão de viver nas cirurgias plásticas sem fim. Mas não pensem que Memória Afetiva de um Amor Esquecido se resume apenas a risadas e modernidade. A peça – ou melhor, a experiência – tem momentos doloridos também. Quando vemos Vicente relembrar os momentos de carinho com Dora, já sabendo como tudo acabou, fica difícil não se lembrar de algum trauma pessoal também. Qualquer um que já levou um fora, acabou um relacionamento, acreditou que era pra sempre e quebrou a cara, enfim, qualquer um que já se apaixonou vai ter algum esqueleto a desenterrar. E ninguém fica indiferente a isso. Do mesmo modo, é impossível não se enternecer com a visualização do início da paixão deles. Muito poético quando Vicente e Dora entram no elevador e o público assiste numa projeção o que estaria acontecendo do lado de dentro. E como uma boa parte da história se passa dentro da cabeça do personagem, acaba sendo também um estudo sobre a importância da memória e sobre o quanto nossa percepção da realidade é afetada por ela. Sem contar que a proximidade com os atores reforça de maneira impressionante a sensação de que aquele casal ali pode ser qualquer pessoa que você conhece... ou até você mesmo.

Em tempo: não que seja obrigatório, mas seria interessante assistir a Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças antes de ver a peça. Até mesmo para entender o ponto de partida dessa tocante experiência sentimental.

Memória Afetiva de um Amor Esquecido, de Rosyane Trotta. Direção de Ivan Sugahara. Com Saulo Rodrigues, Cristina Flores, Ângela Câmara e José Karini. Oi Futuro (Rua Dois de Dezembro, 63 – Flamengo), de sexta a domingo, às 21h. R$ 15,00. Até 20 de julho.

7 comentários:

  1. é um absurdo escrever todo um texto sobre os desequilibrados e escrever desequilibrados com "z" logo no começo do texto.

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  2. Caro Lucas,

    Você está bastante desinformado. O nome da companhia teatral se escreve exatamente assim, com "z".

    Mas não se fie apenas na minha palavra, visite o site deles e confira:

    http://www.osdezequilibrados.com.br/

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  3. ola erika, tudo bom com vc?
    fiquei com muita vontade de ver a peça
    pena que moro tão longe! (RECIFE)
    vc sabe se eles vão estar por aqui?
    rsrs bjo pra vc fica na paz!

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  4. Eu não sei se eles ainda estão apresentando a peça, mas você pode procurar informações no site da cia. (veja post acima do seu) ou até mesmo escrever para eles. No site deve ter um link para e-mail ou algo assim.

    Espero que eles levem o espetáculo até Recife, realmente vale a pena assistir.

    Beijos

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  5. oii,
    Estou fazendo uma pesquisa sobre essa peça. eu nao conheço a peça, mas pelo o que eu li parce ser bem interessante.
    coloquei no youtube o nome da peça, e aparceu os DEZEQUILIBRADOS. A peça é conhecida por esse nome ?

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  6. "Os Dezequilibrados" (com "z" mesmo) e' o nome da companhia teatral.

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