sexta-feira, 14 de outubro de 2011

O Palhaço


Benjamim forma com seu pai Valdemar a dupla de palhaços Pangaré e Puro Sangue. Criado no circo e pelas estradas da vida, é um homem sem identidade, CPF ou comprovante de residência, tendo como único documento uma amarrotada certidão de nascimento. O Circo Esperança é sua vida e também sua prisão, fazendo com que seja cada dia mais difícil para Benjamim sorrir fora de suas funções. Cansado da vida que leva, ele se pergunta constantemente “eu faço todo mundo rir, mas quem é que vai me fazer rir?”. Benjamim quer ter um endereço, um ventilador e uma carteira de identidade.

Sempre fui fã confessa de Selton Mello. Do excelente ator e, principalmente, do cara cheio de personalidade que demonstra saber exatamente o que quer da sua carreira. A partir de 2008, quando realizou o ótimo e pouco visto Feliz Natal, passei a ser fã também deste diretor que agora, já em seu segundo longa, demonstra uma maturidade e sensibilidade digna dos grandes mestres. Faltam no Brasil exemplos de atores consagrados que se tornam diretores competentes, acúmulo de função comum nos Estados Unidos (os exemplos vão de George Clooney e Clint Eastwood a Ben Affleck) e pouco usual aqui. Acredito piamente que Selton será o cara a preencher esse vácuo.

O Palhaço é um filme simples. Não simplório, mas simples no sentido da sua essência, de querer contar uma história com o coração. De não camuflar idéias pretensiosas com uma pseudo-modernidade vazia. De beber em fontes tão diversas como o road movie americano e o cinemão clássico italiano e, ainda assim, ser totalmente brasileiro, contemporâneo e universal. Simples no sentido de emocionar mais e racionalizar menos. Genial nesta aparente simplicidade.

Com uma fotografia deslumbrante e uma identidade visual muito forte, acompanhamos o dilema deste palhaço deprimido que precisa de mais do que a pesada maquiagem para parecer feliz. Benjamim nunca teve realmente uma escolha e está naquele momento da vida em que se pergunta o que realmente deseja para si. De que adianta fazer as outras pessoas felizes e sentir-se miserável? É um filme muito calcado em olhares significativos, onde o que mais importa não é o que os personagens dizem e sim o que calam. Não por acaso, um dos momentos mais emocionantes, daqueles de deixar o espectador com os pelos eriçados, é justamente um olhar trocado entre Benjamim e Valdemar perto do desfecho do filme.


Falar sobre o elenco, encabeçado por Selton Mello e Paulo José, chega a ser redundante. Perfeito. As participações especiais são show à parte, e não menciono aqui o nome dos muitos atores que fazem pequenas e divertidas aparições justamente para não tirar a graça de cada uma delas.

O Palhaço é, desde já, um dos melhores filmes do Festival e do ano de 2011. Bravo!

O Palhaço (idem), de Selton Mello. Com Paulo José, Selton Mello, Giselle Motta, Thogun e Teuda Bara. Brasil, 2011. 88 minutos. Première Brasil Hors-Concours.

Cotação: 10

Um comentário:

  1. Belíssima crítica à altura de um Belíssimo e Extraordinário filme. Assino embaixo, Érika. Identifiquei também elementos do Cinema Italiano e me encantei com a simplicidade da história e de como tão bem foi contada. Sem falar na valorização de grandes atores esquecidos pela mídia, em participações especialíssimas.
    Ave, Selton!

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