terça-feira, 30 de setembro de 2008

A Arte do Roteiro segundo Jorge Durán


Chileno radicado no Brasil desde a década de 70, Jorge Durán já escreveu roteiros para mais de vinte filmes, dentre eles o elogiado Pixote – A Lei do Mais Fraco. Como diretor, foi responsável pelo premiado A Cor do Seu Destino e, mais recentemente, Proibido Proibir. Durán também ministra aulas de roteiro e é um dos mais respeitados professores da matéria.

Como você se envolveu com o cinema? Em que momento decidiu ser roteirista?

A minha avó era cinéfila. Não no sentido de frequentar cinemateca, mas de todo sábado ver um filme; no domingo, dois. Eu comecei a ir ao cinema aos doze anos e logo, para ver um filme, fazia qualquer sacrifício. Faltava ao colégio, lá em casa era uma briga permanente. Depois me interessei por teatro e entrei para a Universidade do Chile, mas não acabei o curso de direção. Em 1969 eu fui para a Europa e conheci um diretor de cinema, que me convidou para trabalhar como seu assistente. Eu nunca tinha feito cinema, mas me integrei a esse filme e não saí disso até hoje. Depois voltei ao Chile e fiz muita assistência de direção, direção de arte e escrevi meu primeiro roteiro de longa-metragem. Mas então em 1973 teve a questão política, eu vim para o Brasil e assim comecei no cinema brasileiro. O Hector Babenco me convidou para escrever um roteiro e então eu fui escrevendo um atrás do outro. Também já dei oficinas de roteiro pelo mundo afora e dou aulas na Universidade Gama Filho há dez anos.

E quais seriam as principais dificuldades para quem tenta escrever seu primeiro roteiro?

Uma dificuldade que nem sempre é percebida seria que a juventude lê muito pouco. Vê pouco cinema e até escreve muito, mas só na internet, então acaba tendo pouca intimidade com a palavra escrita. Quando alguém lê um roteiro, essa pessoa tem que “ver” o filme na imaginação, é um jogo complicado de fazer. Outro problema é que, como hoje em dia é fácil conseguir uma câmera digital – até mesmo com celular se faz um filme –, isso leva o jovem a pensar que um filme se faz assim, juntando dois amigos e pronto. O cinema, em geral, se sustenta em cima de um roteiro, não basta sair com a câmera e captar algumas imagens para ter um filme. Na primeira vez, é engraçado; na segunda, parece que ficou mais ou menos; só na terceira a pessoa vai perceber que tem algum problema e procurar um curso de cinema ou uma oficina de roteiro.

Qual a importância de uma oficina de roteiro?

Na verdade, você não aprende a escrever. Você desenvolve um talento. Tem gente que formula muito bem suas idéias, mas quando senta para escrever um roteiro não consegue. Por isso existe a profissão. Os diretores quase sempre sabem muito bem o que querem passar e então procuram um parceiro que não só ajuda a formular as idéias como também as enriquece. É um trabalho que ocupa seis, sete horas diárias de trabalho por muitos meses e requer muita paciência.  

De maneira genérica, adaptar é mais difícil do que escrever um roteiro original?

Muitas vezes sim, porque dentro de um romance existem inúmeras tramas e na hora de adaptar é preciso tirar um pedacinho e saber o que aproveitar sem que, com isso, o livro se descaracterize ou os personagens passem a ser outra coisa. É preciso manter o espírito de um livro que pode ter 400 páginas em 80 ou 90 páginas de roteiro.

O mais difícil, então, seria saber o que cortar?

Mesmo quando escreve um roteiro original, você faz algo que se chama recorte. Você não pode falar de tudo em um filme. Você fala de um tema, uma trama, um conflito. E você sempre tem que escolher, não tem como colocar todas as suas idéias. Portanto, você centra em uma idéia principal e duas ou três idéias secundárias que configuram a história que você quer contar.

Esse ano os roteiristas de Hollywood deram uma demonstração de poder com a greve. E no Brasil, como é a valorização profissional do roteirista?

Aqui não temos esse poder todo. Ainda. Em Hollywood, esse poder nasce da necessidade de uma indústria onde a demanda de texto é permanente. É como em uma fábrica, e o roteiro é o motor de tudo. No Brasil, eu diria que é uma profissão que a cada dia cresce mais.

Tem um sindicato de roteiristas aqui no Brasil?

Sindicato não, mas tem a Associação de Autores de Cinema.

De qual roteiro você mais e se orgulha? Por quê?

O roteiro que eu escrevi e foi mais elogiado em todo o mundo foi Pixote. Ele serviu de inspiração para muito cineasta, não só no Brasil. E eu considero que o filme tem um roteiro muito bem escrito. Mas também tenho muito carinho por um roteiro que escrevi no Chile chamado Mi Ultimo Hombre. É um filme menor, mas que foi muito empolgante para mim como autor.

E nessa parceria com o Babenco, tem uma afinidade extra por vocês dois serem estrangeiros?

Quando eu comecei a escrever roteiro no Brasil, o Babenco não se importava do meu português não ser tão clássico nem estiloso. O que ele queria era uma trama boa, diálogos bons e pronto. Ele queria uma estrutura, uma história bem contada, cenas boas. Se estava escrito meio em “portunhol”, não tinha importância. Mesmo porque o roteiro é uma peça para ser filmada e não lida.

Por fim, quais são os teus próximos projetos?

Esse ano vou dirigir um novo filme, chamado Não se Pode Viver sem Amor. Também estou escrevendo um roteiro, mas sobre esse ainda não posso dar muitas informações. Só posso dizer que é uma experiência diferente, por ser baseado em pessoas que estão vivas. Então é uma situação complexa, escrever sobre personagens com os quais você conversou. É preciso muita ética, não posso sair escrevendo qualquer coisa. Inclusive eu estava decidido a me concentrar apenas no filme que vou dirigir, mas fiquei com muita vontade de escrever esse roteiro. Fora isso, tem um outro roteiro meu que pretendo rodar no próximo ano chamado Romance Policial.

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